Aumentou a indisciplina nas salas de aula?
A mediatização volta a salientar o aumento da indisciplina nas salas de aula. E se em rigor não se pode afirmar tal subida num universo inquantificável, também não se deve ignorar um assunto crucial para as aprendizagens, e para o ensino, numa fase em que à crescente falta de professores se responde com mais precariedade. Desde logo, sublinhe-se questões prévias: esta discussão é recorrente e, com frequência, confunde-se correntes da pedagogia com ideologias políticas; desde que há escolas que existem problemas disciplinares mais ou menos tolerados e há intemporalidades na sua percepção, nomeadamente as relacionadas com os conflitos de gerações e com a rebeldia na aprendizagem. Contudo, há variáveis escolares concludentes: turmas numerosas ou constituídas maioritariamente por alunos “que não querem aprender” – o desafio das democracias será sempre reduzir este grupo -. A indisciplina sobe exponencialmente se se junta essas variáveis e agrava-se se não se aplica uma regra elementar: a tolerância só é verdadeiramente educativa se estabelecer os limites do intolerável. No nosso caso, a discussão contamina-se pela desconfiança nos professores e pela ocupação do espaço de debate, e das políticas, por um antigo discurso centrado em categorias empáticas de negação de conflitos e contradições que rejeita um triângulo intemporal: os conhecimentos como ultrapassagem da relação contraditória entre professores e alunos, mesmo a que não se circunscreve às salas de aula e integra um conceito de escola como grande sala de estudo ou biblioteca a partir das turmas e das disciplinas e para lá dos seus limites físicos. São raros os estudos empíricos. No entanto, a “OCDE concluiu (2017), sem referir as causas, que, por cá, reina a pequena indisciplina nas salas de aula o que nos coloca, por exemplo, no primeiro lugar do tempo perdido para começar uma aula”. A OCDE não apurou as causas, mas parece que a adicção tecnológica, e a privação do telemóvel, será uma explicação. Além disso, estudos mais recentes da OCDE (2021) destacam-nos em primeiro lugar em domínios que influenciam a liderança dos professores: falta de reconhecimento e confiança, stress profissional, muita burocracia, exaustão e escolha de outra profissão se voltassem atrás. Ou seja, a indisciplina é um assunto entre professores e alunos que também tem, obviamente, origens concludentes na sociedade. Acima de tudo, ensinar é complexo, exige muita preparação e uma elevada energia. Requer o uso de diversos estilos de ensino, com as capacidades volitivas em inscrição optimista, para corresponder às constantes solicitações dos alunos, sabendo-se que é mais correcto falar de ignorância do que de conhecimento sobre o modo como cada um aprende. E neste mundo exigente e complexo, os professores necessitam de uma retaguarda forte e de boas condições de realização; e a carreira, a avaliação e o clima das escolas degradaram-se objectivamente. Aliás, se os professores assistem, há década e meia, à devassa mediática do seu exercício, é consequente a fuga à profissão. Até a avaliação se tornou pública. Ignorou-se que é impossível fazê-lo em escalas métricas. Há muito que se experimenta, mas se não existem casos de sucesso é porque ensinar é uma simbiose das emoções com a cognição; e não existem duas turmas iguais. As tentativas (Fundação Gates e “Obama Race to the Top”, por exemplo) que remuneraram eficazes e despediram ineficazes com base nos resultados dos alunos, obtiveram graves resultados: falta de professores e prejuízo dos alunos. Como consequência, os professores estão no lugar cimeiro dos travões (cotas e vagas) à progressão na AP e reconhece-se as brutais injustiças da avaliação que existe. É uma farsa burocrática que se impõe pela arbitrariedade e que abre portas à parcialidade. É um recuo de décadas na consolidação democrática. E se vem sempre a propósito nomear a democracia e a liberdade – a liberdade de ensinar e aprender é um valor precioso e inalienável -, a simbologia reforça-se no mês de Abril. E de imediato interroga-se: se governantes e demais decisores da hierarquia avaliativa reconhecem esta tragédia, por que será que não há liberdade para se pôr fim ao flagelo? A leitura de Byung-Chul Han (12:2014), em “Psicopolítica”, ajuda a explicar esta crise profunda da liberdade que parece atingir todos e beneficia os populismos autoritários: “a liberdade, que deveria ser o contrário da coação, engendra coações. Patologias como a depressão e a síndrome de burnout são a expressão de uma crise profunda da liberdade. São um indício mórbido de que hoje, através de diferentes vias, a liberdade se transforma em coação. O sujeito do rendimento, que se pretende livre, é na realidade um escravo. É um escravo absoluto. O sujeito do rendimento absolutiza a vida sem mais e trabalha.” E se Abril é o mês do sonho, da não desistência e da objecção de consciência simbolizada pelos cravos, recomenda-se o fabuloso conto “Bartleby” que Herman Melville publicou em Novembro de 1853. O escrivão Bartleby proclamou a célebre “preferia não o fazer” (“I would prefer not do” no original), numa manifestação que elevou o confronto à infâmia das inutilidades burocráticas. Bartleby manteve-se no seu posto, mas negou qualquer registo. Se a sua lição fosse apreendida, as lideranças das salas de aula voltariam a ter mais condições democráticas para transformar, em regra, a indisciplina numa educativa dissidência com responsabilidade. A mediatização volta a salientar o aumento da indisciplina nas salas de aula. E se em rigor não se pode afirmar tal subida num universo inquantificável, também não se deve ignorar um assunto crucial para as aprendizagens, e para o ensino, numa fase em que à crescente falta de professores se responde com mais precariedade. Desde logo, sublinhe-se questões prévias: esta discussão é recorrente e, com frequência, confunde-se correntes da pedagogia com ideologias políticas; desde que há escolas que existem problemas disciplinares mais ou menos tolerados e há intemporalidades na sua percepção, nomeadamente as relacionadas com os conflitos de gerações e com a rebeldia na aprendizagem. Contudo, há variáveis escolares concludentes: turmas numerosas ou constituídas maioritariamente por alunos “que não querem aprender” – o desafio das democracias será sempre reduzir este grupo -. A indisciplina sobe exponencialmente se se junta essas variáveis e agrava-se se não se aplica uma regra elementar: a tolerância só é verdadeiramente educativa se estabelecer os limites do intolerável. No nosso caso, a discussão contamina-se pela desconfiança nos professores e pela ocupação do espaço de debate, e das políticas, por um antigo discurso centrado em categorias empáticas de negação de conflitos e contradições que rejeita um triângulo intemporal: os conhecimentos como ultrapassagem da relação contraditória entre professores e alunos, mesmo a que não se circunscreve às salas de aula e integra um conceito de escola como grande sala de estudo ou biblioteca a partir das turmas e das disciplinas e para lá dos seus limites físicos. São raros os estudos empíricos. No entanto, a “OCDE concluiu (2017), sem referir as causas, que, por cá, reina a pequena indisciplina nas salas de aula o que nos coloca, por exemplo, no primeiro lugar do tempo perdido para começar uma aula”. A OCDE não apurou as causas, mas parece que a adicção tecnológica, e a privação do telemóvel, será uma explicação. Além disso, estudos mais recentes da OCDE (2021) destacam-nos em primeiro lugar em domínios que influenciam a liderança dos professores: falta de reconhecimento e confiança, stress profissional, muita burocracia, exaustão e escolha de outra profissão se voltassem atrás. Ou seja, a indisciplina é um assunto entre professores e alunos que também tem, obviamente, origens concludentes na sociedade. Acima de tudo, ensinar é complexo, exige muita preparação e uma elevada energia. Requer o uso de diversos estilos de ensino, com as capacidades volitivas em inscrição optimista, para corresponder às constantes solicitações dos alunos, sabendo-se que é mais correcto falar de ignorância do que de conhecimento sobre o modo como cada um aprende. E neste mundo exigente e complexo, os professores necessitam de uma retaguarda forte e de boas condições de realização; e a carreira, a avaliação e o clima das escolas degradaram-se objectivamente. Aliás, se os professores assistem, há década e meia, à devassa mediática do seu exercício, é consequente a fuga à profissão. Até a avaliação se tornou pública. Ignorou-se que é impossível fazê-lo em escalas métricas. Há muito que se experimenta, mas se não existem casos de sucesso é porque ensinar é uma simbiose das emoções com a cognição; e não existem duas turmas iguais. As tentativas (Fundação Gates e “Obama Race to the Top”, por exemplo) que remuneraram eficazes e despediram ineficazes com base nos resultados dos alunos, obtiveram graves resultados: falta de professores e prejuízo dos alunos. Como consequência, os professores estão no lugar cimeiro dos travões (cotas e vagas) à progressão na AP e reconhece-se as brutais injustiças da avaliação que existe. É uma farsa burocrática que se impõe pela arbitrariedade e que abre portas à parcialidade. É um recuo de décadas na consolidação democrática. E se vem sempre a propósito nomear a democracia e a liberdade – a liberdade de ensinar e aprender é um valor precioso e inalienável -, a simbologia reforça-se no mês de Abril. E de imediato interroga-se: se governantes e demais decisores da hierarquia avaliativa reconhecem esta tragédia, por que será que não há liberdade para se pôr fim ao flagelo? A leitura de Byung-Chul Han (12:2014), em “Psicopolítica”, ajuda a explicar esta crise profunda da liberdade que parece atingir todos e beneficia os populismos autoritários: “a liberdade, que deveria ser o contrário da coação, engendra coações. Patologias como a depressão e a síndrome de burnout são a expressão de uma crise profunda da liberdade. São um indício mórbido de que hoje, através de diferentes vias, a liberdade se transforma em coação. O sujeito do rendimento, que se pretende livre, é na realidade um escravo. É um escravo absoluto. O sujeito do rendimento absolutiza a vida sem mais e trabalha.” E se Abril é o mês do sonho, da não desistência e da objecção de consciência simbolizada pelos cravos, recomenda-se o fabuloso conto “Bartleby” que Herman Melville publicou em Novembro de 1853. O escrivão Bartleby proclamou a célebre “preferia não o fazer” (“I would prefer not do” no original), numa manifestação que elevou o confronto à infâmia das inutilidades burocráticas. Bartleby manteve-se no seu posto, mas negou qualquer registo. Se a sua lição fosse apreendida, as lideranças das salas de aula voltariam a ter mais condições democráticas para transformar, em regra, a indisciplina numa educativa dissidência com responsabilidade.
3 comentários
Os professores têm que desistir definitivamente no contributo para este “estado” de malfeitores….! É proverem junto dos mais novos, onão Ingresso nesta (des) profissão…. é deixar o sistema ruir, é deixar de vez, o que não é possível consertar…! A sociedade não merece.
Ficou repetido o texto.
A indisciplina, a falta de educação e mesmo agressividade fisica e psicologia, na sala de aula já aumentaram há pelo menos duas décadas. Grassam nas salas de aula. O que eu estranho é que os professores pouco falam disso, parece que querem manter as águas do pantano sem ondas.