Aulas online? Vamos lá cair na real, malta

O cenário não é idílico, nem  nunca será idílico. Por mais que tentemos, por mais que façamos,por mais que venhamos a fazer, haverá sempre que contar com contingências, todo o tipo de contingências. E essas aparecerão a cada esquina. A tutela escolas não está preparada, os professores, os alunos, os pais, as famílias, a sociedade não estão preparados e o tempo de que dispõe é curto demais para que daqui saia um cenário idílico. Convém não criar ilusões…

Aulas online? Vamos lá cair na real, malta

O cenário idílico: as crianças em casa, em frente ao computador, do outro lado o professor, entusiasta da disciplina que for, desenrascado com as tecnologias, e capaz de prender às cadeiras, à distância, uma turma de pirralhos com dez anos. A realidade: não vai acontecer o cenário idílico, temos pena, tente mais tarde. Tempo de espera previsto? Talvez uns anos. E porquê, perguntarão alguns leitores que, na sua maioria residentes de grandes centros urbanos, consideram que são tu-cá-tu-lá com as tecnologias.

O banho de realidade vem já a seguir, segure-se bem que a água nem está tépida, está gelada: um em cada cinco alunos não tem computador em casa e 5% das famílias com crianças até aos 15 anos não tem internet. Pois é. Um smartphone nem é uma banalidade neste país, acredita? Portanto, vamos lá ver: como é que vamos manter os alunos ocupados (são dois milhões de alunos, senhores!) e a aprender até ao final do ano lectivo? A resposta é simples: não vamos, não somos um país modernizado de norte a sul, de este a oeste. E, tantas vezes, demasiadas vezes, encaramos o país com os olhos privilegiados de quem mora em Lisboa ou no Porto. O país não são essas pessoas, nas quais me incluo.

Uma amiga, com a filha em casa, ela que frequenta uma escola estrangeira cujo idioma a mãe não domina, está aflita com a perspectiva de não conseguir ajudar a filha e, mais ainda, com a possibilidade da filha transitar de ano escolar sem as bases exigidas pelo programa de ensino.

Para ensinar à distância existem agrupamentos que estão a pedir computadores a empresas, e há quem se recorde do projecto Magalhães de José Sócrates, talvez não tivesse sido uma desgraça, afinal talvez até fosse uma boa ideia. À falta de meios, das famílias e dos professores, há ainda que ter em conta que a miudagem não está habituada ao teletrabalho escolar e, tantas vezes, não terá a concentração para tanto. Não me refiro aos alunos universitários, esses sim, estão prontos para trabalhar remotamente (assim tenham como), quanto mais não seja porque têm outra capacidade de concentração e de compreensão sobre os dias que estão a viver. Os miúdos são vítimas do momento que atravessamos, as famílias não têm resposta, o país não tem condições, não há lugar para ilusões. Volta-se a falar de aulas através da televisão. Seja, vamos a isso, mas à portuguesa vamos ter de criar duas comissões, três gabinetes e um protocolo e regulamento, que a burocracia está mais no nosso sangue do que qualquer outra coisa. Num cenário idílico este último período escolar teria salvação? Sim, isso e porcos a andar de bicicleta também andariam pelo ar a deixar-nos os bens essenciais para sobreviver ao isolamento profilático.

In SAPO24

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10 comentários

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  1. E não nos podemos esquecer que no interior do país há sítios onde a rede não chega. Há alunos que não têm Internet por isso.

    • Maonda on 2 de Abril de 2020 at 18:48
    • Responder

    Fala-se tantos dos alunos que não têm computadores para “assistir” às aulas e essa é uma realidade preocupante, até porque há-de haver lares, que se os tem, também têm mais de uma criança e com aulas ao mesmo tempo…
    Mas estamo-nos a esquecer dos professores cujos computadores são do tempo do e-escolas, ou então não têm os requisitos técnicos para uma aula on-line, como webcam ou mesmo microfone.
    Como é o meu caso!
    Posso parecer mesquinho, mas não me apetece nada gastar umas centenas de euros num computador novo, ou em webcams e afins, quando o meu velho portátil – que eu já actualizei várias vezes, dentro das suas capacidades – me tem servido perfeitamente. Não estou com vontade de fazer um investimento desses para um (esperemos) relativo “curto” período de tempo, para depois da tempestade voltamos ao mesmo…
    Não sei se somos a única profissão que tem de comprar as próprias ferramentas de trabalho, mas começo a ficar cansado disso!
    No ano passado foi mais uma actualização do meu portátil, porque a escola onde eu estava não tinha computadores em todas as salas de aula. Até os cabos de ligação ao projector tinham de ser comprados por cada professor. Colunas de som, não há que cheguem para as encomendas (leia-se, requisições). Por isso, a solução foi desembolsar mais €35 numa coluna bluetooth, para não chegar à aula ou ao teste e não ter como dar a parte de audição do teste. Este ano, foi também uma nova impressora…
    Penso nos meus amigos cujas empresas, sejam privadas, sejam públicas, lhes disponibilizaram o equipamento necessário para nesta fase realizarem o trabalho a partir de casa.
    Penso na minha esposa, – farmacêutica – que não tem de comprar luvas, nem máscaras, nem viseiras para trabalhar, porque lhe é fornecido esse material indispensável.
    E os professores?… Vamos continuar a ser os soldados desconhecidos desta luta que é de todos…

    • Ana P on 2 de Abril de 2020 at 19:27
    • Responder

    Acho que Portugal e os portugueses nada ganham com este tipo de textos e opiniões. Precisamos de sugestões de melhoria e não de críticas que só servem para desmoralizar quem está a tentar arranjar soluções para ajudar os alunos portugueses.

  2. Tive que comprar um PC para as videoconferências pois o meu tinha 12 anos e não aguentava essas atividades. Depois de começar as atividades com os alunos apercebi-me que o meu computador não abre doc em word, excel… pois não tinha Office. Contactei a escola e o responsável pela informática da escola, pois o Agrupamento trabalha com o Office 365, para ver se arranjavam uma solução. Mandou-me comprar a mim o Office que a escola não vai gastar dinheiro com professores. Eu não tenho obrigação de pagar para trabalhar, principalmente quando estou num horário de 16h. Acho isto vergonhoso o que se está a passar.

      • Maria on 2 de Abril de 2020 at 23:55
      • Responder

      Têm de se informar e atualizar. O Office já é gratuito para as escolas, professores e alunos, mas têm de tratar deste assunto. Informem-se, pesquisem na internet e agradeçam se ainda têm saude. Há pessoas a lutar pela vida, pessoas sem emprego, empresas em difícil situação.

  3. Não precisa de comprar o Office.
    Descarregue da net o freeoffice. É gratuito e tem as funções necessárias. Abre os documentos criados no Office da Microsoft.
    Freeoffice.com

    • Jeremias on 3 de Abril de 2020 at 15:17
    • Responder

    O problema aqui nem é só os alunos não terem computadores e internet. Eu sei que isso é uma realidade, eu vivo no interior deste Portugal que não consegue dar a todos as mesmas possibilidades.
    Sendo eu professor como a vós e vivendo no interior, não tenho direito a ter uma internet que jeito tenha. A adsl não funciona, a banda larga que me foi fornecida não consegue na maioria dos casos dar-me 1 mega que seja de velocidade, enfim, nada funciona e pago um balúrdio por estes serviços (meo), (vergonhoso). Como vou eu conseguir dar aulas ou estabelecer uma ligação decente para ministrar (ou o que seja) uma aula.
    Em tom de desabafo, faltam-me 3 anos para a minha reforma e já estou fartinho destas tretas.
    Um bom fim de semana e olhem, não se chateiem que se fizerem as coisas muito bem feitas um dia destes estão todos (alunos) a receber aulas online e a maioria de vós no desemprego.
    Cuidem-se.

    1. O primeiro passo é acabar com aqueles cargos em que os professores não dão aulas, tipo aqueles cargos políticos como ir para a biblioteca sem ter o curso de bibliotecário, ou assessor… os sindicatos também irão ser reduzidos… a situação é tão grave que nem valerá a pena cenários. Recuperação do tempo de serviços não há a mínima hipótese. Enfim, estamos tramados. O Ministro faz o que pode diz aquela coisa da Tv, mas aquilo é para entreter o Povo,não vai existir. Os professores terão de dar aulas à distância pela internet e têm de parar de mandar fichas à toa. Os pais queixam-se que os professores só sabem enviar fichas e as Escolas não dão orientações que ajudem a resolver o problema. Haja paciência para suportar isto!

  4. Cuidado que já andam aí a correr ideias perigosas como aquela de quererem para os professores um regime igual ao privado: ficar em casa sim, mas a receber só 2/3 do ordenado.

  5. Não diria cair na real. Diria antes, desculpas esfarrapadas, falta de abertura à mudança e o mesmo pessimismo de sempre, que a alguns tolhe o desembaraço para a vida! Acredito que, com perseverança, bom senso e sentido de responsabilidade (quase) todos nós vamos conseguir ensinar e aprender à distância, cada um a seu ritmo e conforme as suas possibilidades.

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