Debater (o que interessa) sobre a gestão escolar. – Maurício Brito

 

O texto é longo. Mas acho que o tema merece a profundidade que alguns, aparentemente, não pretendem dar. Vou começar por aquilo que considero mais elementar e importante: todas as pessoas têm a liberdade de se expressar e de opinar. Para que não fiquem dúvidas em certas cabecinhas, aparentemente afectadas por um qualquer vírus abestalhado ainda não identificado. Mas há que saber distinguir o que são opiniões fundamentadas e alicerçadas no conhecimento e experiência, do que são meros “achismos”, conjecturas, teorias da conspiração ou outras coisas bem piores. Até porque parece que entramos numa (triste, muito triste) fase do “vale tudo”. Algo que, quero deixar claro, não irei alinhar. A minha massa é feita de princípios e valores que não se coadunam com juízos de valor e jogos sujos – e, por isso mesmo, fico-me por aqui.

Dito isto: até há pouco tempo atrás, e tal como muitos colegas ainda hoje pensam, considerava que um diretor/presidente do conselho executivo (p.e.) deveria manter-se próximo da sala de aula, partilhando o quotidiano com outros professores de um conselho de turma e os seus alunos. Essa proximidade parecia-me crucial para garantir que o diretor compreendesse os desafios reais da escola. Contudo, com a curta experiência adquirida nestes dois últimos anos enquanto adjunto, mudei completamente de opinião. E já explico, mais à frente, os motivos que levaram a essa mudança.

Antes de mais, reafirmo que não sou a favor do actual modelo de gestão, que concentra demasiada responsabilidade numa única pessoa. Defendo, como sempre defendi, um modelo do tipo colegial, onde as decisões são partilhadas e a liderança é, por natureza (não é um dado garantido, convém realçar…), mais colaborativa. Também por isso, continuo a pensar que um diretor/pe deva ser, antes de tudo, um professor. A experiência de ensino é fundamental para garantir que a gestão escolar esteja alinhada com as necessidades pedagógicas reais. Daí que, e mais conciso não consigo ser, não considere necessária a criação de uma “carreira de diretor”. Considero, também, que o exercício do cargo de diretor/pe deve estar reservado a quem tenha dado aulas na mesma escola ou agrupamento durante um período significativo — entre 8 e 10 anos seria o ideal — para garantir um verdadeiro conhecimento da realidade local.

Além disso, acredito que deveria ser condição de acesso a passagem prévia por cargos intermédios de responsabilidade, como a direção de turma, a coordenação de um conselho de área disciplinar ou de departamento e uma participação ativa no conselho pedagógico. Esses cargos são essenciais para desenvolver uma visão abrangente das necessidades organizacionais e pedagógicas da escola, preparando o docente para a complexidade da função de diretor (ou presidente do conselho executivo).

Retornando então à questão inicial, considero que aqueles que defendem que o diretor/adjunto deve dar (mais) aulas, frequentemente ignoram a verdadeira amplitude das responsabilidades que o exercício dos cargos exigem, talvez influenciados por contextos de proximidade ou por maus exemplos conhecidos. É fácil pensar que a proximidade física com o ensino garantiria uma gestão mais eficaz. No entanto, a liderança escolar exige uma dedicação integral às inúmeras funções administrativas e pedagógicas. Mais: um diretor/pe verdadeiramente comprometido está diretamente envolvido na elaboração dos documentos orientadores da escola, acompanha as questões pedagógicas no seu dia a dia e mantém um contacto contínuo com os docentes e alunos, garantindo que está sempre próximo da realidade, mas de uma forma incomparavelmente mais eficaz do que a dar 2/4 horas de aulas a uma turma.

Por isso, reitero o que já escrevi no passado: nunca embarquei nem embarcarei num discurso limitado, pouco consciencioso e muitas vezes desrespeitoso contra o exercício de um cargo que deve merecer o respeito de todos. Porque embarcar é agir de forma semelhante aos que criticam “as regalias dos professores”. Dos que não compreendem a redução da componente letiva por idade ou a atribuição de 2 horas de crédito e 2 de tempo de escola para a função de diretor de turma. Reparem: alguém consegue explicar que um professor tenha 2 horas de crédito para “gerir” uma turma e 25 alunos e que um diretor não possa ter 22, 20 ou menos horas por ser responsável por mais de cem turmas, 1800 alunos e toda a gestão administrativa, financeira e de recursos humanos? Sejamos mais sérios e cuidadosos com o que andamos a dizer.

Outra questão fundamental nesta discussão é a utilização do crédito horário disponível para a escola. Utilizá-lo para atribuir horas a colegas que ocupam cargos que, em teoria, são importantes, mas que na prática têm pouco impacto direto na aprendizagem dos alunos, é contraproducente. Essas, como chamo, “assessorias fantasmas”, esgotam recursos valiosos que deveriam ser canalizados para o verdadeiro benefício dos estudantes, nomeadamente através do aumento de horas para o apoio pedagógico e para a recuperação de aprendizagens. Ora, quando o crédito é distribuído de forma adequada, fundamentalmente para os alunos e para algumas assessorias especializadas, as direções acumulam, como é expectável, as suas devidas responsabilidades e “pastas”. Isso resulta num volume de trabalho que, caso fossem atribuídas mais horas de aulas, impediria aos membros da direção de se dedicarem plenamente às suas funções, prejudicando o exercício de ambos os cargos – dar aulas e o apoio à gestão.

Falemos sobre uma questão que, esta sim, considero das mais importantes: a limitação de mandatos. Não julgo ser adequado que um diretor/p.e. ultrapasse os dois mandatos, no máximo três, e mesmo assim apenas em situações muito excecionais. Limitar os mandatos é fundamental para promover a renovação de ideias, evitar a estagnação e assegurar que a escola se mantém dinâmica e inovadora. As escolas são entidades vivas, que se transformam com o tempo. Para que essas transformações aconteçam de forma positiva, considero importante que a liderança seja renovada periodicamente, trazendo novas perspetivas e abordagens.

Em última análise, ser diretor (ou presidente do conselho executivo) é muito mais do que apenas gerir uma escola; é uma missão que exige dedicação total ao exercício do cargo e à criação de condições para que todos os membros da comunidade escolar possam prosperar. A experiência enquanto professor e o conhecimento profundo da realidade escolar são essenciais, mas a gestão de uma escola requer também uma visão estratégica e a capacidade de liderar de forma colaborativa.

Por isso mesmo, e resumindo, defendo que o modelo de gestão escolar deve ser do tipo colegial, com a responsabilidade partilhada entre vários elementos, e que os diretores/presidentes do conselho executivo devem ter uma forte ligação à escola que lideram, acumulando uma experiência significativa em cargos intermédios antes de assumir a direção. Acredito ser desta forma que podemos garantir uma liderança eficaz, renovada e verdadeiramente comprometida com o sucesso de toda a comunidade educativa.

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9 comentários

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    • Dinis on 23 de Setembro de 2024 at 14:10
    • Responder

    Opinião que impede a democracia.
    A opinião é interessante, mas com vários pontos que precisam de ser melhorados.
    Por exemplo, o facto de os candidatos a diretor deverem ter exercido cargos de gestão intermédia é meio caminho andado para impedir os mais capazes de poderem algum dia vir a ser diretores e efetivamente mudarem o status quo.
    Toda a gente sabe como são definidos os cargos intermédios…

      • Chefe on 23 de Setembro de 2024 at 14:37
      • Responder

      A questão é simples.
      Se queres ser diretor tens de trabalhar para lá chegar. Sejas esperto/inteligente para tal.
      É preciso percorrer um certo caminho para lá chegar.
      Então, mete mãos à obra.
      Se não queres, não precisas de ter esse esforço acrescido.

        • vaqueiro on 23 de Setembro de 2024 at 14:52
        • Responder

        Uma questão de Margarinas

        Chefe — besuntão e manhoso

        Vaqueiro — ordenha as vacas e trabalha como lhe impõem

        Pastor — guardador de gado e adjunto do Chefe

    • Tonho on 23 de Setembro de 2024 at 14:21
    • Responder

    Subverter a democracia e impedir a participação de modo livre e espontâneo.

    Presos a uma hierarquia político-partidária que irrompe qual erva daninha pelos centros de decisão e manipula todos os aspetos da vida dentro e fora da escola. O professor vê-se rodeado de infindáveis oportunistas sem escrúpulos cujos acólitos visam apenas manter/submeter os demais.

    • mafia PS-PS2 on 23 de Setembro de 2024 at 15:03
    • Responder

    Votem na máfia PS-PS2 e depois não se queixem … Ouçam as intervenções do colega João Tilly , do partido Chega, no parlamento e tirem as vossas conclusões …

    • Atento on 23 de Setembro de 2024 at 15:22
    • Responder

    Falta algo muito importante no artigo:
    1. eleição. Será que defende a continuação de um simulacro de eleição dentro de uma seita a que chamam CG???
    2. Contabilizar devidamente os mandatos exercidos, coisa que os filintos recusam.

      • !!! on 23 de Setembro de 2024 at 15:39
      • Responder

      Esquecer o essencial, a DEMOCRACIA, parece muito pouco acidental…

    • Dinis on 24 de Setembro de 2024 at 10:14
    • Responder

    Parece-me bastante patética a sta intervenção.
    É um daqueles que bajula o chefe para ter cargos que depois executa de forma incompetente, ou é um diretor incompetente que tem uma série de acéfalos a lamber-lhe os sapatos e impede os professores competentes de assumirem os cargos para ninguém lhe fazer sombra?

    • Dinis on 24 de Setembro de 2024 at 10:15
    • Responder

    O comentário anterior é para o tipo comentador que se intitula como Chefe, não é para o autor do texto.

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