Professores em Vila Real: “Com um lápis na mão também se faz a revolução”

Professores com cravos de Abril em Vila Real porque agora a luta faz-se na escola

SAPO

“O cravo é o símbolo da revolução do 25 de Abril onde foram conquistados valores que estão a ser postos em causa. A educação é um dos pilares fundamentais de uma sociedade justa e democrática”, afirmou Fátima Campos, professora na Escola Secundária de São Pedro, em Vila Real, onde simbolicamente hoje se deu início ao terceiro dia da greve por distritos, convocada por uma plataforma de nove sindicatos.

A docente trazia um grande cravo na mão, com quase 1,5 metros de altura e as cores vermelha e verde da revolução de abril. Outros colegas vestiam camisolas com um cravo à frente e, nas costas, a mensagem “com um lápis na mão também se faz a revolução”.

“Não desisto desta luta porque é uma luta justa, não é em meu nome é em nome da escola pública, que está em perigo. Quem é que quer ser professor ao ver os professores a serem assim tratados pelo Governo e também às vezes pela sociedade. Os professores são fundamentais para uma sociedade democrática e justa”, salientou Fátima Campos.

“Costa escuta a escola, Costa escuta-a bem. Costa escuta a escola, olha a força que ela tem”, “Um, dois, três, já cá estamos outra vez” e “Respeito” foram algumas das palavras de ordem e cânticos que se ouviram hoje.

Elsa Afonso faz diariamente uma viagem de cerca de 120 quilómetros entre Bragança, onde vive, até Vila Real, onde trabalha.

É docente desde 1996 e este ano progrediu pela “primeira vez” na carreira, explicando que fez uma opção há 16 anos e que foi a de concorrer apenas num raio de 100 quilómetros para regressar a casa todos os dias.

“Fiz essa opção e assumi as consequências dessa opção. Consegui ficar sempre colocada, por vezes com horários incompletos ou a meio tempo. Não me parece normal num país de primeiro mundo que tenhamos que optar entre ter estabilidade familiar ou poder trabalhar”, salientou.

Por isso, acrescentou, “esta luta não é apenas uma questão salarial nem do tempo de serviço”.

“Acho que vai muito para mais além disso, acho que o que está em causa mesmo é o que nós queremos enquanto escola pública e enquanto país para o futuro dos nossos filhos e alunos. Não queremos que a única opção para eles terem uma vida digna seja sair do país”, afirmou Elsa Afonso.

Para Elsa Afonso, “ser professor neste país é estar condenado a fazer quilómetros por muitos e muitos anos, sem qualquer tipo de ajuda, e trabalhar numa escola pública cada vez mais degradada, em termos de qualidade e exigência”.

“No fundo, a escola pública transformou-se num ATL para garantir que os pais cumprem o horário de trabalho e têm onde deixar os filhos seguros, mas acho que esse não é o objetivo principal da escola e os pais deviam estar preocupados com isso também”, frisou.

Alguns estudantes juntaram-se aos professores em frente à Escola de São Pedro. Bernardo Fernandes, 18 anos, presidente da associação de estudantes deste estabelecimento de ensino disse que a luta dos docentes “é justa” e explicou que os alunos estão solidários com os professores.

“Se não tivermos um professor motivado, que goste da sua profissão, as aulas não vão decorrer da melhor maneira”, apontou.

Esta nova ronda de greves por distrito decorrerá até 12 de maio, terminando em Lisboa.

Entretanto, na quinta-feira os sindicatos dos docentes e Ministério da Educação regressam às negociações.

“Voltaremos à mesa das negociações e, como tem sido prática, isto tem altos e baixos, tem coisas que se vão conseguindo, porque as propostas iniciais do Governo eram extremamente agressivas e penalizadoras. Nós temos estado numa fase de tentar, no fundo, que essas propostas vão ao encontro aos professores e às perspetivas que os professores têm”, afirmou Alexandre Fraguito, do Sindicato dos Professores do Norte.

O dirigente sindical garantiu que os docentes continuam a manifestar, na escola e na rua, “toda a vontade de continuar a lutar” e lembrou que conquistas anteriores demoraram, em alguns casos, “anos” a concretizar-se.

“Isto é uma maratona, há momentos de maior fraqueza, mas o nosso objetivo está na meta”, sublinhou.

Durante a tarde de hoje, decorrerá uma manifestação de professores de todo o distrito, que se juntarão na principal avenida da cidade de Vila Real, a Carvalho Araújo.

As nove organizações sindicais são a Associação Sindical de Professores Licenciados (ASPL), a Federação Nacional dos Professores (Fenprof), a Federação Nacional da Educação (FNE), a Pró-Ordem dos Professores (Pró-Ordem), o Sindicato Nacional e Democrático dos Professores (Sindep), o Sindicato Nacional dos Profissionais da Educação (Sinape), o Sindicato Independente de Professores e Educadores (SIPE) e o Sindicato Nacional dos Professores Licenciados pelos Politécnicos e Universidades (Spliu).

FONTE: 

https://24.sapo.pt/atualidade/artigos/professores-com-cravos-de-abril-em-vila-real-porque-agora-a-luta-faz-se-na-escola

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1 comentário

    • Luís Miguel Cravo on 21 de Abril de 2023 at 14:14
    • Responder

    Finalmente ouvimos uma Professora, Elsa Afonso, que toca na palavra EXIGÊNCIA. Esta é aquela pequenina luz que ainda me faz admirar alguns dos meus pares. Escassos, é certo. Ainda assim, nós existimos. A escola pobre para pobres (metamorfoseada em “aprendizagens essenciais”, vulgo saber o mínimo possível porque, os que são abastados, podem saber em casa, nas suas bibliotecas e com os seus explicadores privados) é o erro mais grave cometido em décadas neste país. Os professores demitiram – se de ser profissionais e passaram a ser paus mandados do Eduquês e da chamada Capacitação Digital (um logro testado com a pandemia e, agora, parte da nova ordem nacional) que visa, para quem quer ser cego, exterminar o papel humano e fundamental do professor em sala de aula e como agente fulcral de mudança numa sociedade que se quer humanizada, culta e intelectualmente forte. Testes e exames de cruzes (online! Uma aberração!) é só e tampouco uma enorme náusea na alma de um país.

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