No dia em que desfilaram 140 000 pessoas, professores na maioria, em Lisboa, o Ministério anunciou serviços mínimos que obrigaram já não só a cuidar de crianças com fome ou com problemas de saúde (o que jamais justificaria serviços mínimos, deveriam ser as câmaras a assegurar isto e não professores), mas a dar aulas, regulares. Esta foi a “negociação”. Imposição de dar aulas. Dois membros do Estado, e um da UG, militante do
PS, são os 3 árbitros que decidiram isto – está na mão deles, que não são um tribunal, o exercício do directo à greve – 48 anos de sindicatos controlados pelo Estado não deveriam ter chegado para conter os ímpetos autoritários dos governos? Quando forem declarados ilegais, daqui a meses ou anos, já a greve não teria efeito.
Em greves parciais como os professores estão – na minha opinião bem – os funcionários judiciais, com condições deploráveis de vida e trabalho; e os ferroviários, e os guardas prisionais, entre outros. Greves a tempo parcial, como fazem os docentes, são normais, legais e legítimas. Não são as greves que nos prejudicam a vida, mas as más condições de trabalho de quem presta estes serviços.
Embora à frente de uma manifestação de 140 mil, quando tudo devia ser exigido, quando a força de um sector exige condições mínimas de negociação, Mário Nogueira – concorde-se ou não com ele, eu não concordo – disse em discurso, “estamos dispostos a ceder”. O que respondeu o Ministério? Mais serviços mínimos, que aniquilam qualquer direito constitucional à greve. No quadro da UE o Governo é claro – o Estado é pessoa de bem para os bancos e os gestores, os serviços públicos apodrecem aos nossos olhos, diariamente.
O pouco que o Ministério diz “ceder” piora a condição dos professores, já que os do quadro passam a ser flexíveis, passam a poder ser colocados (obrigatoriamente pelos directores) noutra escola do mesmo Agrupamento, pagando os custos do tempo e da deslocação. Esta é a solução para a falta de docentes – uberizá-los. Aos dos quadro.
Mesmo que possa concorrer todos os anos (e não de 5 em 5 anos) para não andar de casa às costas, como não abrem vagas, esta “cedência” é inútil. As vagas não abrem onde as pessoas vivem.
O Ministério não está disposto a “ceder”. Até na gestão de um quiosque quando há uma reunião deve haver uma ordem de trabalhos que é por todos aprovada. Todos os grupos de trabalho que participo antes da reunião enviam uma proposta de ordem de trabalhos, que é previamente submetida à votação. A ordem de trabalhos em discussão contempla uma pequena parte das exigências dos professores. No restante, que é a maioria, não há negociação porque o Ministério se recusa a colocar os temas na ordem de trabalhos. É um pouco como se conta de Ford a produzir carros, quando lhe pediram para mudar de cor, “façam os carros que quiserem desde que sejam pretos”
Quando o Ministério diz que “cede” os jornalistas não são meros pés de microfone. Devem ouvir o Ministério, os professores e decidir – sim, decidir, eles jornalistas, com os dados e análise em mão – quem tem razão, segundo um critério de verdade, verificação fontes, etc.
Raquel Varela