O professor João Francisco Linhares dá aulas à distância a três turmas, duas do PROFIJ com 9 alunos cada, equivalentes ao Básico e 15 alunos num Curso Profissional, correspondente ao ensino secundário, na Escola Secundária Antero Quental.
Os alunos de João Linhares, na generalidade, “são responsáveis, empenhados e mais ordeiros na utilização do tempo online, mas porque as regras estabelecidas a isso conduziu”.
Todavia, prossegue o professor, “falta a percepção da dúvida do aluno, que se consegue numa aula presencial. As aulas presenciais têm mais efeito psicológico na motivação e mobilização dos alunos. Proporciona um contacto onde se percebe, mesmo no aluno mais introvertido, a sua dúvida, o momento em que perdeu o interesse”.
No entender de João Francisco Linhares, do lado dos professores, há “realidades muito diferentes, conforme o tipo de conteúdos ou de disciplinas. Mas haverá um denominador comum, mais trabalho pois muito do que é o esclarecimento oral de dúvidas tem de ser passado para escrito, em resposta a mensagens de dúvidas, a par da preparação de materiais que têm de sofrer adaptações para uma realidade diferente da de aulas presenciais”.
“No meu caso”, afirma o professor, “esse envolvimento não será grande. Os alunos têm, no mínimo, 16 anos. Todavia, na fase de ‘recrutamento’ dos alunos para a plataforma do Classroom, senti necessidade de recorrer aos directores de turma para comunicarem com os encarregados de educação, o que surtiu efeito. Mas foram poucos os casos. Sei que, com alunos mais novos, há envolvimento e nem sempre no melhor sentido”.
“E quando digo nem sempre no melhor sentido, refiro-me a intervenção no processo, a condicionamento do formato de aulas. Ouve-se falar de outros casos, mas o que tenho conhecimento directo tem a ver com pretender que a filha não tivesse aulas em videoconferência”.
E como é um dia de aulas com o professor João Linhares? “Um dia de aulas, comigo”, responde, “envolve trabalho que foi preparado na noite ou dias anteriores. Conforme o horário dos alunos, são colocados os materiais preparados na hora em que se inicia uma aula assíncrona. Esses materiais são textos de apoio e, eventualmente, links para videos disponíveis na internet que podem apoiar o texto. Um conjunto de perguntas de resposta simples que permitem avaliar a compreensão do texto. Algumas perguntas vão buscar directamente conteúdo do texto, outras apelam à compreensão desses conteúdos e à interacção com a realidade. Essas perguntas têm um prazo de resposta até ao fim da aula seguinte, sempre em dia posterior. Entretanto, elas vão aparecendo resolvidas e, no tal trabalho fora de aulas, vai-se lendo, avaliando e esclarecendo por mensagem e individualmente os alunos. Em cada dia há uma ou duas aulas síncronas com as diferentes turmas. Para a aula síncrona já foram percebidas as dúvidas que os alunos apresentaram nas perguntas de resposta simples, pelo que parte da aula estende-se a toda a turma os esclarecimentos de dúvidas que se foram observando. Esclarecem-se outras dúvidas e faz-se a relação com a realidade em muitos dos conteúdos. Conclui-se a aula síncrona com uma ficha de trabalho, cujo tempo de resposta é muito limitado, normalmente 10 minutos para 10 a 15 perguntas de escolha múltipla. Há alunos que permanecem na videoconferência, outros, porque usam telemóvel em vez de computador, optam por sair da videoconferência e responder à ficha de trabalho à parte. Quando terminam a ficha de trabalho, dentro dos 10 minutos, têm automaticamente a avaliação da ficha de trabalho e o esclarecimento sobre as respostas erradas”.
“As aulas vão evoluindo durante parte do dia, conforme o horário de cada turma no início do ano lectivo, em aulas assíncronas, em que são colocados os materiais, e aulas síncronas, em que é feita videoconferência com todos os alunos. Entretanto, vai-se adaptando material para o ensino à distância, que será disponibilizado aos alunos nos dias seguintes. Vão também surgindo dúvidas dos alunos a que se dá resposta, tão imediata quanto possível. Escreve uma mensagem…”
E os professores estão a trabalhar mais horas? “Da minha parte”, responde João Linhares, “houve que adaptar material que tinha para outra realidade, e isso tomou-me muito tempo, a somar ao tempo que usei a preparar material para aulas presenciais que acabei por não dar (preparo módulos de matéria o que implica que já tinha material que deixou de poder ser utilizado no formato em que estava)”.
“Todavia”, prossegue, “o tempo de trabalho vai depender muito dos conteúdos e da forma como se trabalha com os alunos. Sinto que os directores de turma (não sou) terão tido muito trabalho acrescido, relativamente ao trabalho que tinham num funcionamento normal. Em certos casos por falta de sensibilidade de colegas que transferiram para o director de turma todo o trabalho de ‘recrutamento”’ de alunos para as plataformas, mas também da tutela e das direcções das Escolas, pela recolha de elementos sobre as possibilidades dos alunos acederem à internet, em certos casos com pedidos de repetição de recolha desses mesmos elementos. Acresce uma maior quantidade de contactos de email com alunos e encarregados de educação. Creio que os directores de turma tiveram um acréscimo muito grande de trabalho. Se juntarmos a isso, alguma inadaptação de alguns docentes às novas tecnologias, vendo-se forçados a aprender tudo por si a par da necessidade de trabalho a realizar, terão existido professores que tiveram muito mais horas de trabalho do que tinham num funcionamento normal”, completa.
A avaliação é um “problema novo que tem de ter resposta… E quanto à avaliação? No entender do professor João Linhares, este “vai ser um problema novo. E, novamente aqui, vai depender muito do tipo de conteúdos. Imagino que não será a mesma coisa avaliar História, Inglês ou Matemática, para não falar de Educação Física. Alguns terão de recorrer ao que se passou no 1º e 2º Períodos. Outros poderão fazer uma avaliação mais efectiva do trabalho desde o início do ensino à distância”.
Como explica, “há Universidades que avaliam com perguntas de escolha múltipla, que terão, no ensino à distância, um acuidade maior, do que perguntas de resposta mais longa, com tempos de resolução mais estendidos. Saber se foi o aluno que fez ou não, é outro problema, que pode igualmente diferenciar alunos entre os que podem ter um suporte em casa e os que não têm. Vai ter de haver bom senso e alguma adaptação”.
“Quando as aulas presenciais foram interrompidas, tinha acabado de fazer revisões de conteúdos com uma turma, para a ficha de avaliação que faria na semana seguinte. A turma acabou por fazer a Ficha de Avaliação por internet (ainda não se falava em aulas síncronas e eu marquei um dia e hora para que todos fizessem ao mesmo tempo a ficha de avaliação). Foi uma Ficha de Avaliação com 40 perguntas de escolha múltipla a resolver em 20 minutos. Os resultados obtidos não diferiram muito do que era normal a turma obter ao longo do 1º período e parte substancial do 2º período, pelo que assumi os resultados na avaliação do módulo, conforme dei conhecimento depois em reunião de Conselho de Turma”.
O professor João Francisco Linhares aponta ainda duas situações constatáveis no arranque do ensino à distância. “Quando a tutela (regional e nacional) se preocupou com alunos terem ou não meios de acesso à internet, esqueceu-se dos professores. Há professores deslocados que não os têm. Usavam os meios das escolas e, claro, para lá podem continuar a ir para fazer o seu trabalho, mas faltou uma palavra. Também há professores com filhos e poucos recursos em casa, e quando são as Escolas a agendar as aulas síncronas dos docentes, esquecem o ‘conflito’ com filhos a terem aulas síncronas na mesma hora”.
Uma outra questão, concluiu, “a tutela tem desvalorizado muito a possível avaliação dos alunos neste período, o que tem desmobilizado alunos. Falta aqui uma mensagem da tutela a filhos e encarregados de educação de que a avaliação deste ensino pode ter alguma influência e que será dada alguma latitude à autoridade e bom senso dos professores”.