Em algumas escolas, nas mais variadas ocasiões, mais ou menos “solenes”, habitualmente saturadas de muita encenação e abrilhantadas com abundante “cosmética”, ouvem-se frequentemente discursos apelando à tolerância, ao trabalho de equipa, à integração, ao espírito de missão, ao trabalho colaborativo ou ao positivismo que, por não terem qualquer reflexo ou verdadeira expressão na vida quotidiana desses estabelecimentos de ensino, não passam de inúteis vacuidades…
Discursos completamente contraditórios, incoerentes e dissonantes da prática diária observada, feitos à medida da mais elementar demagogia…
Em nome de uma paz meramente “cinematográfica”, quem confronta, discorda ou questiona é quase sempre tido como um incómodo, um empecilho, “uma pedra no sapato” ou como irritantemente maçador…
Afirmar o que realmente se pensa tende a ser considerado como uma prática inconveniente, ou até como uma blasfémia, assaz desaconselhável, parecendo não interessar a ninguém… Criticar não fica bem, não é de “bom-tom”, nem faz parte da “encenação” ou de qualquer “guião de etiqueta”…
A importância é sobretudo dada às aparências: fazer de conta que existe democracia dá muito jeito, em primeiro lugar, a quem impõe autocraticamente, centrando em si todo o poder decisório, mas também àqueles que obedecem a tudo sem reclamar… Os primeiros fazem de conta que não são ditadores, os segundos fazem de conta que não são caudatários e, no final, uns e outros parecem acreditar realmente nisso, convivendo muito bem e sempre com muita “fotogenia”…
Às vezes, parece existir uma espécie de “código de conduta”, traduzido ou pelo conjunto de comportamentos esperados ou, em alternativa, pelo conjunto de comportamentos não tolerados… Esse “código de conduta” nem sempre é expresso ou assumido, apesar de ser do conhecimento de todos e de estar, pelo menos, tacitamente estabelecido e vigente…
Não confrontar, censurar ou desaprovar; não provocar “agitação” que possa ser considerada como uma forma de “tumulto” ou de “rebelião”; não dizer publicamente o que realmente se pensa, a não ser que seja para expressar concordância, genuína ou simulada; ou aceitar sem questionar, parecem ser alguns dos comportamentos esperados…
Em alguns casos extremos, parece até considerar-se que o acto de Pensar se constitui como um delito, punível com as mais severas sanções… Pudessem eles ouvir o Pensamento alheio e o que seria?…
Chega a ser absurdo e desconcertante o modo como em algumas dessas escolas se assinalam e comemoram determinadas efemérides como a do 25 de Abril de 1974, quase sempre com numerosos eventos, compilados em “programas de festividades” amplamente publicitados, quando, na realidade, continuam a ser geridas segundo os cânones do dia 24 de Abril, ignorando o que é o exercício pleno da Liberdade, em particular a Liberdade de Expressão e de Opinião… Em suma, parece ser isto: “faz o que eu digo, não faças o que eu faço”, ou seja, uma flagrante dissonância entre a “teoria” propalada e a prática observada…
A escola tem vindo, cada vez mais, a tornar-se num lugar “claustrofóbico”, com consequências lesivas ao nível da saúde física e mental, visíveis e frequentemente reconhecidas por muitos dos que aí trabalham…
Como se o trabalho em si mesmo não fosse já suficientemente difícil, ainda se pode ter pela frente o despotismo de alguns que, dessa forma, contribuem implacavelmente para a eternização de um mau ambiente de trabalho, assim como a existência de alguns séquitos arregimentados, quase sempre prontos a trocar o amor-próprio pela titularidade de determinados cargos…
Desgraçadamente, os cargos de “confiança política”, habitualmente indissociáveis da obediência passiva, dominam os principais Órgãos existentes nos estabelecimentos de ensino, contribuindo também para a inobservância de uma democracia verdadeiramente participativa…
É assim a democracia de fachada, onde o desempenho de algumas funções não passa de um formalismo imposto por preceitos legais, apesar de alguns não conseguirem esconder o seu fascínio e o seu encantamento por certos “títulos” e “comendas”, todos, na realidade, esvaziados de poder executivo, mas, segundo parece, com a obrigação de prestar certos tributos, como “vénias”, “beija-mãos” e outras “reverências”… Inevitavelmente, “os pratos de lentilhas” serão sempre muito apetecíveis e irrecusáveis para alguns…
O desgaste físico e emocional que afecta grande parte dos profissionais de Educação não pode ser atribuído exclusivamente às políticas erráticas e desastrosas do Ministério da Educação… Um clima organizacional que não promove, mas antes impede, a autonomia e a liberdade dos profissionais envolvidos, será também certamente uma das causas do mal-estar docente e não docente…
Lamenta-se, mas a realidade actual, vivida e sentida, em parte considerável das escolas não é bonita nem saudável… Não mostrar essa realidade ou fazer de conta que ela não existe é contribuir para a perpetuação desse estado anómalo e patológico…
Essa realidade, onde muitas vezes prevalece o autoritarismo, despreza e desrespeita, em primeiro lugar, os que “não devem nada a ninguém” e que, diariamente, não desistem de dar o melhor de si no desempenho das suas funções, apesar de todas as contrariedades…
Haverá certamente pessoas confiáveis, que não recorrem ao “show off” permanente e que exercem as suas funções de forma democrática e numa perspectiva de efectiva partilha, não se enquadrando, por isso, no retrato aqui apresentado… A essas, que assim continuem…
Às do retrato, que tenham, no mínimo, a decência e a hombridade de se tornarem coerentes: abandonem os discursos patéticos sem qualquer reflexo na prática diária e as figuras grotescas de “lobos mascarados de cordeiros”… Na medida em que não é algo obrigatório ou irrenunciável, também o exercício voluntário de determinados cargos, contemplados ou não por suplementos remuneratórios, torna inadmissíveis as alegações de vitimização muitas vezes apregoadas ou a pretensa condição de “mártir da educação”…
Já não há a menor paciência nem tolerância para “golpes de teatro” ou para tiques de autoritarismo e de prepotência, bem patentes quando alguém, despudoradamente, teima em “passar atestados de imbecilidade ou de estupidez” a terceiros, como forma de impor as suas intenções… Mesmo que alguns, incompreensivelmente, pareçam não se apoquentar muito com isso…
Infelizmente, a norma sanitária “arejar os edifícios escolares” não eliminará o ar “tóxico” que se respira em alguns deles…
No meio de tantas incidências perversas, há Alunos… Felizmente, há Alunos. Crianças e jovens por quem também vale a pena continuar a resistir…
(A realidade é obscena e desagradável e haverá sempre quem prefira que não se fale dela… Mas ficar em silêncio e não a denunciar é uma forma de a consentir…).
(Matilde)
12 comentários
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Factual.👏👏👏
“Haverá certamente pessoas confiáveis, que não recorrem ao “show off” permanente e que exercem as suas funções de forma democrática e numa perspectiva de efectiva partilha, não se enquadrando, por isso, no retrato aqui apresentado.”
ONDE? (Não vale responder “na minha escola”, pois revela exatamente…MEDO de represálias e perseguições).
Concorro já para lá!!!!
Matilde, discurso que retrata fielmente, a maioria das escolas e o ambiente que nelas grassa.
O ambiente degrada-se a cada ano pelos motivos que apresentou. Não temos qualquer dúvida.
Não podemos, efetivamente, reclamar ou confrontar quem está no poder, mesmo que se exija o estrito cumprimento legislativo. Quase uma afronta exigir que se aplique a legislação? Se nos dizem está na lei, então que se cumpra a lei.
Vou continuar a “reclamar e a exigir” se não gostarem? Paciência!
Na verdade o meu horário não pode ficar pior, e os(as) alunos(as) são quem me dá alento para os anos que ainda faltam. Por eles temos de continuar a “lutar”
Matilde, sempre que leio um texto seu, fico maravilhada com a sua capacidade de análise, sempre oportuna, direta e fiel à realidade educativa. Nunca deixe de se indignar com a mediocridade dos “gestores” de tantas escolas e com aqueles que lhes fazem vénia. E são demais! Também sou docente, há quase 41 anos. Por ter ousado desafiar os poderes instituídos, fui várias vezes objeto de fúria, com péssimos horários e mobbing.
O cúmulo do paradoxo é ensinar-se a ter espírito crítico, nas não o usar!!! Que tristeza!!!!
UM conselho: fuja deste meio, seja feliz noutro lado.
Colega Matilde,
lamento, mas tenho a profunda convicção de que as coisas vão ainda piorar muito, muito, muito.
Portugal (geringonça, escola pública, meios de comunicação social, sistema judicial…) está nas mãos de gente que se acha o máximo e que despreza intensamente todos os outros.
Não vejo solução para o que se passa.
Só mesmo quando ficarmos completamente atolados na mediocridade e na pobreza.
Como somos um país que anda devagar, devagarinho, o processo vai demorar.
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É notório que o ambiente nas Latrinas Públicas (digo, escolas publicas) está muito degradado.
Seriam necessários GESTORES (de Carreira) e Não Sitôras e Sitôres da Tanga como diretorzecos nas ditas escolas públicas para limpar o ambiente. Lá chegaremos….já faltou mais….
As Sitôras e os Sitôres da Tanga são das Classes profissionais mais mesquinhas e labregas que conheço.
Hoje o tema que me provoca comichão é aquilo que dá pelo nome de Avaliação de Desempenho Docente. A questão é a seguinte:
– Sendo as classificações a atribuir de Excelente (9 a 10 valores); Muito bom (8 a 8,9 valores); Bom (6,5 a 7,9 valores): Bom (6,5 a 7,9 valores); Regular (5 a 6,4 valores) e Insuficiente (1 a 4,9 valores), gostaria de saber quantas Sitôras e Sitôres da Tanga tiveram as classificações de REGULAR e de INSUFICIENTE.
– Gostaria também de saber quantas Sitôras e Sitôres da Tanga que, após Processos Disciplinares desencadeados pela IGEC, tiveram as classificações de REGULAR e de INSUFICIENTE.
– Gostaria também de saber quantas Sitôras e Sitôres da Tanga transformados momentaneamente em DIRETORZECOS e que tiveram penas registadas pela IGEC obtiveram as classificações de REGULAR e de INSUFICIENTE?????????
Ou será que todos os Sitôras e Sitôres da Tanga (incluo diretorezecos) da “Escola Pública” são todos Bons, Muito Bons e Excelentes?????….
Eu conheço Muita Nódoa na Latrina Pública com classificações de Bons, Muito Bons e Excelentes 🙂 🙂 🙂
🙂
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“ Seriam necessários GESTORES (de Carreira)”
Tantos disponíveis e de qualidade: o Mexia, o Bava, o Granadeiro , o Salgado, o Rendeiro, o Oliveira e Costa, etc, etc.
A fina flor da latrina privada que enterrou as contas do país!!!
Ó Pensador, Karamba e outros nomes que usas, é claro que tu nunca tens INSUFICIENTE ! Estás habituado a ter Sardão com fartura e dele abusas, tu nunca o tens insuficiente.
Claro que conheces “Muita Nódoa na Latrina Pública”, basta olhares-te ao espelho.
Muito bom… Quem vive uma escola publica não pode deixar de admirar esta forma clara de expor essa realidade. muitas dessas personagens apoucadas pelo entendimento que fazem do poder ridículo de que foram investidas, provavelmente nem tem capacidade para se reverem tão fielmente estão retratadas. Não se dão conta de como são ridículas e desprezíveis. É assim mais ou menos, geralmente mais em todas as escolas… Parabéns à Matilde. Apenas faltou tecer uma consideração acerca da sinistra avaliação dos docentes, secreta estapafúrdia, injusta e geradora de conflitualidade tremenda nas escolas. Avaliação que Beneficia apenas os lambe-botas e alimenta o ego daqueles poderes ridículos que usufruem de um suplemento alo salário e de bonificações sucessivas na contagem do tempo para progressão, ou não escolhessem eles para si a melhor fatia do bolo, a excelência, dizia apenas beneficia estes, os piores do edifício escolar e prejudica antes de mais os alunos e todos os que ainda teimam em serem professores inteiros independentes e dedicados aos alunos… Muito bem…
Excelente.
Parece-me um retrato bastante fiel (infelizmente) do que se passa atualmente em algumas das nossas escolas… Mas isso interessa a quem???…. Quem quer saber???? (segundo o retrato apresentado… a ninguém!!!) . Muita boa gente gostará que tudo continue com está… sem fazer ondas!
Trata-se de um texto que merece uma profunda reflexão pelos que, AINDA, se preocupam com o estado a que chegou a nossa EDUCAÇÃO.