Afirmações (minhas) parvas, por tão óbvias que são, desprovidas de originalidade, mas que talvez valha a pena (re)recordar:
Cair na tentação de aferir a “qualidade” das escolas Públicas e Privadas e dos respectivos alunos, pelo critério lugar que cada escola ocupa no Ranking, não parece legítimo, nem honesto, nem justo…
Só seria legítimo, honesto e justo comparar os resultados obtidos em Exames Nacionais pelos alunos das Escolas Públicas com os das Escolas Privadas se as condições iniciais de uns e de outros, nos anos que antecederam a realização de Exames, tivessem sido semelhantes ou equivalentes… Mas, na realidade, não foram… E dificilmente serão…
Das duas uma: ou se revogam os Princípios da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei Nº 46/86 de 14 de Outubro) ou se aceita e assume que, e até alteração legislativa em contrário, a Escola Pública não pode deixar de cumprir um dos seus principais desígnios: permitir e fomentar a igualdade de acesso e de oportunidades em relação à Educação, uma escola para todos, visando a democratização do ensino.
E isso implica, necessariamente, a aceitação de todos os públicos e de toda a heterogeneidade daí decorrente, sem qualquer tipo de selecção prévia… As Escolas Privadas partilham desse desígnio?
Bastaria a heterogeneidade social, económica e cultural do público que frequenta a Escola Pública para que se tornasse ilegítimo estabelecer comparações directas entre resultados obtidos em Exames Nacionais pelos alunos do Ensino Público e pelos do Ensino Privado…
Contudo, não é só isso… Também são as diferenças existentes entre umas e outras em termos de condições físicas e materiais… Grande parte dos edifícios das Escolas Públicas encontra-se visivelmente degradada; na maioria não há climatização das salas de aula, alunos e professores são, muitas vezes, obrigados a suportar mais de 35ºC no Verão e/ou -2ºC no Inverno; quando chove há infiltrações dentro de muitas delas; casas de banho sem condições sanitárias adequadas; janelas/estores estragados; insuficiente e/ou deficiente apetrechamento tecnológico, são apenas alguns exemplos do que se pode encontrar em qualquer Escola Pública, em termos de carências e/ou ausências materiais… Na maioria das Escolas Privadas também existem tais constrangimentos?
A realidade das Escolas Públicas, em termos da heterogeneidade do seu público-alvo e das condições materiais existentes, é recorrentemente escamoteada e ignorada, assim como também o são as implicações dessas duas variáveis no processo de ensino-aprendizagem…
As interpretações realizadas sem considerar a influência desses dois parâmetros nos resultados obtidos em Exames Nacionais serão naturalmente enviesadas e muito discutíveis… Por essa perspectiva de comparação, que não contextualiza tais resultados, os alunos das Escolas Públicas estarão irremediavelmente condenados ao fracasso, ano após ano, e a serem qualificados como “maus”, uma vez que parece não se vislumbrar a melhoria das condições nas Escolas Públicas, de forma a permitir a obtenção de melhores resultados escolares…
O presente Governo tem-se mostrado “perito” nesse malabarismo e muito hábil nessa ocultação, apesar de frequentemente querer fazer parecer o contrário… A propaganda serve para ludibriar e mascarar a realidade “mais pura e mais dura” da maior parte das Escolas Públicas…
E os “seguidores” do Ministério da Educação corroboram e participam na farsa, sem vontade/capacidade para mostrar a realidade, impossibilitando assim melhorá-la…
O que deveras importa é a defesa das aparências e da ilusão, confundindo-se intencionalmente realidade com ficção…
E também não podemos esquecer as políticas educativas patrocinadas por sucessivos Governos, não só o presente, que apenas têm servido para espoliar, descapitalizar e negligenciar a Escola Pública, desvirtuando o seu inquestionável contributo para uma sociedade mais plural e mais equitativa… Será bom não nos esquecermos, mais uma vez, dos principais propósitos da Escola Pública e que, enquanto esses se mantiverem, não é possível equipará-los aos da Escola Privada, nem tão pouco compatibilizá-los…
As Escolas, Públicas ou Privadas, felizmente, não são só números e edifícios inertes. Por trás dos números e dentro dos edifícios estão Pessoas, isso importa e também não pode ser esquecido…
E, sim, há muito por fazer na Escola Pública e há também muitos “males” que a assolam, alguns indexáveis às desastrosas políticas educativas, outros atribuíveis a inúmeros vícios de funcionamento que urge alterar… E há, por isso, muitas mudanças a operar na Escola Pública… Mas não confundamos isso com o enjeitamento ou a proscrição da Escola Pública…
Sem Escola Pública, tudo seria muito pior, convém talvez não esquecer…
Declaração de interesses:
Não repudio o Ranking das Escolas, mas também não lhe atribuo nenhum “poder especial”, nem lhe reconheço particular importância…
Enquanto aluna, o meu percurso passou tanto por Escolas Públicas como por Escolas Privadas e guardo de todas agradáveis recordações.
Nada me move contra o Ensino Privado, mas não posso deixar de defender convictamente o Ensino Público, no qual trabalho há mais de vinte anos e no qual continuo a acreditar, apesar de tudo… E de todas a críticas negativas que lhe tenho vindo a endereçar… Aliás, se não continuasse a acreditar nem críticas lhe dirigiria…
(Matilde)
2 comentários
Como professor na escola pública e privada noto que a principal diferença é que na primeira, muitas vezes uns não deixam aprender outros. Têm sido encontradas alternativas para esses alunos mas há receio e falta de sentido prático para ir mais longe nas alternativas de ensino ou de vida.
Interessante reflexão.
Mas o Tiago esqueceu-se de referir uma boa solução (e bastante equitativa) para esse problema: distribuir esses alunos (que não deixam aprender os outros) pelas escolas públicas e privadas! Sempre que um aluno é transferido por motivos disciplinares de uma escola pública, vai sempre para outra escola pública, nunca para uma escola privada. E se os privados até gostam de ter apoios do estado, e falam tanto do cheque ensino, etc. talvez fosse bom distribuir as “maças podres” por todos os “pomares” e não concentrá-las apenas nos “pomares” públicos. Depois disso, então sim, poderíamos falar um pouco melhor sobre os rankings das escolas.
Uma outra possibilidade (para não ofender o direito liberal das escolas privadas em selecionar a sua clientela, considerado por estas um crime de lesa majestade) seria reinstaurar a pena disciplinar de EXPULSÃO para os criminosos que na Escola Pública não deixam aprender os outros. Até final do ano letivo ficariam a prestar serviço comunitário, com sessões regulares de Psicologia e Filosofia para crianças, nos gabinetes dos políticos que defendem a escola “inclusiva” a todo o custo (Ministro da Educação, Secretário de Estado, Catarina Martins, Jerónimo de Sousa, e outros mais…)
Que tal? Vamos a isso? Eu, como cidadão, pai, professor de uma escola pública e diretor de turma, ficaria agradecido!