Os alunos do 4.º, 6.º e 9.º anos fazem a partir desta segunda-feira e até ao final do mês provas-ensaio de preparação para a avaliação nacional no final do ano letivo. Os resultados vão ser divulgados até ao final do 2.º período para que as escolas que pretendam os possam usar na classificação interna.
As coisas más não desaparecem só porque se evita falar delas, pelo que a eventual existência de “bulliyng” entre Professores não poderá ser um tema interdito ou visto como um tabu, que não deva ser falado ou discutido, por poder causar algum tipo de melindre, desassossego, incómodo ou desconforto…
Na Escola Pública não parece aconselhável nem sensato que existam temas proibidos ou assuntos indiscutíveis, por conseguinte, e apesar de não ser fácil nem aprazível a abordagem deste tema, susceptível de causar alguma celeuma, controvérsia ou polémica, não poderá deixar de se questionar:
– Há ou não “bullying” entre Professores?
A propósito da violência em contexto escolar, ultimamente ilustrada por graves agressões verbais e físicas entre Alunos, afirma-se com alguma frequência, sobretudo em cenários informais, que entre Professores também existirão certas atitudes e comportamentos, que resvalarão para algo que muitos apelidam de “bullying”…
Numa altura em que se ouve falar de “bullying” praticamente todos os dias, ao mesmo tempo que se assiste a uma certa banalização do uso desse termo, por vezes, até, de forma abusiva, importa, antes de mais, considerar o significado da expressão “bullying”:
– De forma resumida, o conceito de “bullying” remete para um comportamento agressivo, intencional e repetido ou reiterado, muitas vezes expresso por agressões psicológicas e/ou físicas, em que o agressor apresenta uma determinada ascendência sobre a vítima, impondo, por essa via, intimidação, humilhação e medo…
– Pela definição anterior, uma situação de conflito que oponha duas ou mais pessoas pode não configurar como “bullying”…
Muitas vezes se refere que a Classe Docente é particularmente propensa a conflitos internos e a lutas fratricidas, sendo que os próprios Professores costumam assumir essa condição, tantas vezes traduzindo-a pela afirmação: “O pior inimigo de um Professor é outro Professor”…
Se o pior inimigo de um Professor for mesmo outro Professor, é possível que em algumas escolas existam certas ocorrências compatíveis com quadros de “bullying” entre Docentes?
Haverá em alguma escola Professores que se sejam alvo de comportamentos agressivos, intencionais e repetidos que resultam em humilhação e intimidação, perpetrados por algum dos seus pretensos pares?
Se existir “bullying” em alguma escola, entre Professores, estaremos perante um problema grave que não poderá ser ignorado, nem escamoteado:
– O “bullying” exercido por adultos torna-se ainda mais odioso e perverso, não sendo possível acreditar que o mesmo não seja praticado com plena consciência das maldades perpetradas e do que isso implicará para as respectivas vítimas…
– A baixeza de carácter atinge o seu apogeu, quando alguém, de forma expressa ou subreptícia, envereda pela prática de “bullying”, fazendo uso das estratégias mais ardilosas para atingir determinados objectivos pessoais, de modo a sentir-se “superior”, “muito competente” ou “vencedor”…
– O “bullying” entre adultos, nomeadamente em contexto laboral, é muitas vezes responsável por sintomas de “burnout”, de depressão ou de acentuada ansiedade nas vítimas, sendo essas as consequências mais visíveis e imediatas do comportamento abusivo e persistente, evidenciado pelo(s) agressor(es)…
Um “bully” tanto pode ser alguém em “nome individual”, como uma “entidade colectiva”…
Um “bully” está quase sempre convencido da sua invencibilidade, mas dificilmente conseguirá esconder aquilo que melhor o caracteriza: uma indisfarçável cobardia e uma imensurável deslealdade…
Um “bully” é, acima de tudo, um cobarde…
E como “a cobardia é a mãe da crueldade” (Michel de Montaigne), um “bully” também é irremediavelmente perverso, tirânico e maléfico…
Um “bully” aposta quase sempre no medo, no silêncio ou na fragilidade das vítimas, muitas vezes “atormentadas” pelo receio de “arranjar ainda mais problemas” ou de continuadas e devastadoras represálias ou retaliações…
Um “bully” tem que ser denunciado, por todos os meios possíveis… Não pode haver complacência, nem cumplicidade, face a tal tirania…
O Código Penal Português prevê, de resto, uma moldura penal para “crimes contra a liberdade pessoal” (Capítulo IV) que, entre outros, se poderão verificar num quadro de “bullying”, designadamente:
De referir que nessas três situações “o procedimento criminal depende de queixa”…
Quantos Professores terão apresentado queixa, em virtude de se sentirem ameaçados, coagidos ou perseguidos por pretensos pares, numa determinada escola?
Acredito que muito poucos…
O medo de que as coisas piorem ainda mais, leva, no geral, ao silêncio sufocante… E a aparente quietude dos que sofrem em silêncio é uma condição verdadeiramente atroz…
As duas “soluções” mais comuns para tentar escapar e sobreviver ao(s) agressor(es) acabam por ser, quase sempre, meter baixa médica por incapacidade temporária e/ou mudar de escola assim que seja possível, mas dificilmente será apresentar queixa…
E com isso, os putativos agressores lá continuarão sem sofrer qualquer punição pela sua malvadeza, obviamente crentes e confiantes na própria impunidade…
A prática de “bullying”, sobretudo entre adultos, é a antítese do respeito pela Liberdade Individual e pela Dignidade Humana… E também é a ausência de Solidariedade e de Cidadania…
– Há ou não “bullying” entre Professores?
Sinceramente, gostaria de afirmar que não há, mas duvido que não haja…
Fica uma “corrosiva” metáfora de Padre António Vieira (Sermão aos Peixes), que talvez possa ilustrar a desumanidade vigente em alguns lugares:
“A primeira cousa que me desedifica, peixes, de vós, é que vos comeis uns aos outros.”