Guião de leitura individual da negociação que aí vem  – Luís Sottomaior Braga

IMAGEM
Penso que a negociação vai fluir melhor nos próximos tempos. E o barulho que fizemos ajuda a esse quadro ser mais sólido do que parece.
Muita gente acha que o movimento foi criado por uma pessoa que iluminou o caminho. Mas não foi.
Foi um movimento de professores, auto organizado e disseminado
Há muita confusão, em certos discursos salvificos, sobre o papel de um único indivíduo na História.
É a confusão entre o catalisador e o combustível.
Se os professores conseguiram pôr a opinião pública ao seu lado, isso não foi fruto dos grandes méritos de uma liderança carismática.
No domínio da imagem pública houve 2 coisas fundamentais: quebrou-se o monopólio “o Mário Nogueira fala pelos professores”. E houve muitos professores a falar e a falar bem. E isso funcionou.
As entrevistas recorrentes de anónimos à porta da escola foram mais importantes que certos discursos de má retórica e choraminguice a confundir assuntos.
Professores, tenham auto-estima: não foi nenhum líder que nos pôs perto da vitória Fomos nós.
E essa imagem passou. O PS perdeu 9% nas sondagens e os portugueses estão connosco e querem a reposição do tempo de serviço, o tema essencial e grande fiel da balança da negociação porque todos ganham nele.
COORDENAÇÃO
As negociações precisam foco. Devia haver uma cimeira de todos os sindicatos e ser definido um guião comum de “linhas vermelhas” que até podia ser secreto.
Há um problema: há um sindicato que está desfocado dos temas e que tem um trabalho de preparação técnica inferior aos outros.
Alguns acham que é logística. Eu acho que é intencional, porque é ideológico. E já sei que vêm aí os trolls.
Mas as propostas do governo deviam ter respostas coordenadas, alinhadas, padronizadas e integradas de todos. No fundo, antecipar propostas para ensaiar respostas e cenários. Isso implica debate prévio e mais estudo em comum.
A unidade não interessa muito nas ruas, mas é essencial nas negociações (por razões técnicas de como uma negociação funciona). Que implica alinhamento em cada lado do par de interesses.
E irem em 3 vias, do nosso lado, a 1 só, do outro, não é bom (hoje, na negociação, do nosso lado, temos a “via fofa” , a “via aberta que parece falar grosso” e a “via ao lado que,ideologicamente se sabe nem quer realmente negociar”).
Devia haver uma via única contra a posição de quem pode impor. Para isso, há uma negociação de parte interessada a fazer entre as 3 vias.
A tal cimeira, que devia ser feita nos próximos dias.
Mário Nogueira ganhava pontos se promovesse isso e entalasse os que querem fugir. É o mais velho e devia preocupar-se com o legado.
Até porque pode hoje conseguir um bom acordo e correr o risco de não o poder assinar por ser atacado à esquerda por ideias mirabolantes sobre o que se pode conseguir.
E não precisamos de lérias mas de um bom acordo.
LIGAÇÃO E CONSULTA AOS INTERESSADOS
Nessa cimeira, os sindicatos deviam assumir o compromisso da “consulta geral, mesmo que atrase.”
Hoje a tecnologia permite consultar em horas.
Nunca repetir 2010 e assinar à pressa, só por ser o “acordo possível” .
A teoria do mal menor é de moralidade duvidosa.
Vamos fazer o melhor acordo possível ainda que demore?
E sem trocar uns pelos outros? Daí a necessidade de conciliação.
VINCULAÇÃO AO ACORDO
Todos se deviam vincular ao princípio “só assinamos ou recusamos a versão final depois de consulta transparente aos interessados”. A meu ver um referendo, que não é assim tão difícil.
A DECISÃO PESSOAL DEVE SER INDIVIDUAL MAS A PENSAR NO PREJUÍZO DOS OUTROS
Quando houver uma proposta final de acordo vou olhar para ela de 2 ângulos e acho que todos devíamos fazer isso:
O que ganho? Quem se prejudica com o meu ganho?
Para isso, eu vou ter um método pessoal simplificado e concreto, já que não consigo pensar a diversidade de todos os prejuízos de dezenas de milhares de professores.
Fiz uma lista de 10 pessoas muito diversas que são professores e professoras, amigos recentes e muito antigos, e/ou colegas próximos ou com situações especiais, estimados por mim, e que têm , na diversidade, a particularidade de estarem hoje “pior” que eu. Serão os meus tipos ideais de análise à Weber.
E vou ponderar o meu voto no dito referendo a olhar para o meu ganho (eu, professor de quadro de escola que não precisa de mobilidade, não tem de concorrer e que é subdiretor, mas está no 4º escalão à espera de vaga) mas, também, a ver se o meu ganho no acordo os prejudica.
E, na altura, falarei disso depois de estudar os efeitos em cada caso (e preservando quem são os membros da amostra). Talvez ajude porque na minha amostra está uma grande diversidade de situações profissionais.
Não faria nunca a lista das pessoas pelos nomes porque, ter a minha consideração e estima ou até ser meu amigo como alguns são, estes dias, em certos setores, é cadastro, mas ficam as siglas dos 10 nomes da minha amostra por ordem alfabética (acho que nem os próprios vão descobrir quem são e alguns talvez achem graça saber).
AMFS, CAVB, CAPL, HL, JCMPL, LML, LTG, ML, RP e SM.
Com esta amostra cobrirei a análise concreta de todo o universo de casos de QZP, contratados e deslocados.
Sobre a parte da negociação que já anda agora nas bocas do mundo tenho a dizer que é tudo péssimo, mas a proposta, a ser aceite, é particularmente muito má para QZP vinculados há pouco (porque obriga a voltar à “salada geral”, sem ganho) e péssima para quem tenha questões de saúde que realmente justifiquem mobilidade.
Mesmo, sem prejuízo meu, não votaria sim.
Unidade ética prática é isto, não são proclamações unitárias ocas e só bonitas. É pensar nos problemas que o meu ganho cria aos outros (uma coisa do género do Mandarim do Eça).
O prejuízo de uns, descompensado, não pode basear o ganho de outros. Foi isso que falhou na negociação dos titulares.
E não pode falhar de novo.
O governo tem muito má fé, mas isso não deve ser a base na nossa atitude.
Lá porque os outros mentem e nos tratam mal não devemos fazer o mesmo.

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5 comentários

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    • Lucinda Pereira on 27 de Fevereiro de 2023 at 11:03
    • Responder

    Apoiado. Brilhante raciocínio! O raciocínio que quem o deveria fazer não o sabe e nunca se preocupou, nem se preocupa em fazer, por isso a situação chegou ao caos total em todos os aspetos, porque os mesmos, nunca foram racionalizados.
    Isto sim, é gerir em DEMOCRACIA. Há professores muito mal aproveitados.
    Luís Sottomaior Braga a ministro da Educação, já!

    • DE on 27 de Fevereiro de 2023 at 12:11
    • Responder

    Em vez de guerras intestinas interessa abrir guerra ao sonso que finge negociar e que por todos os meios degrada o ensino e deteriora a imagem dos professores face à opinião pública.
    Por via dos egos se pode deitar tudo a perder.
    A maioria dos professores quer seguir a via da autenticidade. Isso implica desde já derrubar o fingidor que é o ministro da educação!

    • Rosa on 27 de Fevereiro de 2023 at 14:12
    • Responder

    Devido às más negociações existem professores prejudicados desde 2005!…

    • Maria on 27 de Fevereiro de 2023 at 14:14
    • Responder

    As linhas vermelhas têm de ser os aspetos comuns a todos os professores..a primeira, emediata e sem negociação possível, a recuperação do tempo de serviço para todos, incluindo para os mais velhos (nem que seja para estes o tempo ser traduzido em diminuição da idade de reforma)…a outra linha vermelha será abertura de negociação para TODOS os outros aspetos, incluindo o modelo de recrutamento, modelo de avaliação, cotas, horário não lectivo, etc…

    • Um troll on 27 de Fevereiro de 2023 at 15:32
    • Responder

    “Há um problema: há um sindicato que está desfocado dos temas e que tem um trabalho de preparação técnica inferior aos outros.
    Alguns acham que é logística. Eu acho que é intencional, porque é ideológico. E já sei que vêm aí os trolls.”

    Escrever isto é tão ou mais ideológico como aquilo que caracteriza como ideológico à partida, sem bases objetivas. E não se percebe bem o que é intencional: a falta de logísitca?!
    Quanto ao introito. Não foi um indivíduo, foi um sindicato. Não foi um sindicato, fomos todos nós, sim! Mas uns mais do que outros, e a ingratidão, quer gostemos ou não de certas pessoas e/ou estejamos ou não alinhados com elas ideologicamente, fica-nos sempre mal. Lá porque os outros…

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