1 de Agosto de 2022 archive

O MITO DA UNIDADE DOCENTE – Luís S Braga

(longa meditação individual que partilho com tiver paciência de ler antes de férias)

Hoje tive uma conversa com uma colega que se queixou dessa falta mítica de unidade.
Ora, eu acho que não há falta de unidade nenhuma. Há até muita unidade de visão entre a larga maioria dos docentes: NA PASSIVIDADE.
Há falta de ação, não de unidade.

A mítica greve de 4 dias, que vergava o governo em 3, realmente funcionava. Mas, para isso, era preciso quem a fizesse.
Não duvido que os sindicatos gostavam de a convocar, mas sabem que não teria adesão, que evitasse o nosso ridículo.
Não haveria unidade porque a maioria das escolhas individuais agregadas ia dar nega e não agir. Na minha visão, lamentavelmente.

A PASSIVIDADE É UM MAL GENERALIZADO

Há órgãos para eleger na escola, não se fazem listas.
Há reuniões plenárias para discutir assuntos vários, não se vai lá.
Há petição ou iniciativa legislativa para assinar, os outros que assinem.
Há manifestação, mas tem de ser a hora conveniente.
Alguém lança uma petição, é para os autores darem nas vistas, não para usar mecanismos legais de participação democrática.
Alguém se candidata a um cargo, oportunista.
Alguém exige debate do regulamento interno, que chato…
Consulta pública de documentos legais, o que é isso? Do regulamento interno, para quê? Perda de tempo..
Eleições, para quê ir votar?
Sindicatos? Todos uns vendidos.
A ADD é uma porcaria, mas há que dar boas notas aos avaliados amigos e esgadanhar-se com outros, para ter muito bom e ganhar os 6 mesinhos de avanço na carreira…. “E cada um por si” como me dizia uma muito socialista colega, há dias.
Se a ADD não der o “celente” o sistema é outra vez uma porcaria e “não há solidariedade”.

E nem falemos dos objetivos, que, há uns anos, plenarios largos disseram que não era para entregar, mas, depois, às escondidas, muitos queriam entregar. Para mim um sinal inesquecível do quadro mental da “luta docente”.

ADERIR A UMA GREVE É ATO INDIVIDUAL

A conversa da manhã foi para a greve. A minha colega, que sabe que eu sou cliente das greves, desculpou-se, sem eu perguntar nada do seu absentismo a greves e manifestações: “eu fazia, se todos estivéssemos unidos e fizéssemos todos”.

Se todos esperarem todos, não há greve.

Na verdade, fazer greve e reagir pelos seus interesses profissionais é um ato de escolha e liberdade individual.
Já fiz greve a reuniões de avaliação com meia dúzia de gatos pingados. E o consenso da maioria, muito unida, dos restantes, em tom de traição, foi ir de férias (e a greve estava a funcionar, por isso a desmobilizaram).

Faz estes dias anos que perdemos essa luta por escolhas de alguns, bem unidos contra poucos.

Em muitas escolas, já fui o único, gozado, a requerer coisas que outros achavam mal e inútil, mas que lhes aproveitaram quando tive razão.
Nunca tive problema em estar só a defender o que acho correto.
Por isso, esta conversa da unidade cansa-me muito porque, perante as opções de agir, escolho sempre a unidade da minha consciência individual.

Normalmente faço greve por solidariedade, mesmo quando acho mal a data ou as ideias que se lançam.
E bem me custa, que ganho pouco.

Já fui a manifs de 5 e de 100 mil….
Eu fui e pouco me ralo com o que os outros dizem para se desculparem de não ir.

Antes da unidade mítica, procuro a racionalidade e a escolha individual.

Em termos gerais, pouco me ralo com o que os outros dizem. Fui educado para pensar pela minha cabeça e não me mexer só porque os outros me impõem posições ou por medo da opinião alheia, por mais agressiva e cruel que seja. Resisto, mas não desisto.

Não quero ser maitre à penser de ninguém, nem ando aos pinotes para ser inspirador de ninguém. Já me custa inspirar-me a mim próprio.

Digo o que eu penso e não espero que ninguém concorde. Se concordarem é simpático, se não concordarem, reajo, se me apetecer. Mas argumento, não digo que são traidores ou vendidos ao poder.

Por isso reajo, mesmo ficando com má imagem, quando sofro campanhas negras ou me chamam nomes por dizer o que penso e o que faço, explico e assumo.

Chamarem-me nomes ou ser ofendido, por tomar publicamente uma posição, só tem o efeito de a reforçar, se acreditar nela.
Felizmente a lei protege o meu direito de dizer e de fazer greve, manifestações e até o direito de me defender quando passam os limites nas ofensas

Felizmente que, em Portugal, a lei me permite dizer e agir, dentro dela e sem precisar de ação direta.
E haver um quadro legal democrático é virtude, não defeito. PORTUGAL não é uma ditadura, por muito que muitos medrosos queiram desculpar a sua inacção com isso.

O problema da falta de unidade é desculparmos a nossa falta de iniciativa por haver outros que não a têm e (não) fazermos nada, sempre na busca mítica do alinhamento unitário com os outros.

E posições unitárias têm de ser pactuadas e fruto de discussão, que não é só o lamento de sala de professores (há uma diferença entre unidade e unicidade, conceito que demora a morrer).

Todos os protestos legais e respeitadores da democracia vigente são válidos e eu adiro, ainda que seja o único.

Por isso, em vez do mito da unidade, refúgio da passividade, escondida na desculpa da falta de adesão dos outros, que tal mais energia e reflexão de acção individual?

Ou então não haver desculpas dessas e termos a atitude saudável e transparente de explicar os motivos pessoais da nossa ação ou inacção, sem os buscarmos nos outros?

Uns, unidos, a desculpar-se com os outros é que não…..

 

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A Professora é burra?

 

Numa situação de limite, temos de agir no limite. Foi o que fiz. Considero que não devo temer estar no meu posto de trabalho, nem deveria ser eu a entrar em confronto com um aluno.

A Professora é burra?

Um dia de aulas. O J., um aluno de 16 anos com insucessos repetidos no seu percurso escolar, virou-se para a professora e disse: A Professora é burra?

Naquele dia em Março de 2016, na turma do 9º ano de um percurso alternativo, os alunos deveriam estar a fazer exercícios a pares, mas, na realidade, estavam mesmo a fazer apostas nos jogos de futebol, via telemóvel. No dia-a-dia, na sala de aula, o professor deve sempre perceber quando é que é útil ter um confronto com os alunos.

Naquele dia, considerei que confrontar os alunos não teria utilidade prática e por isso ignorei a situação. No entanto, após a questão colocada pelo J., tive a necessidade de agir. Respondi que não era burra, e que o J. teria de sair. Perante esta minha ordem, o J., um aluno de 1,80 m, recusou sair.  Como é  dos regulamentos, o passo seguinte foi contactar a direção para tirar o aluno da sala. Para meu espanto, fui informada que o Diretor estava ocupado.

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Há Quem Precise De Um Banho De Realidade

Há Quem Precise De Um Banho De Realidade

O assunto até mereceria uma abordagem mais detalhada, mas acho que basta explicar que a classe docente de 2022 é já bastante diferente da de 2008, pelo que é uma ilusão pensar que é possível replicar seja o que for. Se sempre houve divisões, agora há completas incompreensões. Há os que se foram embora e foram muitos, há os que se ajustaram ao “paradigma”, seja da gestão, seja da add, e não são assim tão poucos e há os que, mesmo não sendo muito novos, não viveram muitas coisas e nem sequer compreendem quando delas falamos.

Ainda me lembro de alguém, que passou como cometa blogosférico, com quem ia falando até achar que se tinha transformado numa espécie de porta-voz do então secretário Costa; nessa altura, tentei explicar-lhe que parte do que ele me dizia em favor das posições da tutela eram coisas recuperadas de um passado não tão distante, desde logo a gestão flexível do currículo transformada em autonomia e flexibilidade mas, como em outras questões, a resposta era invariavelmente “isso não é do meu tempo”.
Há muita coisa que já não é do tempo de muita gente e há outras pessoas que, sendo desse tempo, já se “reinventaram”. Por isso, as salas de professores estão divididas de um modo diverso do que já tiveram e em termos globais já não é credível conseguir mobilizações significativas que não sejam mesmo episódicas, bastando ver a gritante falta de solidariedade em questões como a já referida add, a questão da mobilidade ou mesmo a forma como alguns “libertários” se tornaram garantes da legislação, mal apanharam um cadeirão ou gabinete disponível. Basta ver como algumas figuras se acomodaram rapidamente ao poder que está, mesmo aqueles que antes apareciam muito reivindicativos (ocorre-me sempre um grupinho de oportunistas, a começar pelo da vinculação dos contratados).
A realidade já não é o que era e não vale a pena estarmos a lamentar uma inevitabilidade. Estranho é que ainda pareça existir quem não consiga ver o que existe á sua volta. Após sucessivas derrotas e quase nenhuma “vitória”, quanto muito uns quantos empates ou prolongamentos, há quem perceber que tudo deve ser repensado e reavaliado em termos de “lutas” laborais no âmbito da docência. Fazer mais do mesmo é continuar num caminho que nos últimos 15 anos trouxe muito pouco ou mesmo quase nada, excepto umas desregulações e truques concursais que deram jeito a alguns. O resto é a crónica do “sucesso” de uma estratégia que conseguiu ir cansando e dividindo ainda mais a classe docente, na qual houve actores principais, mas também adjuvantes, nem que seja por omissão.
Até surgir algo de novo e eficaz vai ser preciso mais do que a vontade de alguns e não sei se acontecerá no meu tempo útil de profissão, porque a aliança, explícita ou implícita, contra os professores que estavam na carreira e se ergueram em 2008 continua muito forte e foi acarinhando aliados no seu interior entre os que estão sempre disponíveis para colaborar com a política de amesquinhamento dos que não consideram seus “pares” e tudo fazem para se erguer à custa de terceiros.
Deve então desistir-se de qualquer resistência? Não, mas é necessário voltar às bases e tentar que, pelo menos a nível local, a terraplanagem da autonomia profissional não seja completa. Porque não há mais deprimente do que observar como a Corte Costista na Educação se vai replicando à micro-escala das “unidades de gestão”. E é indispensável não criar ilusões e olhar a realidade como ela é e não como já foi ou se gostaria que fosse.

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