Após uma anterior reunião de apresentação, a Pró-Ordem e a Federação Portuguesa de Professores e de que faz parte, reuniram hoje com o Ministro da Educação, Ciência e Inovação e com os seus dois Secretários de Estado, bem como com a Secretária de Estado da Administração Pública, com vista ao inicio de negociações para a recuperação do tempo de serviço.
Na proposta escrita que este conjunto de membros do Governo nos apresentou nada consta sobre medidas compensatórias para os professores que estando no topo da carreira também perderam tempo de serviço congelado e que estarão mais ou menos próximos do momento de aposentação.
A este propósito, a Pró-Ordem teve ocasião de suscitar um pedido de esclarecimento ao Sr. Ministro perguntado se se trataria de um lapso involuntário ou se era propositado, tendo o mesmo respondido que é propositado e que não está prevista qualquer majoração para efeitos de aposentação, facto que não pode merecer o nosso acordo.
Também não pode merecer o acordo da Pró-Ordem a, ora proposta, revogação do Decreto-Lei no 74/2023, de 25 de Agosto que implementou alguns mecanismos em sede de progressão de carreira. De igual modo, os colegas que iriam recuperar o tempo de serviço perdido em lista de espera para progressão ao 5o ou ao 7o escalão já não o recuperam e se já o recuperaram ele ser-lhes-á agora descontado.
O Ministério propõe a recuperação anual de apenas 20% do tempo de serviço, o que perfaz 5 anos, mas no Caderno Reivindicativo que a nossa Federação entregou na primeira reunião realizada com esta equipa ministerial propusemos a recuperação em 3 anos.
Nós e o restante movimento sindical docente voltamos a reunir com a Tutela nos próximos dias 13 e 21 do corrente, pelo que, com o apoio do Corpo Docente, tudo iremos fazer para que o Governo se aproxime das suas justas aspirações.
Lisboa, 3 de maio de 2024
Pela Direção Nacional O Presidente da Direção Filipe do Paulo
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A escola não prepara para a vida. A escola é a vida.
John Dewey
Uns anos depois de começar a dar aulas surgiram os Tamagoshi.
Era uma chatice. Os bichinhos eletrónicos tinham de ser alimentados e era uma dependência dos miúdos, que os levavam para as aulas e insistiam em dar-lhes atenção ou o bichinho finava-se.
Tenho dado por mim a pensar nos Tamagoshi, quando ouço falar da discussão aguerrida dos telemóveis.
Por me lembrar de como eramos ridículos, nesse tempo, a falar de tamagoshi.
A História é realmente um lugar estranho….
Os tamagoshi encerram uma verdade sobre o problema: se os pais não dessem tamagoshi, não tinha havido problemas com tamagoshi.
A escola é parte da vida. Não é um segmento segregável do resto da vida dos miúdos.
Se, em família e fora da escola, o uso de telemóveis é desregrado e selvagem, não há esperança para a eficácia de proibições escolares, que ficam como um exotismo fora do mundo e um convite à desobediência pelo absurdo.
Se o telemóvel é o totem central da vida, sem alternativas, é na escola que se vai resolver o problema? E de forma radical?
E o telemóvel é só problema? Ou todos os temos no bolso, porque são úteis e um progresso? (falando de lugares estranhos da História, sabem o que foram luditas?)
Proibir telemóveis: o quadro legal atual
Sou de esquerda, como muitos os que me leem sabem. Mas sou liberal.
Não, no sentido do partido que se reivindica desse nome. Na verdade, um partido liberal capitalista em que o capitalismo é mais forte que o liberalismo.
O meu liberalismo é mais igualitário e de direitos fundamentais. E até acho que sou mais liberal que a IL, porque tenho uma cultura radical de Direitos Humanos (que em Portugal nem é muito popular). Eu chamo-lhe o “espírito Peter Benenson” e tenho quase sempre de explicar quem foi.
Liberal que sou, olho para tudo o que seja proibir como uma questão de liberdade.
Proibir telemóveis é limitar uma liberdade.
A nossa Constituição permite limitar liberdades. Tem um critério: a restrição de direitos fundamentais só pode acontecer “nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.” (Artigo 18º, nº2 da CRP)
Restringir o direito de levar e usar um telemóvel numa escola tem várias implicações:
Agradará aos “liberais” que lembre a primeira: o telemóvel é propriedade de alguém. E a propriedade é um direito fundamental cuja restrição é limitada.
O telemóvel é um instrumento de acesso à comunicação e expressão (que são direitos fundamentais, de restrição limitada, mesmo para menores de idade).
Os pais e encarregados têm muito a ver com isso, porque eles pagam o telemóvel, de que provavelmente até são donos e têm o direito de condicionar esse aspeto da vida dos seus filhos, cujos direitos exercem no seu superior interesse.
Por isso, podemos defender que restringir telemóveis serve causas e objetivos muito importantes (e não estou a dizer que não concorde com isso), mas se não houver consenso dos titulares de direitos conexos ao objeto, só através de uma lei da Assembleia da República se pode limitar o uso deles nas escolas.
E um pai, mesmo isolado da opinião geral, tem legitimamente o direito de achar que o seu filho pode expressar-se através do telemóvel e suas aplicações no recreio de uma escola se não houver lei proibitiva (e disse lei, não disse regulamento).
Os direitos existem nas leis para os proteger, na sua realidade efetiva, das maiorias que os queiram limitar ou retirar.
O lugar dos regulamentos
A proibição não pode fazer-se por regulamento da escola, se não houver lei habilitante que permita fazer o regulamento proibitivo.
A não ser que haja lei a dizer expressamente “As escolas podem proibir telemóveis no recreio”, proibir telemóveis no recreio, por efeito de regulamento interno, é ilegal e uma violação de Direitos Fundamentais.
As escolas, locais de ensino da Democracia não deviam, mesmo por boas razões, promover atuações que violam o regime de direitos fundamentais da Constituição.
Por muito úteis e benevolentes que sejam para os alunos os objetivos educativos da proibição, proibir, implica lei, porque eu posso achar que os telemóveis nas escolas são muito maus, mas pode haver quem ache que são muito bons.
E está no seu direito, já que só pode ser proibido por uma Lei da República (que nem pode ser um Decreto-Lei do Governo, mas obrigatoriamente uma Lei votada no Parlamento, precisamente porque limita Direitos Fundamentais e por isso tem de ser feita no órgão democrático por excelência).
E estou a pensar o caso do ponto de vista dos adultos e dos alunos.
Já vi proibições por via de “regulamento interno” escolar (numa das escolas até falavam de um “regimento”, palavra cujo uso é de uma ignorância crassa).
Por isso, face às proibições (hoje ilegais) de telemóveis em recreios, há que ver primeiro o que diz a lei vigente.
E a lei, feita no parlamento, por ser limitadora de Direitos Fudamentais, é o Estatuto do Aluno (a que uma passagem do PSD/CDS pelo Governo juntou o estúpido e despropositado acrescento nominalista “da ética escolar”).
Sobre telemóveis, cria um regime que é o que habilita para fazer normas sobre telemóveis.
Os regulamentos precisam sempre de uma lei habilitante porque não podem ser inovadores face à lei (isto é, em termos simples, não podem criar regimes, especialmente regimes restritivos, que vão além da lei).
O que diz a lei vigente….
Os limites do que hoje se pode fazer são os que estão escritos na lei, que diz isto, no capítulo dos deveres (artigo 10º)
“O aluno tem o dever, sem prejuízo do disposto no artigo 40.º e dos demais deveres previstos no regulamento interno da escola, de:(….)
r) Não utilizar quaisquer equipamentos tecnológicos, designadamente, telemóveis, equipamentos, programas ou aplicações informáticas, nos locais onde decorram aulas ou outras atividades formativas ou reuniões de órgãos ou estruturas da escola em que participe, exceto quando a utilização de qualquer dos meios acima referidos esteja diretamente relacionada com as atividades a desenvolver e seja expressamente autorizada pelo professor ou pelo responsável pela direção ou supervisão dos trabalhos ou atividades em curso;”
A má formulação do artigo (“sem prejuízo (…) dos demais deveres previstos no regulamento interno da escola”) parece que permite por no RI mais coisas do que as que aqui estão.
Mas isso é asneira de quem escreveu a lei. O regime de direitos fundamentais é protetor e limitativo e essa menção não permite fazer o que é inconstitucional. Isto é, a regra sobre telemóveis é só a da alínea r) e mais nada (nem menos nada, se me faço entender).
O regime dos telemóveis que está na alínea r) é então em resumo:
– Não legitima hoje a proibição em recreios ou fora de aulas (só legitima em aulas e outras atividades formativas ou reuniões). Se fosse para proibir em recreios o legislador previa. Não previu, logo é permitido (liberdade é mesmo isto….).
– Dá autonomia aos professores para usar o telemóvel em aula se acharem útil (aqui está um caso em que se dá poder aos professores e muitos preferem perdê-lo para uma proibição radical e genérica, o que não deixa de ser curioso sobre como nos concebemos em matéria de poder interno à escola).
Sobre recreios, o legislador que, insisto, é o único que tem o poder de restringir o direito de usar telemóveis (e que não habilita os Regulamentos internos para os proibir nos recreios) nada diz. Logo, são aí permitidos.
A legalidade de qualquer restrição implica uma lei nova.
Na minha opinião, o regime atual para aulas é muito razoável. Mas para funcionar e dar espaço ao uso pedagógico do telemóvel (e do computador a que o artigo se refere) é preciso que o sistema legal não caia na tentação de vir agora proibir a entrada de telemóveis nas escolas.
Com uma proibição geral, este artigo atual não fazia sentido.
Como pode usar-se com utilidade nas aulas, se o telemóvel não for permitido de todo na Escola?
As tendências de mudança da Lei
Bem, os defensores da proibição dos telemóveis perceberam que para levarem a água ao seu moinho têm de se mudar a lei. Por isso, há petições e pedidos de ação parlamentar. E acho muito bem. E se fizer falta a minha assinatura, assino (mesmo sem concordar com a proibição radical, acho que o assunto precisa de ser discutido).
E a discussão vai ser entre um artigo simplesmente proibitivo (“O uso e posse de telemóveis nas escolas por alunos com menos de 18 anos é proibido”) e uma coisa mais moderada.
E chamo a atenção que, se vencer a ideia proibicionista, essa regra proibitiva só pode aplicar-se aos alunos e não pode ser alargada aos professores e outros adultos.
É claramente uma limitação excessiva e a teoria “do exemplo que os professores devem dar” é um abuso de restrição inconstitucional (afinal se se proibirem os telemóveis é para promover o interesse educativo dos alunos e os adultos já estão educados).
Se algum dia chegar a haver uma lei proibitiva de telemóveis para adultos em escolas (e chamo a atenção que isso abrange os alunos com mais de 18 anos) eu serei o primeiro a invocar a inconstitucionalidade do regulamento que a aplique. Em Tribunal. E ganharei.
Mas o que pode ser uma coisa mais moderada? E porque acho que deve ser uma coisa mais moderada?
Em primeiro lugar a norma legal teria que ser qualquer coisa do género:
“Os regulamentos das escolas podem impor a alunos com menos de 18 anos limitações permanentes ou temporárias à posse e uso de telemóveis e outros equipamentos informáticos em todos os espaços das escolas e atividades escolares”
“O uso de telemóveis pode ser permitido, com fins de utilidade pedagógica, em salas de aula e atividades escolares, desde que haja autorização dos órgãos da escola e dos docentes responsáveis pelas aulas ou atividades” (presume-se que a autorização implica o uso do telemóvel ser útil, como é óbvio, mas dá-se liberdade aos órgãos e docentes de determinar o contexto da norma).
“Nos casos em que a posse seja proibida o regulamento pode prever a possibilidade de ordenar ao aluno, que com ele seja detetado, a entrega do objeto para ser guardado na escola e depois entregue num certo prazo ao encarregado de educação, podendo ser aplicada sanção por violação da norma de proibição.”
Esta questão coloca um problema: a posse. Obviamente que a recolha de telemóveis em caixas e cacifos, na entrada de salas ou de escolas e outras soluções tem muitos problemas (nomeadamente furtos e confusões). Não vamos, nem legalmente é possível, andar a revistar alunos para ver se têm telemóveis consigo, escondidos. Isso era uma bizarria sem jeito nenhum. Uma perda de tempo e uma coisa lamentável numa escola.
Quando fui confrontado, num contexto proibitivo em sala de aula, com as questões de telemóveis e seu abuso em sala de aula criei, como diretor, uma norma prática para o exercício do poder disciplinar que a lei me atribuía.
Se o professor não quer que usem telemóveis na sala, não interessa se o aluno tem ou não telemóvel consigo, desde que não o use e não mostre, mas se é proibido usar, se o tiver à vista, está a infringir.
E com esta regra não é preciso mais nada. Mas isto pode ser feito hoje para as aulas, mas nunca agora, sem mudar a lei, para os recreios (embora haja escolas a fazer, baseadas na suposta “bondade” da medida).
E tenho a dizer que a minha experiência de 6 anos no Ministério da Administração Interna num serviço que tinha poderes de ordem pública e de coordenação com polícias me ensinou algo: normas demasiado proibitivas são muito difíceis de fazer cumprir sem infrações. E um número alto de infrações enfraquece a possível adesão voluntária à norma, que será maior se ela for razoável.
Com lei bem feita, deve caber às escolas decidir…
Com as minhas normas moderadas dava-se liberdade à escola.
Muitos Diretores com muito espírito de doutrinador, que alinha com a opinião pública missionária (que normalmente limita liberdades e pouco atende ao regime das liberdades constitucionais do país), já andam a proibir em toda a parte e até a professores.
O que eu digo é que primeiro têm de mudar as leis. Não, os órgãos da escola “não são soberanos”. Pelo menos nunca os vi como órgãos de soberania na Constituição.
As minhas sugestões de norma íam sempre obrigar, por lei, a um debate interno largo e a uma conciliação interna sobre este assunto.
Isto porque todos os regulamentos por lei (norma do CPA), antes de entrar em vigor, tem de ser sujeitos a consulta pública dos interessados (30 dias com larga publicidade).
Assim, qualquer abrangido pela norma, até os alunos, têm o direito de se vir pronunciar, antes do RI ser aprovado, e explicar as suas razões.
Nessa altura é ouvir e perceber as razões de cada um.
Por isso, a proibição total, ou com nuances, sempre terá de ser debatida.
E até posso sonhar, num contexto com uma lei moderada, que permite, mas não impõe, com assembleias de alunos e de pais a referendar as normas e aconselhar os conselhos gerais sobre o sentido da regulação do problema.
Proibir é o mais fácil, regular em equilíbrio, é o mais difícil.
Mas é o melhor a fazer.
Os telemóveis não são vida? Como vamos ter adultos a regular o seu uso, se simplesmente se proibem, quando estão a aprender?
Hoje a discussão está quente. E quem é que ainda se lembra do que era um tamagoshi?
Luís Sottomaior Braga
(professor há 29 anos, por isso me lembro dos Tamagoshi e gestor escolar durante 8 anos)
Obviamente que farão sempre sentido, mas agora ainda mais, depois de ter sido conhecida a proposta do actual Governo sobre a recuperação do tempo de serviço dos Professores…
Com franqueza, não parece que a proposta apresentada pela Tutela em 3 de Maio de 2024 consiga corresponder às aspirações da maior parte da Classe Docente, nem satisfazer as suas expectativas…
Em 30 de Abril passado, a Missão Escola Pública emitiu um comunicado, lançando, por essa via, um repto aos Sindicatos da Educação, no sentido de alcançarem o consenso, justificando assim essa premência:
– “… Missão Escola Pública apela a todos os sindicatos para que, no dia 3 de maio, se juntem e levem uma proposta conjunta e única para a reposição do Tempo de Serviço.”
– “Este é o tempo de procurar pontos de contacto entre as diversas estruturas sindicais da Educação e não o de encontrar os pontos que as separam. O único objetivo deve ser o de defesa dos interesses do grupo profissional que representam, de forma inequívoca e imediata.”
Este apelo, subscrito por muitos Professores, parece, contudo, ter sido ignorado e desvalorizado pelos principais Sindicatos que, ao que se conhece, não responderam ao desafio que lhes foi dirigido…
Os mesmos Sindicatos que, do alto do seu “egocentrismo” e do seu “autismo”, parecem acreditar em algo deste género:
– Nós é que sabemos, não precisamos de conselhos de ninguém, não recebemos lições de ninguém, o que vem do exterior não nos interessa…
Lamentavelmente, os Sindicatos da Educação não têm conseguido opor-se à endémica desunião docente, uma vez que eles próprios se têm constituído como factores de divisão, originando frequentemente comportamentos facciosos, muitas vezes assentes num incompreensível corporativismo e na exaltação de determinados protagonismos…
Principais sindicatos a fazerem-se de moucos, face a apelos sensatos?
Sim, parece que sim…
E enquanto assim for, não se sairá daí para lado nenhum e não se chegará a lado nenhum que seja bom para os Professores…
Será assim tão difícil harmonizar propostas entre Sindicatos?
Será assim tão difícil perceber que o entendimento e o consenso entre Sindicatos podem assumir particular importância, sobretudo num contexto de “governação a prazo”?
Muito provavelmente, continuará a ser como sempre foi:
– Cada Sindicato a reiterar a perspectiva do “orgulhosamente só”, incapaz de se descentrar de si próprio e de unir esforços com outras estruturas sindicais…
Nessa perspectiva, iminentemente arrogante e individualista, os interesses dos seus supostos representados serão efectivamente defendidos?
Essa perspectiva conseguirá defender adequadamente aquilo que é mais benéfico para todos os Professores?