O Sistema de Avaliação de Professores
” Quando somos novos, pensamos que temos o mundo aos pés. A vida, no seu percurso, muito vezes pouco convencional, vai explicitando aquilo que, agora que somos mais velhos, nos confronta e testa a nossa paciência e, principalmente, a nossa dignidade. Já não temos a mesma condescendência com os imbustes, com as injustiças, com os esquemas. Podia não fazer nada. Podia pensar que há coisas piores do que ser injustiçado por um sistema de avaliação, miserável na forma e no conteúdo e, ainda por cima, concretizado por alguma pessoas, cuja intervenção no processo, recomendaria, no mínimo, algum bom senso.
É tempo de refletir e de agir. Não sou professor, mas devo aos professores tudo o que sou, até o meu estado civil.
Não é só o coração que me atormenta nesta hora de autêntico dilúvio sobre aquilo que, ontem, eram certezas e, hoje, são pesadas dúvidas. Também a alma entrou em falência e tende a experimentar o estado comatoso que anuncia a iminência da descrença absoluta em tudo o que nos é ensinado como sendo a ordem das coisas. Não é que seja crente da pureza absoluta da espécie humana. Mas, sempre, acreditei que o caráter não estivesse à venda, muito menos a preço de saldo.
Neste espaço, não é relevante dissecar o sistema de avaliação dos professores. Seria cansativo para mim e oneroso para os olhos de quem tiver paciência para ler esta manifestação de revolta. Ainda assim, vale a pena dizer que o professor A pode ter 10,0 valores (Excelente), na sua avaliação, e ficar fora das menções de mérito e o professor B pode ter 8,0 valores (Muito Bom), na sua avaliação, e ficar dentro das menções de mérito. Para isso, basta que lecionem em Agrupamento de Escolas diferentes. Nem mais nem menos. É infame que quem legisla tenha criado tal possibilidade que contradiz a razão e a lógica.
Genericamente, a inevitável submissão à Lei poderia suscitar a resignação dos que se sentem injustiçados, se face à obtenção da classificação de Excelente não houver a correspondente menção de mérito. Como é, cansativamente, apregoado pelos discípulos do Sistema, o absurdo da situação encontra razões na Lei.
Conformar-me seria uma hipótese. Mas não. Não sou de resignar-me e, tenho a mais profunda convicção de que quando existe o merecimento da tal menção de mérito, e a dita não é atribuída, emerge, numa primeira fase, o direito à indignação e o dever de encetar o caminho da Reclamação e do Recurso e, numa fase posterior, a repulsa dos injustiçados deve prosseguir o seu caminho nas instâncias judiciais.
O Sistema instituído prefere que haja respeitinho nas decisões que toma. Esse respeitinho significa aceitação absoluta e incondicional das suas decisões. Ainda assim, a título excecional, o Sistema condescende numa reclamaçãozinha, mas nada que passe daí, para não ter muito trabalho a organizar as contra-argumentações e, principalmente, a escolher os seus acólitos que hão de levar ao limite a defesa das suas intenções.
E, depois, o Sistema julga-se supremo e, por isso, dono absoluto da verdade. Da verdade e do vida de cada um dos professores. Qualquer reação ao Sistema é tida como um desequilíbrio emocional de quem a promove. Uma espécie de mau perder.
A sabedoria popular lembra-nos que quem não se sente não é filho de boa gente. Descompensação emocional seria a resignação a uma chocante injustiça que teve início no torpor da Lei e prolongou-se até aos estreitos corredores daquelas consciências que não encontram arte, nem engenho, para separar o trigo do joio.
Pior, só aqueles que, no momento da colheita, apenas acreditam na existência do joio.”
Francisco José Pereira Gonçalves
16 comentários
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Boa noite,
Li e concordo plenamente porque é isso que sinto depois de ter uma avaliação que não me permite mudar de escalão. Tenho 28 anos de serviço e continuo no 4 escalão. Fiz a reclamação e o recurso e a resposta foi a mesma. Sinto-me sem vontade de ir para a escola e eu não gosto de faltar. Realmente gostaria de não ficar calada e reclamar , mas onde e quem me houve? Os excelentes são para quem faz projetos, poque quem trabalha com os alunos são Bom/MB, sim MB não pode ter… Não consigo aceitar…revolta-me…
Concordo com o que foi exposto….estou no mesmo barco!!!!
Dois anos seguidos com avaliação de EXCELENTE, chega à SAD e fico com BOOOOOOMMMMMMM….. que educadora sou eu????
Vale a pena preencher papeis?
Vale a pena aulas observadas com tanto “rigor”???
Vale a pena cumprir prazos, metas, objetivos, etc, etc. ,etc,…..
Sinto-me desmotivada…. Revoltada!!!!
Texto muito bem escrito e cheio de verdade ! Também eu sou mais uma a ter sentido na pele a injustiça infame deste sistema de avaliação que não há quem trave e PROÍBA !! Desisti já há muito de valorizar o que não é sério e esta avaliação como sabemos não é séria . Por duas vezes tive avaliação de Excelente do avaliador externo( com aulas observadas) e depois aparece o lacónico BOM ! Porque os outros qualitativos estão reservados par os amigos e distribuídos pelas quotas cozinhadas previamente . Para quando alguém com coragem para alterar isto e instituir uma avaliação séria, honesta e justa ?
A desmotivação, o desalento pela profissão que tanto amamos, a tristeza por ter de ir trabalhar, nalguns casos dor física, psicológica, “uma espécie de bicho” que nos vai corroendo por dentro… e não venham dizer-nos: segue em frente! Mas pra onde? O que antes tinha sabor a amor, agora virou desencanto! A injustiça provoca doença, em qualquer profissão, ou em qualquer situação diária da nossa vida e este tipo de injustiça, que nos revolta as entranhas… mata, mata-nos por dentro!
Obrigada pelo texto Francisco Gonçalves! Tão bonita a sua escrita, com sentimento… com a qual me identifico em absoluto! E quando falamos ou escrevemos sobre isso, ninguém entende… ou poucos entendem… só percebe quem realmente sente na pele!
Estou no mesmo barco, mas não me calarei até que a voz me doa.
Relativamente a este modelo de avaliação docente, lamento que os Sindicatos, Diretores de Escolas e de Centros de Formação nunca se tenham pronunciado, pelo menos de forma aberta, contra este modelo.
É evidente que se trata de um modelo injusto e, somente beneficia “os amigos”.
Se o intuito era poupar, ficando os docentes retidos no 4.º e 6.ºescalões, porque é que quem é avaliado com “Muito Bom” ou “Excelente”, tem uma benesse, estando menos tempo no escalão?
Esta benesse suscita interesse, em todos os escalões. Nunca li nem ouvi que esta benesse tenha suscitado interrogações nem comentários por parte de entidades que representam os professores.
Sinto-me muito revoltada contra este sistema de avaliação docente. Sempre me dediquei à minha profissão, participava de forma ativa na comunidade educativa. Fazia formações (Pós Graduação, Mestrado e formações ministradas nos Centros de Formação) para me atualizar, me sentir mais segura e, melhor preparada para promover o sucesso dos alunos.
Com este modelo de avaliação docente, sinto que todo o meu empenho e dedicação não foram tidos em conta. Não valeram a pena. Estou muito desmotivada e desacreditada …
No entanto, a maior parte dos professores vota naqueles que impuseram este sistema e pagam quotas a quem discorda dele mas discorda baixinho para não fazer muito barulho… Infelizmente, assim não vamos lá.
Considero esta situação aberrante e inadmissível num país que se diz democrático! Como é possível que nada se faça contra este sistema de avaliação que, ostensivamente, favorece “o compadrio”, o oportunismo bacoco e as desigualdades dentro e entre escolas!? Todo o sistema de avaliação é uma fraude, começando logo pelos critérios de seleção do professor avaliador – até pode ser um colega, cuja prática pedagógica nunca foi avaliada, as suas aulas nunca foram assistidas nem avaliadas, nunca ninguém o orientou nesse sentido, pois quando conseguiu entrar no 1º ano de estágio (a teoria), já tinha 6 anos de serviço, ficando, por isso, dispensado do 2º ano (o da prática pedagógica). De referir que esta situação integra todos os professores que fizeram a profissionalização em serviço pela Universidade Aberta e alguns que a fizeram em Universidades e Escolas Superiores de Educação, nos finais dos anos 80 e anos 90, quando os respetivos cursos foram tirados em universidades que não lhes ofereciam o estágio integrado. Eram lançados no ensino sem a profissionalização, tendo que aguardar/concorrer a vagas de estágio. Se conseguiam colocação numa vaga quando já tinham 6 anos de serviço, ficavam, imediatamente, dispensados da prática pedagógica. Ou seja, há colegas a avaliar o que nunca aprenderam!!! A partir daqui, todo o sistema de avaliação se vai afundando num charco que faz vir à superfície a podridão do modus operandi a que assistimos, em muitíssimas escolas, dentro e entre os vários órgãos; ou seja, entre aqueles que deveriam ser colegas, mas que, também devido a este sistema de avaliação, se tornam compadres, afilhados, marginais, rivais… e todos desiguais entre si. Desigualdade essa que dita o futuro profissional e, até, pessoal dos professores. Vivemos num Estado democrático!!!???…
Democracia nas escolas!!!!!
Ah!ah! Onde é que você vive?????
Classificação quantitativa de nível Excelente, qualitativa Bom. Reclamei, recorri e obtive sempre a mesma resposta dando a entender que as decisões da SADD são sagradas. Como resultado, a desilusão e desmotivação. A par disso, incapacidade de me cruzar com o diretor e todos os que assinaram por baixo levaram-me a decidir não pôr mais os pés naquela instituição (já não me apetece, sequer, chamá-la escola). Gostava de dar aulas e tinha zero faltas. Neste momento, parece-me que tudo isso acabou. É isto que o ministério pretende do estrangulamento a que chamam avaliação.
Parabéns e obrigado ao Francisco José Pereira Gonçalves pelo artigo!
Seria interessante haver uma lista nacional que apresentasse os docentes que foram avaliados com Muito Bom ou Excelente e na avaliação final tiveram Bom.
E mais interessante e transparente seria conhecer quem em cada escola teve avaliaçao final de mérito, harmonizada pela SAD.
Há que agradecer aos sindicatos que assinaram esta avaliação… mas também há os que não o fizeram!
E uma injustiça, o problema é que o cozinhado e sempre para os mesmos.
Estou muito desagradada com estas situações da avaliação. Somos avaliadas, quantas vezes , por pessoas que sabem muito menos que nós. Como se isso não bastasse temos de nos calar para não nos chamarem mal educadas. É proibido reclamar . Ora bem ! Quem deve avaliar os professores são os alunos, os pais dos alunos e as notas dos alunos em exames nacionais. Quem não tiver alunos com boas notas nos exames nacionais é mau professor. Um ou outro aluno menos bom é compreensível mas a maioria dos alunos com umas notitas sem jeito em exames nacionais só pode ter tido maus professores. Está a avaliação feita. O que é preciso mais ?
Ok e quando os apanhas em anos terminais, em que o mal já vem detrás?
Sobre a avaliação, é mais que óbvio os docentes estarem entalados num imbróglio muito grande que nem eles próprios conhecem o tamanho. Mas também arcam com muitas culpas. Em sede própria bastava que decidissem que os que atingiram essa avaliação de méritos, fossem os coordenadores de departamento, diretores de turma das turmas mais difíceis e desempenhassem outros cargos de responsabilidade. Se, com mérito, têm essas avaliações, com certeza serão os mais habilitados para esses cargos de responsabilidade. Mas não me parece que os docentes queiram assim hierarquizar a classe. Assim, e pelas estatísticas, serão os do quarto e quinto escalão a desempenhar essas tarefas de responsabilidade, incluindo as de avaliação docente, e os outros, apenas porque posicionados em escalões mais altos, a auferir o bom salário.
Tendo a pensar que é necessário mudar muita coisa mas terá de ser com máxima responsabilidade.