Relativamente a notícias divulgadas hoje à tarde sobre o Relatório da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) da Assembleia da República sobre Contagem de tempo de serviço em falta para efeitos remuneratórios: docentes e demais carreiras das Administrações Públicas, o Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) esclarece o seguinte:
As estimativas da UTAO em relação ao custo da recuperação do tempo de serviço são inferiores aos cálculos do MECI. A diferença resulta da adoção de critérios e cenários diferentes do cálculo do custo, nomeadamente a idade de saída para a reforma.
O custo hoje divulgado pela UTAO de 470 milhões de euros em 2028, dos quais “202 ME em termos líquidos”, tem em conta o universo dos professores dos quadros entre o 1.º e o 9.º escalão da carreira, tendo sido retirados os docentes que atingem a idade legal de aposentação.
Os cálculos do MECI têm em conta que todos os professores abrangidos permanecem na carreira até aos 70 anos, sendo esta a principal diferença para os custos da UTAO.
No dia 21 de maio, após ter sido alcançado um acordo com sete estruturas sindicais de professores, o Ministro da Educação, Ciência e Inovação disse, em declarações aos jornalistas, que a recuperação do tempo de serviço congelado dos docentes teria, em2024, um custo para o Estado (líquido, de acordo com a denominação do relatório da UTAO) de cerca de 40 milhões de euros.
O Ministro da Educação, Ciência e Inovação, Fernando Alexandre referiu também que, a partir de 2027, após estar concluído o processo de recuperação do tempo de serviço, a medida teria um custo anual para o Estado (líquido, de acordo com a denominação do relatório da UTAO) de cerca de 300 milhões de euros, segundo as estimativas de uma equipa técnica do MECI.
Os 300 milhões de euros não representam, assim, o acumulado da despesa ao longo de 2024, 2025, 2026 e 2027.
Os 300 milhões vão reduzindo a partir de 2028, à medida que os docentes vão passando à aposentação.
O meu estudo não demorou meses a fazer, mas sim 5 minutos. E a pequena diferença pode ter apenas a ver com o facto dos dados do meu estudo serem de 2022 e daí até agora já bastantes docentes se aposentaram e/ou já subiram ao 10.º escalão.
UTAO aponta que recuperação do tempo de serviço perdido pelos professores deverá ter impacto bruto de 469 milhões de euros, mais do que os 300 milhões de euros que o Governo contava gastar.
O Governoconta gastar 300 milhões de euroscom a recuperação do tempo de serviço dos professores, mas, afinal,poderá ter de abrir ainda mais os cordões à bolsa. De acordo com uma análise da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), que foi conhecida esta segunda-feira, a reposição dos anos perdidosdeverá ter um custo total bruto permanente de 469 milhões de euros.
Os professores viram as suas progressões congeladas durantenove anos, quatro meses e dois dias.Desse período, o Governo de António Costarecuperou dois anos, nove meses e 18dias, mas os sindicatos que representam os docentes nunca desistiram de ver o restante tempo —seis anos, seis meses e 23 dias— reconhecido.
Seis meses depois, a análise é conhecida esta segunda-feira, numa altura em queo Governo, agora liderado por Luís Montenegro, já chegou aacordo com a maioria dos sindicatospara a reposição desses mais de seis anos.
No relatório, a UTAO estudatrês cenários possíveise alternativos para o faseamento do tempo de serviço perdido. No primeiro cenário, é assumido que os créditos individuaisseriam reconhecidos e pagos integralmente aos docentes em 2023. Já no segundo cenário, é assumido que os créditos individuaisseriam reconhecidos e pagos à razão de 25%do total em cada um dos anos de 2024 a 2027.
Já oterceiro cenário é o correspondente ao “faseamento que foi acordado entre o Governo e as sete estruturas sindicaisa 21 de maio”, isto é, o crédito é atribuído à razão de25% aoano, iniciando-se o pagamento da nova remuneração a1 de setembro de 2023 e a 1 de julho de 2025, 2026 e 2027. Quer isto dizer que 2028 será o primeiro ano com 14 remunerações mensais com 100% do tempo de serviço recuperado.
Com base nisso, a UTAO calcula que a recuperação do tempo de serviço vai ter umimpacto bruto de 41 milhões de euros, já no último quadrimestre de 2024. O Governotinha apontadopara 40 milhões de euros este ano, o que significa que as contas estão alinhadas com a UTAO.
“A aplicação da modulação da medida neste cenário 3 implicará a subida da despesa bruta com pessoal no ano cruzeiro de 2028 em 469 milhões de euros face à ausência de medida”, lê-se no relatório, que assinala também que, “utilizando como referencial o PIB previsto para 2024 no Programa de Estabilidade mais recente, é possível afirmar queo impacto bruto no saldo global das Administrações Públicas no ano cruzeiro de 2028 corresponderá a 0,07% do PIB“.
Ainda assim, umaparte significativa dessa verba é “recuperada” pelo Estado através de impostos e contribuições sociais. Por exemplo, do custo de 41 milhões de euros previsto para este ano, 23 milhões de euros deverão regressar aos cofres do Estado. Por outras palavras, ocusto líquido é de 18 milhões de euros.
Olhando para o custo permanente, dos 469 milhões de euros, 267 milhões de euros voltam para o Estado pela via dos impostos e contribuições sociais, o que significa que oimpactolíquido da recuperação do tempo de serviço dos professores é de 202 milhões deeuros, de acordo com a UTAO.
No relatório conhecido esta segunda-feira, a UTAO adianta também que não foi capaz de estimar o impacto de uma medida equivalente para as demais carreiras da Função Pública que ainda não recuperaram todo o tempo de serviço congelado.
“É incipiente a existência de bases de microdadosem serviços-chave da Administração Centralpara realizar avaliações de impacto de medidas de política sobre emprego e remunerações. Como é possível lançar quase todos os anos estas medidas e, em 2024, ainda não existir informação de suporte às decisões? Decide-se de olhos quase fechados ao custoe à eficácia das medidas“, remata a UTAO.
Os professores do 1.º ciclo estão mais velhos e trabalham demasiadas horas, segundo um estudo da Fenprof, que revela que muitos dão aulas em edifícios degradados, com falta de equipamentos e turmas demasiado grandes.
Entre o final de 2023 e o início deste ano, a Federação Nacional dos Professores (Fenprof) realizou um questionário sobre condições de trabalho no 1.º ciclo ao qual responderam milhares de professores, uma amostragem “representativa da realidade das escolas e dos docentes”, disse a sindicalista Catarina Oliveira.
Apenas 5% dos professores que esta segunda-feira dão aulas têm menos de 40 anos, revelou Catarina Oliveira, que também é docente do 1.º ciclo e, apesar de ter quase 48 anos, é “considerada uma jovem pelos colegas”.
Quase metade dos professores (48,5%) tem mais de 51 anos e a grande maioria dá aulas há mais de duas décadas.
A sindicalista salientou que a experiência poderia ser uma vantagem, mas “o desgaste de anos de serviço, aliado à crescente sobrecarga de tarefas que nada têm a ver com o ensino, acaba por suplantar essa vantagem quando se fala de trabalhar com crianças e das necessárias agilidade e capacidades física e mental”.
Quase todos os professores são titulares de turma (79,2%), tendo um horário que ultrapassa largamente as horas previstas por lei, disse por seu turno José Feliciano Costa, secretário-geral adjunto da Fenprof, em conferência de imprensa esta segunda-feira em Lisboa.
Uma em cada quatro turmas (24,1%) ultrapassa o número de alunos previstos na lei e, nas turmas com alunos que precisam de medidas seletivas ou adicionais, a situação é ainda mais preocupante.
Segundo o inquérito, 46% destas turmas têm mais de 20 alunos e num terço destas turmas existem mais crianças apoiadas do que o previsto por lei (o limite é dois). Para Catarina Oliveira, há uma “dupla irregularidade promovida por sucessivos” governos.
Também existem problemas nas turmas com alunos estrangeiros. A lei prevê a presença de um professor de Português Língua Não Materna quando a escola tem mais de dez alunos imigrantes, mas muitas têm menos pelo que não são abrangidas pela medida.
Segundo Catarina Oliveira, “77,5% das escolas tem de conseguir proporcionar o serviço educativo a estas crianças sem o apoio de qualquer docente focado na aprendizagem do português enquanto língua não materna”, o que acaba quase sempre por sobrecarregar os professores do 1.º ciclo.
A maioria dos professores (59%) considera que as turmas são muito grandes e que fica em causa o direito ao apoio individualizado, à interação personalizada, mas também “à disciplina dentro da sala de aula e à produtividade do trabalho”.
O inquérito revelou ainda que mais de 40% dos professores são “obrigados ou pressionados a fazer a vigilância dos intervalos”, perdendo o direito a uma pausa consagrada na lei.
Também as reuniões acontecem roubando tempo da vida pessoal, segundo a opinião de 44,1% dos inquiridos.
Um em cada sete professores atribui a sobrecarga de trabalho à burocracia, que representa quatro ou mais horas de trabalho semanal para 60% dos docentes.
“Esta sobrecarga afeta, acima de tudo, a vida pessoal e familiar (89,1%), a saúde mental (76,2%), a planificação de atividades (70,7%) e a produção de recursos (70,1%)”.
Apenas 13,3% dos professores com mais de 60 anos usa as reduções de horário a que tem direito, disse Catarina Oliveira, explicando que os docentes não pedem a redução do tempo de trabalho direto com alunos porque muitas vezes são-lhes atribuídas tarefas igualmente desgastantes.
Catarina Oliveira contou a história de duas professoras de uma mesma escola que pediram a redução de cinco horas semanais e foi-lhes atribuída, em alternativa, a turma da colega, “ou seja, havia um dia em que tocavam de turma e iam dar aulas para a sala do lado”.
Quase metade dos edifícios (40,6%) necessita de obras e 70% não tem equipamentos suficientes. As maiores falhas são ao nível da rede de internet, dos computadores e dos espaços desportivos.
Oito anos de governação por António Costa/Tiago Brandão Rodrigues/João Costa transformaram a Área da Educação, em particular a Escola Pública, numa amálgama de insensatez, deixando-a em frangalhos, sem rumo definido e sem identidade reconhecível…
Para o actual Ministro da Educação, a tarefa de consertar o anterior apresenta-se como algo francamente ingrato, hercúleo, muito difícil de concretizar, tantos são os aspectos a carecer de intervenção urgente e os inúmeros problemas herdados da anterior gestão…
Em muitas escolas o Corpo Docente encontra-se visivelmente envelhecido e a falta de Professores tornou-se num problema incontornável…
Em 14 de Junho passado foram anunciadas, pelo Ministro da Educação Fernando Alexandre, as linhas gerais do Plano +Aulas +Sucesso, tendo como principal objectivo a redução do número de alunos sem aulas…
Entre as medidas anunciadas, destaca-se uma, dirigida aos Professores mais “entradotes”:
– “Incentivar o prolongamento da vida ativa dos professores”, que alegadamente comportará uma remuneração adicional, até 750 euros brutos, para quem atingir a idade de reforma e queira continuar a dar aulas (Site oficial do XXIV Governo, consultado em 14 de Junho de 2024)…
Há poucos anos, quando já era notório, mas ainda não “universalmente aceite”, o envelhecimento da Classe Docente, ouvi, numa Sala de Professores, qualquer coisa parecida com isto, proferida por uma Professora de Matemática, com um apurado sentido de humor:
– “Qualquer dia, vamos andar todos algaliados em rede”…
A afirmação anterior, que naturalmente suscitou o riso generalizado de quem a ouviu, não terá sido, contudo, levada muito a sério, uma vez que, à época, o mais certo seria que (ainda) não se acreditasse que os problemas do envelhecimento docente e da falta de Professores pudessem tomar, em relativamente pouco tempo, proporções tão graves e alarmantes, como as que se verificam neste momento…
Dado o desencanto e o “supremíssimo cansaço, íssimo, íssimo, íssimo cansaço” (alusão a Álvaro de Campos) que, no geral, grassam na Escola Pública, parece muito difícil acreditar que o repto, aparentemente bem intencionado, lançado pelo Ministro, possa ter uma adesão significativa por parte daqueles a que se destina: os Professores “entradotes”…
De forma sarcástica, mas nunca desrespeitosa para com os Professores “entradotes”, dir-se-ia que o mais avisado será, talvez, lançar um Concurso para o fornecimento de algálias, andarilhos e aparelhos geolocalizadores com botão de pânico, com vista ao equipamento das escolas com esses apetrechos…
Fatalmente, ninguém vai para novo…
Pode não parecer, mas este texto pretende ser, de certa forma, um elogio à Velhice… Nos tempos que correm, conseguir chegar a Velho é um verdadeiro feito…
Um elogio à Velhice de quem vai a caminho de também poder ser considerada como “entradota”, ainda que o meu espelho seja, frequentemente, “muito piedoso” e nem sempre me mostre alguns indisfarçáveis cabelos brancos ou rugas e outras inconfessáveis mazelas… Se é que me faço entender…
Já o espelho da escola costuma ser absolutamente “cruel e inclemente” e mostra-me, muitas vezes, aquilo que o meu tenta disfarçar… Deve ser da incidência da luz… Deve, deve…
E a culpa disto tudo será, com certeza, das tágides, só pode ser das tágides…
A propósito das comemorações oficiais dos 500 anos do nascimento de Luís Vaz de Camões e do Plano +Aulas +Sucesso, lembrei-me das tágides…
As tágides, ou ninfas do Rio Tejo, tidas como supostas musas inspiradoras de Camões, já não serão o que eram, pois parece que deixaram de cumprir a sua principal função: estimular a criatividade e a imaginação…
As tágides talvez se tenham cansado dos Portugueses e “deram de frosques” para outras paragens ou então continuam no Tejo, mas muito provavelmente inebriadas pelas mais variadas substâncias estranhas que vão parar ao leito de tal rio, andarão perdidas nas muitas “trips” proporcionadas por tais consumos…
E, já agora, ainda que não seja “devota” de Camões – o meu “Deus” é, e será sempre, Fernando Pessoa – não pode deixar de se assinalar a notável capacidade de imaginação, de criatividade e de escrita de alguém que há 500 anos já seria um portentoso “influenciador”…
Precisa-se urgentemente de criatividade, imaginação e ousadia…
Há agrupamentos que vão ver sair mais de 90 docentes. Segundo o representante dos diretores escolares, isso é preocupante, porque “uma saída em massa, se todos a conseguirem, provoca uma grande renovação e não haverá grande estabilidade nessas escolas”.
No concurso interno de professores para o ano letivo de 2024/2025 mais de 46 mil (46.088) docentes concorreram para sair, o que representa um aumento de 37% face ao último concurso, em 2022, cujo número de pedidos de mudança foi de 33.700. Há agrupamentos onde mais de 90 professores querem mudar para outra escola.
No Agrupamento de Escolas Padre Benjamim Salgado, em Vila Nova de Famalicão, 92 professores do quadro de escola (QE) concorreram para sair. No Agrupamento de Escolas de Vilela, Paredes, são 90. Na lista dos agrupamentos que vão perder mais docentes há 23 escolas com 50 ou mais pedidos de saída. A grande maioria desses agrupamentos situam-se nas zonas Norte e Centro do país e apenas seis na zona Sul. O Diário de Notícias contactou dezenas de docentes para perceber o que os leva a quererem uma mudança e os motivos são variados, sendo o excesso de trabalho a principal causa apontada.
Cristina Mota, porta-voz do movimento Missão Escola Pública, acredita que o modelo de gestão está por detrás desta realidade. “O ambiente nas escolas causado pela autocracia é angustiante”, afirma. Uma docente a lecionar numa zona de Braga, e que não quis identificar-se para não sofrer represálias, partilha a mesma visão. “Sou QE há 16 anos e concorri para sair. As direções das escolas estão muito incrustadas no posto. Na minha escola é a mesma pessoa há mais de 30 anos e o modelo de gestão é o mesmo há décadas. Foi isso que me motivou a tentar sair”, afirma. A docente acrescenta a retirada de poder de decisão aos professores. “Há 10 ou 12 anos os departamentos tinham voz. A nossa participação na escola agora é mais executar o que outros determinam e é muito desmotivante. Somos uns meros executores e guardadores de crianças. É preciso um abanão no sistema educativo. As pessoas andam a arrastar-se nas escolas. As escolas devem voltar ao seu papel de ensinar”, conclui.
Já Isabel Braga, efetiva na Escola de Colos, em Odemira, há oito anos, está a dar aulas em mobilidade no Cercal do Alentejo e concorreu para tentar ficar efetiva na escola onde está colocada. “Em Colos estava sobrecarregada e tive todos os sintomas de burnout, tinha turmas de 2.º e 3.º ciclos, quatro disciplinas, era diretora de turma (DT) e pertencia ao conselho geral. Nesses oito anos fui também coordenadora dos exames. Estava esgotada”, conta.
“Tenho de levar trabalho para casa e trabalhar até à uma ou duas da manhã”
O excesso de trabalho também está na origem da vontade de mudança de uma docente que não se quis identificar, porque não sabe se irá conseguir mudar e não quer “ter problemas”. É QE há mais de 20 anos numa escola do Seixal e está desgastada com o “excesso de trabalho burocrático”. Apesar de estar muito próxima da sua residência, a professora de Educação Musical concorreu para mudar de agrupamento. “As minhas 35 horas de trabalho semanal são, na realidade, muito mais de 50, pois, com a quantidade de turmas que tenho, para fazer o que me compete tenho de levar trabalho para casa e trabalhar, todos os dias até à uma ou duas da manhã”, salienta. No início da carreira, recorda, tinha sete ou oito turmas, agora, mesmo com a redução de horário (a partir dos 50 anos), tem nove – caso contrário teria 11. “Já tive 22 turmas nesta escola. O trabalho de conhecer os alunos, de planificar, de adaptar as atividades, é imenso. Quem quer fazer um trabalho honesto não o consegue com este número de alunos. E temos meninos com educação específica integrada, e tudo isto exige tempo e trabalho”, lamenta.
A docente diz sentir estar a trabalhar pro bono e ter chegado ao limite. A somar ao excesso de trabalho está ainda “a falta de respeito dos alunos e dos encarregados de educação [EE]. Este ano foi demais a indisciplina e a falta de respeito dos EE. Como DT, fico desmotivada com as queixas que faço aos EE por causa, por exemplo, dos palavrões ditos dentro da sala de aula sem ver da parte deles qualquer preocupação. A falta de respeito foi a gota de água, assim como a falta de vontade dos alunos em aprender”. E conta que tem alunos que “colocam a cabeça na mesa e se recusam simplesmente a trabalhar. Este ano com isto tudo entrei numa depressão. Estive até ao fim sem baixa, mas não aguento mais. Ainda na sexta-feira passada meninos da minha DT fecharam uma menina numa sala, sabe-se lá para fazer o quê”, recorda. A professora de Música diz ter chegado a pensar mudar de profissão e confessa-se “completamente desgastada”. “Estou perto de casa e era uma escola onde pensei que me ia reformar, mas temos uma direção que em tempos tinha sensibilidade para estas questões. De há dois ou três anos para cá mudou. Por exemplo, no ano passado cortaram-nos as horas todas para as atividades, como os clubes de teatro e outros. São estes pequenos momentos de prazer que ajudavam a contrabalançar os mais negativos, e já não os temos.”
“Tratam-nos como se fôssemos guardadores de crianças”
Patrícia Carreira, professora do 1.º ciclo, mas com habilitações também para o 2.º, concorreu para sair da escola porque quer mudar para o 2.º ciclo. Há mais de 20 anos na mesma escola, na Margem Sul, diz ter chegado ao limite. “Sempre gostei muito do que faço e de trabalhar com crianças, mas quero mudar de grupo de recrutamento e tem a ver com as condições de trabalho. Gostei muito até a escola se transformar num depósito de crianças. A atribuição de tarefas que nos dão e que não fazem parte da nossa função, como vigiar recreios e hora de almoço, ou saber se as crianças já foram ao dentista, são esgotantes.” E salienta ainda o facto de não ter direito à redução de horário, à semelhança dos professores dos outros ciclos, e não ter qualquer redução para os cargos que lhe são atribuídos, como a direção de turma. “Nas escolas de 1.º ciclo não há sequer uma secretaria para tratar qualquer assunto burocrático.”
As mudanças das regras de aposentação (anteriormente tinham direito a aposentar-se mais cedo por terem um horário alargado) e a falta de redução de horário também pesaram na decisão de Patrícia Carreira. “Depois há toda uma falta de respeito pela figura do professor e educador. Tratam-nos como se fôssemos guardadores de crianças e é esperado de nós uma série de obrigações que nada tem a ver com a função de ensinar”, frisando que que “quando falta uma professora, os alunos são distribuídos pelas outras turmas”, chegando a ter mais de 40 crianças numa sala. “As condições de trabalho são cada vez piores. Prolongou-se mais uma vez o calendário escolar, os professores e as crianças estão cansados. Não temos, por exemplo, recursos para os alunos estrangeiros e cai tudo em cima de um só professor. Vou sair da minha escola porque não consigo trabalhar mais. E, como eu, muitos professores com habilitação para o 2.º estão a tentar mudar”, desabafa. Patrícia Carreira diz adorar lecionar no 1.º ciclo mas já não aguentar fazê-lo neste modelo de gestão. “Há 15 ou 20 anos não era assim, agora é um depósito escolar.”
Representante dos diretores acredita que as vagas vão ser preenchidas
Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), acredita que “o sistema irá encarregar-se de colocar docentes nas escolas onde os professores querem sair”. Questionado pelo DN sobre os motivos que levaram mais de 46 mil docentes a querer mudar de QE, o responsável acredita ser sobretudo a vontade de se aproximarem da área de residência. “De uma forma global, podem não estar satisfeitos com aquela comunidade educativa para a qual estão a trabalhar, mas o primeiro critério é sempre ficar mais perto de casa.” Contudo, diz, “numa escola onde muitos querem sair pode haver motivos coletivos”. Já sobre os “danos” para os alunos, admite que “uma saída em massa, se todos conseguirem, leva a uma grande renovação e não haverá grande estabilidade nessas escolas, principalmente no Interior, onde todos os anos o corpo docente é renovado”. Mas, apesar dos números expressivos de professores a concurso para mudança de QE, diz que ficaria “admirado se essas vagas não fossem preenchidas”. “Pode haver QE não ocupados, mas são milhares de professores a concorrer. Somos mais de 100 mil docentes”, explica. O presidente da ANDAEP alerta para outro problema: “Pode dar azo a atestados médicos por parte dos professores.”
Arlindo Ferreira, diretor do Agrupamento de Escolas Cego do Maio e autor do blogue ArLindo (um dos mais lidos no setor da educação), também entende que o principal fator de mudança é a aproximação à área de residência, mas “poderá haver casos onde as pessoas não se estejam a sentir bem ou estejam a ter excesso de trabalho”. O responsável lembra que, quando há concurso interno, “há sempre muita instabilidade nas escolas”, tornando o trabalho dos diretores muito “difícil”. “É difícil para os diretores porque cada escola tem a sua forma de trabalhar e temos de ensinar o funcionamento da escola aos professores que chegam.”
Já do ponto de vista do aluno, defende, “acaba por ser prejudicial, quando há muitas mudanças de docentes, principalmente no 1.º ciclo. É difícil para os mais novos”.
Já do ponto de vista do aluno, defende, “acaba por ser prejudicial, quando há muitas mudanças de docentes, principalmente no 1.º ciclo. É difícil para os mais novos”.