7 de Dezembro de 2022 archive

Quando um Sindicato se torna numa caricatura de um Sindicato…

 

Perante o cenário de catástrofe iminente para toda a Classe Docente, originado por obra e graça do Ministério da Educação, o que faz a maior Federação de Sindicatos de Professores?

Nada, basicamente não faz nada…

Nada. Porque, na prática, e dada a gravidade dos problemas criados pelas mudanças desastrosas que se adivinham na vida profissional dos Professores, agendar uma Manifestação para Março de 2023, ou organizar, até lá, para fazer passar o tempo, umas vigílias, uns abaixo-assinados ou uns pedidos de audiência, corresponderá a, efectivamente, nada…

 Ou alguém acredita que tais acções “reivindicativas” obrigarão a Tutela a retroceder no que quer que seja, ainda para mais com o apoio concedido por uma confortável maioria absoluta no Parlamento?

Se isso é o melhor que a Fenprof consegue fazer em termos de luta, de protesto e de reivindicação, num momento tão crucial para todos os Professores como o actual, restará, então, afirmar que esse Sindicato se tornou numa caricatura de um Sindicato…

Num dos momentos mais difíceis para os Professores, após o 25 de Abril de 1974, em vez do apoio inequívoco da Fenprof e da firmeza do seu líder, os Professores foram brindados com vacilação e letargia…

Deste momento, ficaria, por certo, uma caricatura risível, patética e jocosa, não fosse dar-se o caso de tudo isto poder ser realmente trágico…

Se se concretizarem todas as malvadezas que, nas últimas semanas, têm vindo a ser preconizadas, e algumas já anunciadas, pelo Ministério da Educação, o mundo profissional que os Professores conhecem deixará de existir, muito em breve…

A decisão da Fenprof, agora oficialmente conhecida, de não aderir à Greve convocada pelo Sindicato STOP, indicia que essa Federação de Sindicatos de Professores colocará acima de tudo e de todos o seu próprio protagonismo e o “elitismo” corporativista, em detrimento da união e da defesa efectiva dos interesses dos seus supostos representados…

A actuação da Fenprof, ao evidenciar uma postura pedantemente arrogante face à luta encetada pelo Sindicato STOP e uma frouxidão incompreensível face às intenções da Tutela, permitirá pressupor que:

– O seu poder negocial junto do Ministério da Educação seja nulo;

– A sua credibilidade, junto dos supostos representados, depois desta baixeza, seja praticamente nula.

Ou seja, a Fenprof parece caminhar, a passos largos, para se tornar numa nulidade em termos sindicais, sem sequer ter a desculpa de que outros tenham contribuído para isso, bastando-se a si própria para esse efeito…

Mas as traições da Fenprof face aos Professores não são algo inédito, se recordarmos que, em 2010, já tinham cedido a um ruinoso acordo, alegadamente selado com pizzas, com a então Ministra da Educação Isabel Alçada, desbaratando toda a força e união, alcançadas em 2008, pela maior Manifestação de Professores alguma vez ocorrida em Portugal…

A actual deserção da greve por tempo indeterminado também não pode deixar de ser considerada como uma traição aos Professores, a segunda perpetrada pela Fenprof, de forma flagrante e absolutamente visível para todos…

E, afinal, partir pratos não passou mesmo de uma manobra de diversão, de um “fait-divers”…

A acção, concreta e verdadeiramente consequente, contra os atropelos à dignidade profissional dos Docentes ficou novamente “guardada na gaveta”…

As muitas palavras dos maiores Sindicatos de Professores parecem servir apenas para esconder ou disfarçar a sua própria passividade e incompetência, acabando por reforçar as políticas erráticas da Tutela…

 

Que outras evidências serão necessárias para que a Fenprof deixe de conceder sucessivos “benefícios da dúvida”  e oportunidades ao Ministério da Educação?

 

Não existem ainda factos suficientes que justifiquem uma greve por tempo indeterminado?

 

A farsa das “coreografias bem encenadas” também parece continuar, cada vez mais fortalecida, plausivelmente dominada por “pactos de não agressão” em relação ao Ministério da Educação e por “agendas partidárias”…

A descrença generalizada dos Professores na maior parte das estruturas sindicais que supostamente os representam, que já era um dado adquirido, torna-se, agora, ainda mais evidente e incontornável…

Quanto às traições da Fenprof, a sabedoria popular talvez possa aconselhar os Professores: “Na primeira todos caem, na segunda só cai quem quer”…

Neste momento, parece que é oficial: a Fenprof tornou-se numa piada (de mau gosto) do Sindicalismo, à custa do seu próprio desempenho…

E bem poderão arrogar-se o título de “maior e mais representativa organização sindical de professores em Portugal” (página online da Fenprof), que isso apenas acentuará, ainda mais, a sua negligência na defesa da Profissão Docente…

 sorte para quem é Professor em Portugal: ter que contestar, além da Tutela, agora também, parte significativa daqueles que deveriam zelar pelos seus interesses profissionais…

Perante a inoperância da Fenprof face ao “abismo ali tão próximo”, fica-se verdadeiramente incrédulo e não pode deixar de se sentir vergonha alheia…

(Paula Dias)

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Ser grãos para moinho – Santana Castilho

 

A degradação do sistema de ensino começou com Maria de Lurdes Rodrigues, a 12 de Março de 2005, e tem vindo num contínuo de responsabilidade partilhada, ao qual, com arredondamentos de pequena monta, 13 anos cabem ao PS e quatro ao PSD.
No passado dia 29, o ministro da Educação fez-se ouvir em conferência de imprensa. Denunciou o que apoda de falsidades sobre as suas intenções. Foi um discurso insidiosamente dúplice, sinuoso, mas estratégico: de recuo em termos de propostas e calculista no que toca à manipulação e à adulteração do que tinha dito antes, para desmobilizar e confundir os mais indignados.
Reagindo à iniciativa do ministro, a FENPROF divulgou todas as propostas que se podem extrair daquilo que ele apresentou (via PowerPoint e, em rigor, a única referência escrita sobre as alterações em análise) nas reuniões de 22 de Setembro e 8 de Novembro, relativas à revisão do regime de concursos. Mais, requereu as actas e as gravações áudio dessas reuniões.
Cotejando as duas intervenções, parece-me cristalina a conclusão: foi o ministro da Educação que, no momento dois, disse que o ministro da Educação tinha mentido no momento um. Neste quadro, e estando convocada uma greve de professores, que se inicia a 9, é tempo de dizer duas coisas, que se impõem:
– É relevante que tenha sido sob a égide de governos do PS, de António Costa, e a partir de uma perspectiva enviesada de a geringonça e PS serem de esquerda, que tenhamos assistido aos maiores e graves atropelos ao direito de greve, instituto fundamental de qualquer sociedade livre: entre outros, mais do que discutíveis requisições civis de enfermeiros e professores, polícias a baterem à porta de motoristas de viaturas de transporte de matérias perigosas e polícia de choque usada para intimidar os grevistas e proteger os fura-greves, no caso dos estivadores.
– Vivemos num país onde as condições de trabalho dos professores têm vindo a ser gradual e crescentemente espezinhadas desde 2005, sem indignação suficiente e eficaz dos próprios, nem expectável sobressalto dos demais cidadãos. E quando um sindicato (S.TO.P.) tem a “desfaçatez” de reclamar de modo mais vigoroso, é ostracizado pelos pares, que se apressam sempre a boicotar os combates que não sejam de sua iniciativa. Dito isto, é evidente que, para que as propostas de João Costa se venham a impor, quantas menos sejam as vozes críticas ou discordantes, melhor. Por isso mesmo, são em minha opinião colaboracionistas com o poder todas as lógicas que isolem ou abafem os que queiram sair dos conhecidos rituais dos sindicatos do sistema.
Aqui chegados, é minha convicção que estamos perante um modus operandi que se repete. Primeiro apresentam-se cenários horríveis. Depois vive-se um ritual hipócrita de prolongadas e falsas negociações e caricaturais protestos (abaixo-assinados, cordões humanos, marchas, vigílias, quem sabe se um jantar de Natal, para inovar). No fim, o ministério ganha e os sindicatos também: o primeiro por ter pregado mais um prego no caixão; os segundos por terem “evitado o pior”. Só os professores perdem. Perdem sempre, desde 2005! Já têm pouco para perder, mas vão mobilizar-se em defesa desse pouco, numa manifestação … a 4 de Março do ano que vai vir!
Em vez de promover avanços, os sindicatos do sistema contentam-se com atrasar os retrocessos. Assim, as nossas organizações sindicais têm-se transformado em albergues de inutilidades, enquanto o quotidiano dos professores é cada vez mais penoso. E sendo a gestão da percepção pública um importante instrumento político, João Costa tem nesta doce oposição sindical um instrumento importante para disfarçar a mediocridade da sua acção. Por tudo isto, seria bom que reflectíssemos sobre o papel dos movimentos independentes de professores e sobre a forma como essas organizações, sem a logística e os recursos das duas grandes federações sindicais, lhes impuseram a dinâmica que conduziu à grande manifestação de 2008.
Disse a FENPROF que a força da luta se mede pelo número dos que nela participam. Digo eu que se mede, antes, pelos resultados conseguidos. Numa luta de professores por melhores condições de trabalho e melhor escola pública, só há um lugar aceitável, se não quisermos ser grãos para moinho: ao lado deles!

In “Público” de 7.12.22

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