O descrédito da gestão das escolas tornou-se estrutural
Limitem-se os mandatos a dois de três anos e recupere-se o caderno eleitoral de 2008 para referendar (e depois eleger directamente) se o órgão de gestão será colegial ou unipessoal.
Apesar da democracia cinquentenária, a gestão das escolas nunca encerrou a possibilidade de poder dinástico, de autocracia e de clima de caudilho. É, a exemplo da falta de professores, um assunto grave e sério que se tornou estrutural.
E se para o poder local, que se pensou ser o derradeiro reduto do caudilhismo, só se legislou as limitações de mandatos em 2005 , o poder escolar desconheceu-a até 2012 e o que se legislou tem má qualidade e nuances surreais. Limitou-se a dois mandatos de quatro anos, mas com uma recondução por mais quatro anos no fim de cada um. Na prática, dois mandatos de oito anos. Agravou-se, porque o caos nos dados curriculares impediu o conhecimento de quem exerceu mandatos como condição de candidatura. E como se contornasse a partir do zero, há inúmeras pessoas que dirigiram escolas durante duas ou três décadas consecutivas (ou até mais). O facto é celebrado com frequência pelo regime, numa amnésia da ética republicana.
Foi, portanto, com perplexidade que se leu a recomendação nº 01/2024, de 3 de Dezembro, do Conselho das Escolas (órgão de directores criado em 2007), que prescreveu para os seus a não limitações de mandatos, a selecção dos professores e a nomeação das lideranças intermédias. Tem a criação de uma carreira de diretor como pano de fundo, numa atmosfera com promessas crescentes de despotismo e arrivismo.
Mas a recomendação revela uma contradição dos interesses corporativos. Numa réstia de sensatez, recomenda que a candidatura ao diretor deixe de exigir a certificação em administração escolar. Depois de duas décadas sem qualquer sinal diferenciador, a certificação transformou-se, em regra, numa área de negócio muito desacreditada junto dos professores. R eduziu o número de candidatos à função e abriu portas a desconhecidas nas comunidades ou com características pessoais e profissionais desaconselhadas para estas responsabilidades. Ou seja, era uma área exposta a desmesuras que agora tem uma crise profunda e disruptiva.
Perguntará, com pasmo, quem lê: como é que se chegou aqui?
Resumidamente, os sucessivos governos deste milénio alienaram-se com o centralismo das decisões e com a desconfiança no exercício do professor. Esse “modelo” consolida-se de um triângulo – associações de dirigentes escolares, confederações de associações de pais e encarregados de educação e conselhos gerais das escolas – que falharam redondamente. Apesar de criadas com pressupostos interessantes de representatividade, a natureza humana e a falta de crítica de massa subordinaram as decisões às máquinas partidárias e à engrenagem anti-professor instalada no ministério e em feudos nas escolas. Os maus resultados não se circunscreveram a este domínio. O péssimo legado inclui queda das aprendizagens, falta de professores, indisciplina nas salas de aula, gestão caótica de dados, burocracia infernal e descrédito da avaliação de profissionais e de alunos.
Urge mudar a gestão escolar, mas com soluções testadas e equilibradas. Limite-se os mandatos a dois de três anos (existiram nessa duração até 2008), não se exija a certificação em administração escolar e recupere-se um caderno eleitoral, à semelhança do que existia até 2008, que refere se o órgão de gestão será colegial ou unipessoal e o eleja diretamente. Além disso, constrói-se um organograma que recupera a gestão de proximidade e assegura a autonomia pedagógica às escolas do pré-escolar e do primeiro ciclo, um órgão de gestão e um conselho pedagógico para cada escola dos restantes ciclos e um conselho operativo municipal da educação.
Em resumo, a história da democracia nas escolas revela a inconsciência e a indiferença de partidos democráticos. O PS e o PSD foram complacentes com a queda. A fragilidade da democracia e a radicalização das eleições passaram também por aí. Altere-se sem tacticismos eleitorais. O futuro demora uma eternidade e a escola desespera pela conjugação dos verbos renovar e inovar que elevará a cooperação e a mobilização.
Paulo Prudêncio
8 comentários
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Que o senhor ministro tome estas palavras a sério. Porque se o fizesse teria um batalhão de professores a agradecer-lhe.
O Rui Cardoso esqueceu se de dizer que este texto é da autoria do Paulo Prudêncio no Público de hoje.
Não se esqueceu.
Está a autoria na última linha.
Antes de 2008 não havia limites de mandatos.
A limitação só existe depois de 2009 (os tais 16 anos)
Muito bem.
E os sindicatos até assobiam para o lado.
Era giro isto evoluir para a contratação de gestores das escolas que nada têm a ver com o ensino. Criar a figura do CEO da escola, com MBA em gestão.
Iriam depois buscar estes ás fileiras dos partidos, personagens que fizeram carreira nas jotasTransformar as escolas em empresas, que é o que o Conselho de Diretores querem fazer.
Podia ser que os que são agora diretores das escolas fossem corridos e assim dava-se provimento ás reinvidicações que o Conselho de Diretores tanto proclama, virava-se o feitiço contra o feiticeiro.
Claro que isto seria péssimo para as escolas e o ensino.
Devia-se regressar ao modelo de gestão e á eleição dos seus orgãos ao modelo anterior ao Sócrates e á ML.
Direção eleita pelos professores e funcionários só!(como era há duas décadas e funcionava muito bem, e era credível)
Conclusão: Não votar no PS nem no PSD+CDS que governam, o Ministério da Educação, desde que foi implantado este modelo de gestão!