Professores, temos e teremos aquilo que merecemos! – Alberto Veronesi

A classe docente tem sido, sucessivamente, sobretudo durante as duas últimas décadas, altamente atacada e desprestigiada, pelos diversos governos, sem que tenha podido contar com ajuda significativa dos sindicatos na defesa dos seus interesses. Nas grandes manifestações de 2008, os sindicatos foram apenas arrastados , pois foram incapazes de, com firmeza, indicar o caminho. Bem sabemos que o core da sua existência são os problemas não resolvidos. Mas é demasiado evidente a letargia em que caíram, que visa garantir os próprios lugares atuais dos seus dirigentes e as suas possíveis ambições futuras.

O último trimestre de 2022 será recordado para sempre como sendo o período em que, mais uma vez, os professores se acobardaram, por serem seguidistas dos sindicatos do sistema, manietados aos partidos.

Mais do que falar das atitudes do ministro, que num dia diz uma coisa e no outro o seu contrário, quero focar-me na atitude dos meus colegas professores.

Sobre a gravidade da situação já aqui comentei, sobre a postura dos professores fá-lo-ei nas próximas linhas, como forma de autocrítica e dando conta de que de uma maneira geral cada um tem aquilo que merece.

O enraizamento na classe docente à postura a que costuma chamar de “professor missionário” tem ajudado à degradação e ao próprio desprestígio da classe docente. A transformação profissional que nos foi sendo incutida com as políticas públicas da escola a tempo inteiro, da escola como suporte socioeconómico, como cuidadora ou mesmo guardadora dos alunos, têm-nos feito caminhar para a proletarização da profissão. Deixámos de ser professores para ser missionários, deixámos de ser intelectuais para sermos executadores de fim de linha. Uma transformação consumada, sem que tivesse havido sobressaltos de estranheza e resistência.

Quando o ministro da Educação tem afirmações que colocam em causa a idoneidade e seriedade dos professores, numa ação concertada para os espezinhar, poucos são os que se revoltam, poucos são os que chegam a sentir. E como diz o ditado, quem não sente não é filho de boa gente. Perante tal apatia, cresce a arrogância e a prepotência em forma de continuadas afirmações, que diminuem a nossa imagem social. Como dizia a malograda Maria de Lurdes Rodrigues, perdendo os professores mas ganhando os pais, para, enfim, poder delapidar a profissão.

Perante as atrocidades que o ministro pretende fazer à carreira docente, com consequências de gravidade máxima na vida de milhares de professores, e constatando que os sindicatos do sistema se acobardam de agir assertivamente, o que fazem os professores?

Acobardam-se igualmente! Ao invés de, corajosamente, agirem em concordância com tamanhas intenções maliciosas, ajudados pelos pré-avisos de greve por tempo indeterminado do irreverente e menosprezado sindicato S.TO.P, preferem fingir que o problema não é deles. Descosem-se em desculpas do mais caricato que possa existir e ainda acusam os sindicatos de nada fazerem.

Todos os governos percecionam esta apatia globalizada na classe e só por isso se sentem poderosos o suficiente para fazerem de nós aquilo que quiserem. Mal sabemos a força que poderíamos ter se assim quiséssemos, se conseguíssemos ser livres e informados, como convinha que fossemos. Pela profissão que desempenhamos, poderíamos parar o país e obrigar qualquer governo, com ou sem maioria, a ouvir e atender as nossas reivindicações.

Deixemos as missões para os missionários, assumamos a nossa condição de professor, encaremos a nobreza da nossa profissão, respeitando-a.

Durante décadas, a ideia de professor missionário foi passando e agora até temos colegas que vêem com algum desdém aqueles que tentam, aqui ou ali, acordá-los da letargia em que se encontram e com eles todo o ensino!

O prestígio de uma classe constrói-se mostrando caráter. Constrói-se de dentro para fora, somos nós que temos de mostrar que respeitamos a profissão e por isso exigimos ter uma palavra a dizer. Mesmo que o caráter tenha faltado vezes de mais aos dirigentes sindicais, que deram por estes dias mais um sinal disso mesmo, exceção feita ao S.TO.P., que tem tentado fazer aquilo que ainda não foi feito, mas que se vê boicotado pelos demais, devemos ser nós a agir. Não podemos ser carneiros seguidistas de um qualquer sindicalista manietado.

Soltemo-nos, libertemo-nos das amarras que tão pouco ou nada têm feito por nós.

Custa-me muito perceber que a culpa de estarmos onde estamos é sobretudo nossa, dos professores. Dos apáticos, dos que se descosem em desculpas para se manterem inertes, dos missionários, dos executadores.

É de forma consciente que afirmo que a culpa de estarmos nesta situação é dos professores. Porque acham que, dando um exemplo, somos a única classe profissional que não viu recuperado o tempo de serviço? A hora de agir é agora, não em março, numa qualquer manifestação primaveril, com o folclore habitual.

Se não agirmos agora, se não mostrarmos que estamos efetivamente contra todas as alterações que o ministro quer impor, teremos aquilo que merecemos.

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12 comentários

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    • Não há € on 11 de Dezembro de 2022 at 14:04
    • Responder

    Que texto! Sem palavras… Bem-haja!

      • Maria Martins on 11 de Dezembro de 2022 at 22:01
      • Responder

      Que belo texto. Concordo em absoluto. Ou agimos TODOS agora para uma greve sem fim, ou será o nosso fim.

    • GREVE on 11 de Dezembro de 2022 at 14:05
    • Responder

    A estratégia do ME é adiar para apresentar lá para o fim de janeiro (dois meses depois!) os factos consumados. Os sindicatos do regime alinharam na estratégia para “amolecer” os professores. Lembram-se da afirmação, de uma ex-diretora regional, nos tempos da famigerada mlr, “os professores são como o esparguete, é pô-los em água que amolecem”? Estamos perante uma repetição. Os atores e a estratégia são os mesmos.
    Temos de aumentar a pressão. Não podemos, agora, vacilar e perder o que conseguimos nos últimos dias. Vamos, juntos, fazer o que nunca foi feito. Exemplo são as comunicações, das FAQ, que mandou os comissários políticos efetuar durante o fim de semana. Eu recebi ontem! A onda cresce a olhos vistos e, pelo que me é dado perceber, até pela CS(!), os pais estão connosco. O sonso treme cada vez mais.
    Falta pouco para conseguimos, não podemos perder uma oportunidade única, que conquistamos com tanto esforço.

      • on 11 de Dezembro de 2022 at 14:11
      • Responder

      … agora nem há Mundial para distrair atenções…

    • Lucinda Pereira on 11 de Dezembro de 2022 at 16:24
    • Responder

    A classe da carneirada ordeirinha, mas muito desunida à qual pertenço, mas com a qual não me identifico minimamente ou se rebela, agora, e grita ” Baaaaaaaasta! ” ou é engolida para sempre e de vez, porque já está, mesmo,mesmo, no restinho…

    • RF on 11 de Dezembro de 2022 at 16:25
    • Responder

    Subscrevo cada palavra. Mas não podemos baixar os braços. Na semana que se avizinha, devemos continuar a educar pelo exemplo, desde logo aqueles que, embora exercendo a mesma profissão, decidiram, na sexta-feira, entrar pelos portões das escolas, entrar nas salas de professores e nas salas de aula. As nossas ausências devem ser notadas e motivar conversas e envergonhados silêncios. Porque é preciso empurrar quem ainda não se juntou a nós para a causa que é comum. Só formalmente é que o direito a não fazer greve é simétrico do direito a fazer greve. Na prática, e no caso em apreço, não fazer greve equivale, moralmente, a ignóbil traição. Fazer grever é um dever moral! Um dever para com a escola pública, para com os alunos, para connosco, para com as nossas famílias e para com a sociedade!

    • maria on 11 de Dezembro de 2022 at 20:38
    • Responder

    Na minha escola já baixamos os braços. Dizem que vamos recomeçar em janeiro.
    Creio que a maioria nem se apercebe do que lhes está destinado.
    Querem esperar! Mas o quê?
    O que não percebo é esta desunião sindical, que também se reflete na mobilização dos professores nas escolas. Se os sindicatos quisessem já tinham organizado os professores de modo a que esta greve fosse um êxito.
    Não sei o que está por detrás desta atitude dos sindicatos mais antigos. Não sei o que os move, mas não parece ser o interesse dos professores deste país!
    Estou profundamente desiludida! Mais uma vez seremos vencidos, porque não nos soubemos unir, nem tivemos dirigentes sindicais que nos auxiliassem nesta luta.

    • Ana C on 11 de Dezembro de 2022 at 21:11
    • Responder

    Boa noite, amanhã o ministro vai estar em Alcochete para uma reunião com os diretores, parece que começa a haver mobilização para o receber…
    Vamos lá cambada, todos à molhada…

    O mundial acabou…

    MAS POR AQUI A LUTA CONTINUA

    • PedroNorte on 11 de Dezembro de 2022 at 21:21
    • Responder

    É só artistas… Uma tristeza esta classe.
    Eu cá, como sempre, farei greve por tempo indeterminado.
    Já sei que a maioria vai dar as aulinhas porque esta tudo contente!!!
    Fixe fixe era a greve prolongar -se para as reuniões de avaliação.

      • Marco on 12 de Dezembro de 2022 at 2:26
      • Responder

      Estamos na luta, também farei greve por tempo indeterminado. Tenho esperança que seja desta que finalmente o nosso grito seja forte e unido.

    • isabelinhamarela on 14 de Dezembro de 2022 at 18:22
    • Responder

    Greve de Zelo!!!

    • isabelinhamarela on 14 de Dezembro de 2022 at 18:33
    • Responder

    Demorar cinquenta minutos para fazer um sumario!!!! Ha outras formas de encravar a engrenagem. Teriamos todos de nos unir. Ha ainda outras mas nao consigo explicar melhor…

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