Por decisões judiciais, os docentes puderam reingressar na Caixa Geral de Aposentações (CGA), depois de terem sido retirados pelo Governo. Mas o regresso à CGA foi, entretanto, suspenso, deixando os docentes sem direito a baixa médica ou apoios sociais. Sindicatos vão avançar para tribunal.
Em setembro, os professores puderam reinscrever-se na Caixa Geral de Aposentações (CGA), desde que manifestassem essa vontade. A possibilidade de regresso surgiu após decisões judiciais, que deram razão aos docentes transferidos para a Segurança Social (SS) contra a sua vontade. Para entender o problema, é necessário voltar aos anos anteriores a 2006, altura em que os professores contratados colocados nas escolas descontavam para a CGA e não para a SS. Por decisão do Governo da altura, liderado por José Sócrates, esses docentes passaram para a SS o que os levou a avançar com queixas judiciais. As ações acabaram por ser ganhas em 2022, o que possibilitou, este ano letivo, o regresso à CGA. Em setembro, no arranque do ano letivo, foram informados da possibilidade de reingresso, levando milhares de docentes a fazerem o pedido. Há pouco mais de uma semana, foram informados de que, afinal, esse reingresso estava suspenso.
Segundo apurou o DN, as secretarias não conseguiram fazer descontos, nem para a CGA, nem para a SS, deixando milhares de docentes, segundo as contas dos sindicatos, sem apoios sociais ou proteção na doença. Foi o que aconteceu com Rita Grilo, professora de Inglês, surpreendida com a decisão comunicada há dias. “Neste momento, o dinheiro da CGA está retido nas escolas e não se consegue fazer descontos nem na CGA, nem na SS. Isto é grave, principalmente para nós, que andamos na estrada. No meu caso, estou a 65 quilómetros de casa e, se tiver um acidente, não há quem me pague a baixa médica. Pode acontecer qualquer coisa, a qualquer momento, e não temos direito a nada”, lamenta.
A professora recorda ter feito o pedido de reingresso em setembro, não havendo, na altura, qualquer problema na reinscrição. Há professores com pedidos feitos em igual período que foram reintegrados, e outros não, não se sabendo o que levou a decisões contrárias, segundo os sindicatos e os docentes contactados pelo DN.
O caso de Rita Grilo assume contornos mais graves, pois a docente não só poderá ficar sem apoio na doença em caso de necessidade, como também perdeu os Abonos de Família e um apoio social que recebia por ter uma filha com uma incapacidade. “O meu sentimento é de revolta. Obviamente, sinto-me indignada porque os meus filhos também perderam as proteções sociais que tinham”, sublinha.
Em situação idêntica está Florbela Ribeiro, cujo pedido de reingresso remonta a agosto. “Descobri que, apenas no dia 3 de outubro, os Serviços Administrativos da minha escola formalizaram o meu pedido à CGA. O recibo do mês de outubro contempla descontos para a CGA, mas, no entanto, ainda não estou afeta à CGA. Fui esta semana pedir esclarecimento nos Serviços Administrativos da minha escola, que me informaram de que irão corrigir o recibo de outubro com descontos para a SS, devido ao comunicado que receberam do IGEFE (Instituto de Gestão Financeira da Educação)”, relata. Foi este instituto que informou as escolas que os docentes cuja reinscrição não foi validada pela CGA deveriam ser inscritos na SS “até nova orientação”. Florbela Ribeiro confessa-se “injustiçada” e “transtornada” com a situação em que se encontra.
A questão das datas apontadas pelas professoras levanta ainda mais dúvidas, pois, apurou o DN, os docentes que fizeram os pedidos antes do mês de outubro, e cujas secretarias deram andamento aos requerimentos nesse período, puderam reingressar na CGA – já os que só tiveram os requerimentos submetidos posteriormente, encontram-se “suspensos”, não sabendo quando a situação irá resolver-se. O que sabem, sim, é que sem inscrição na CGA ou na SS, em caso de doença, não poderão pedir qualquer apoio.
Filinto Lima, Presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), considera o problema “inadmissível” e pede uma resolução rápida. “Urge solucionar um problema que não foi criado nem pelos professores, nem pelas escolas e que está a prejudicar os docentes, trazendo um grande prejuízo às suas vidas. Não protege os professores na doença e isso é inadmissível. Eu diria mesmo que a solução é para ontem. As entidades competentes têm de resolver já esta situação”, afirma.
O responsável diz ainda que a situação política atual não deve servir de “desculpa” para não resolver o problema, até porque “o Governo ainda está em funções”. “Não há motivo para isto se arrastar e tem de se resolver rapidamente. Os professores não podem correr o risco de não ter proteção na doença. São muitos nessa situação, mas mesmo que fosse só um era gravíssimo”, considera.
Também Arlindo Ferreira, diretor do Agrupamento de Escolas Cego do Maio, na Póvoa de Varzim, pede resolução rápida para que os professores não fiquem “desprotegidos”. “Devem rapidamente resolver esta situação que até pode configurar em irregularidades, mas sem culpa das escolas. É mais um constrangimento para os professores a somar a muitos outros. Urge sinalizar as situações em que se está a prejudicar professores e dar solução a este problema para que não se agudize mais”, salienta. O responsável diz ainda desconhecer a origem deste “imbróglio”, de legalidade questionável por se tratar de uma decisão da justiça.