Para minha boa surpresa, chega-me o pedido de parecer do muito aguardado projecto de revisão das 4 leis que actualmente regulam os mestrados em ensino. Já tinha criticado a demora política para resolver a confusão que reina no nosso quadro legislativo, incluindo os dois decretos que o governo anterior tinha publicado na sua saída, contribuindo para engrandecer significativamente a confusão.
Não podendo aqui divulgar esse projecto de lei de revisão, mas certamente alguém irá divulgá-lo por aí, porque está em discussão pública, permito-me divulgar o resumo das alterações que propõe:
“Destaca-se no presente diploma a eliminação dos componentes de formação específicos para os detentores do grau de mestre ou de doutor, deixando à Instituição de Ensino Superior o ónus da análise de cada caso, para que deste procedimento seja mais adequada a distribuição de créditos; o reforço da autonomia das escolas para a constituição dos núcleos de estágio; as alterações referentes ao professor orientador, que passam pela opção por um suplemento remuneratório ou pela redução da componente letiva do trabalho semanal (que acresce à redução estabelecida no n.º 1 do Artigo 79.º do Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, na sua redação atual – ECD), de acordo com as necessidades da escola e da formação; o incremento conferido à prática de ensino supervisionada, principalmente tratando-se da prática autónoma (para o efeito, foram efetuadas alterações no número de alunos por professor orientador de acordo com as características da escola); o aumento das horas de exercício efetivo de atividade autónoma com os alunos, atendendo às características de cada escola e estudante; e a eliminação dos contratos de estágio.”
Tenho de aplaudir de pé a nova versão proposta, como antes critiquei bem alto algumas outras versões e decretos.
Optou-se por não só corrigir os erros dos dois decretos socialistas como se pretendeu seguir o caminho do respeito pela autonomia universitária para a maior parte das decisões.
Simplificou-se até onde era possível o DL 79/2014, o que se aplaude de novo. Uma lei reduzida ao essencial é meio-caminho para que seja bem aplicada.
Sobram alguns pormenores que espero ainda que sejam afinados até à versão final, sobretudo a porta demasiado aberta ao reconhecimento de diplomas estrangeiros, o que pode pôr em causa alguma injustiça com os portugueses que obtiveram um mestrado em ensino em condições de grande exigência nem sempre reconhecíveis em outras formações estrangeiras, sobretudo quando se resumem a licenciaturas que estão longe do nosso sistema com licenciatura e mestrado para obter a habilitação profissional.
Os professores cooperantes ficarão satifeitos com a justiça de ficar previsto que sejam remunerados pelo seu serviço, o que é mais do que justo.
Vamos ver como fica o texto final, mas o que li é toda uma nova esperança.
Depois, só ficará a faltar o reforço do financiamento do ensino superior para que seja possível recrutar mais professores para a formação inicial sem o que será impossível aumentar as vagas existentes.
Mais de metade dos docentes do básico e secundário têm redução de aulas — a maioria por causa da idade
Numa década, o número de professores contratados aumentou significativamente, o que poderá ser em parte explicado pelas substituições por baixa médica. Apenas 2,4% dos docentes têm menos de 30 anos.
A incidência e influência do smartphone e da Internet na geração Z são inegáveis, como demonstra à exaustão Jonathan Haidt n’ A Geração Ansiosa (D. Quixote, 2024). A melhor solução será retirar os telemóveis da escola? Impedir as crianças e adolescentes de os usarem? Não estaremos a tentar resolver um problema – que é real – com um problema ainda maior?
A indústria e o mercado acabarão, mais cedo ou mais tarde, por decidir pela escola. Os grandes problemas nunca são criados nem resolvidos no seu interior. As grandes soluções vêm de fora. A escola, em todo o mundo, é hoje um dos mercados mais apetecíveis. É o espaço onde passa e permanece toda humanidade. As soluções erradas são muitas vezes um excelente negócio. O caso dos surdos é um bom exemplo. No fundo é um problema de mercado.
Por um lado, as novíssimas tecnologias e a IA são a resposta mais poderosa para o crónico e grave problema de um ensino igual e uniforme para pessoas tão diferentes. Por outro lado, o saber, todo o saber, outrora privilégio exclusivo dos professores, está hoje todo online e à distância de um clique, o que permite libertar o professor de repetir vezes sem conta as mesmas lições para se concentrar mais nas pessoas dos alunos, respondendo mais e melhor aos problemas de cada um. Estão criadas as condições para a maior autonomia dos alunos, a iniciativa, a curiosidade, o espírito crítico. Os aprendentes têm agora a oportunidade de deixar de ser meros gravadores de som, meros discos de memória, sempre limitada, para assumirem o papel de autofalantes e altifalantes, com voz própria. As motivações e talentos de cada um encontram agora respostas e descobertas que o ensino tradicional não podia oferecer.
Retirar da escola o acesso direto ao saber disponível online é estimular o regresso ao ensino oral, expositivo, repetitivo, enfadonho e pouco eficaz da escola tradicional. É voltar ao séc. XIX. É verdade, as crianças precisam de brincar, de jogar, de exercitar o corpo; de relações pessoais que estimulem os afetos, o sentido de cooperação e de solidariedade; precisam de amigos verdadeiros, de carne e osso, e não apenas de amigos virtuais, desconhecidos e voláteis, como defende Haidt na obra referida. O diagnóstico de Haidt é perfeito, mas o “Guia de tratamento” está errado. É preciso promover e programar a escola como espaço para o crescimento saudável, física e mentalmente, de relações humanas saudáveis e permanentes, mas não pode ser à custa do sacrifício e do desprezo da maior fonte de enriquecimento que conheceu até hoje. Como refere insistentemente o mesmo autor, a criança tem de aprender a enfrentar e a superar os problemas. Este é apenas mais um. É aí que devem centrar-se as apostas do presente.
Habilitação Própria c/ licenciatura pré-Bolonha impedido de concorrer Concurso Extraordinário
Queria apenas partilhar o que me sucedeu ao tentar concorrer ao último concurso lançado agora.
Sou licenciado em Tradução variante Inglês, curso pré-Bolonha de 2004.
Tenho lecionado sempre com habilitação própria, exclusivamente o Inglês ao 1º Ciclo desde 2009 nas AEC , acumulando desde 2022 horários no grupo 120 até hoje, totalizando 2105 dias de tempo de serviço . Estava super motivado para concorrer a este concurso quando deparo-me com uma injustiça tremenda.
Na habilitação própria dividiram os cursos pré-Bolonha e os cursos pós-Bolonha, isto é, o sistema só me permite concorrer ao 120 como uma habilitação própria pós-Bolonha. Estou assim impedido de concorrer quando estou há tantos anos a lecionar apenas Inglês ao 1º ciclo.
Pela lógica, não poderia então dar aulas no grupo 120 através das contratações de escola como tenho feito nestes últimos 2 anos. Se as escolas permitiram tal situação, não consigo entender.
É de lamentar. Significa que uma pessoa licenciada pós-Bolonha com um curso igual ao meu de 3 anos pode concorrer. Eu, que tenho uma licenciatura de 5 anos e com algum tempo de serviço acumulado, não posso concorrer porque o curso é pré-Bolonha. Basicamente, posso concorrer aos grupos 220 e 330 dos quais não tenho qualquer interesse, mas que constam na lista dos cursos de habilitação própria pré-Bolonha.
Resumidamente, posso concorrer para o Inglês do 3º ciclo e secundário mas 1º ciclo , que é apenas a minha experiência e vocação, não posso.
Não posso sequer tirar um mestrado profissionalizante para o grupo 120 porque tenho tido sempre horários completos e na zona centro de Portugal onde resido, a faculdade mais próxima que ministra esse curso situa-se a 150 km, exigindo aulas presenciais.
Que triste país. Sinto-me, simplesmente, usado por este sistema que não me quer. Com isto, só me resta finalizar o ano letivo e desistir deste sonho, regressando à minha atividade anterior. Depois não venham dizer que há falta de professores.