Para aqueles que emitem opiniões sobre o concurso de professores, conhecer e exercitar a experiência inteletual chamada “véu de ignorância” pode ser útil para dimensionarem melhor as posições e ponderarem melhor o que dizem ser o justo ou injusto.
Se não soubessem a posição que ocupam no sistema, cujas regras estão a pensar ou sobre o qual emitem opinião (e em abstrato pudessem ter qualquer uma), diriam a mesma coisa de um ponto de vista de justiça ?
Uma das coisas mais fascinantes é ver recém-vinculados que já não se lembram do que é ser contratado ou QA que não se lembram do que é ser QZP ou pessoas em mobilidade interna ou por doença que assumem indiferença pelo resultado para outros dos efeitos das suas situações.
Não estudei Rawls na escola. A sua Teoria da Justiça como equidade é de 1972 (deixei de ter a disciplina de Filosofia em 1989). Li o livro em 1993 na edição da Presença e fez-me impressão. Preencheu uma lacuna da minha ignorância e moldou muito o meu pensamento desde então (eu sei, é contraditório num tipo de esquerda, mas não foi só Rawls que me moldou ideias, as influências são muito diversas).
Comecei a concorrer em 1995 e este raciocínio é essencial na forma como opino sobre as regras de concurso:
– e se fosse eu a sofrer os efeitos negativos das normas que digo “justas”?
– Há margem para tornar mais justo o que tem efeitos negativos? (às vezes não, sem criar maior injustiça para outros que têm tantos direitos como os beneficiados).
Se mais gente fizesse a análise à Rawls o debate era mais saudável.
Até porque a justiça de uma situação não se mede pelo número de beneficiários…..
(E posso dar exemplos, se a indignação levar às habituais explosões de cólera que certas posições, justas, levam os interessados apenas na sua própria utilidade a verbalizar. Mas, para mim, utilitarismo é selvajaria e até oportunismo….opiniões).
Luis Sottomaior Braga
33 comentários
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Ser influenciado por Rawls é contraditório em quem é de esquerda? Não percebeu muito bem o autor, pois não?
Mais do que sua excelência, que, provavelmente é a merda de um professor de Filosofia que nada percebe de filosofia.
Mas dou-lhe bibliografia: https://dergipark.org.tr/tr/download/article-file/86110
Ser influenciado por Rawls não é incompatível com ser de direita ou de esquerda. Em termos políticos, considerando o nosso espectro político, a sua teoria defende primeiramente o princípio da liberdade, grato à direita, mas também defende, de forma subsidiária do primeiro princípio, o princípio da equidade ou das diferenças admissíveis, que admite intervenção do Estado na distribuição de benefícios e obrigações, de forma a dar mais a quem recebeu menos na “lotaria genetica ou social” de forma a garantir que todos têm acesso às mesmas oportunidades. Princípio que será grato à esquerda. Assim, penso que não será incorretos se posicionarmos o autor no centro do nosso espectro político.
Está a tentar dar uma das suas aulinhas acríticas. A dicotomia liberdade/igualdade, nos termos em que é equacionada na cartilha de que se serve, faz sentido à luz de uma apreensão autêntica dos conceitos? A liberdade política que valor tem enquanto liberdade se não se toda a vida do indivíduo é sobredeterminada pelas leis do mercado, ou seja, pelas leis dos mais fortes segundo princípios arbitrários, nomeadamente hereditários. E em que medida é que haver, à partida, um princípio de justiça que interditasse, à partida (o que não acontece, de modo nenhum, graças ao princípio da diferença), situações de exclusão social, põe em causa a liberdade?
Para os liberais, a liberdade é, antes de tudo, a liberdade de exploração dos trabalhadores, da sociedade e da natureza. Debater uma ideia de justiça usando conceitos definidos de um modo faccioso é indigno de uma discussão séria.
Liberdade política é somente um dos aspetos do princípio da liberdade defendido por Rawls. Este princípio afirma que cada pessoa tem o direito a um sistema completo e adequado de liberdades básicas iguais, que são compatíveis com um sistema semelhante de liberdades para todos. Ou seja, todos têm direito às mesmas liberdades fundamentais, como liberdade de expressão, liberdade de consciência, direito à propriedade, e liberdade política.Essas liberdades básicas são consideradas inalienáveis e não podem ser sacrificadas por outros valores sociais ou ganhos económicos. O que desde logo afasta a aplicação de princípios de justiça utilitaristas, também rejeitados pelo autor do artigo. A única justificação para uma restrição a essas liberdades seria se essa restrição resultasse em uma maior proteção ou extensão dessas mesmas liberdades para todos. Somente desta forma o conceito de liberdade defendido por Rawls, na obra citada pelo autor, pode ser intrinsecamente ligado à ideia de igualdade: a liberdade só é legítima se for igualmente distribuída, e as desigualdades sociais e económicas só são aceitáveis se forem em benefício de todos, especialmente dos menos favorecidos. Assim, qualquer tentativa de associar o autor à defesa de qualquer forma de capitalismo só pode resultar ou de má intenção, motivada por qualquer tipo de fundamentalismo político, ou de um total desconhecimento do pensamento do autor. O recurso ao insulto não torna os seus argumentos mais fortes, somente os torna falaciosos e reveladores da sua ignorância.
Caro Ultracongelado, as suas leituras deveriam ir para além dos manuais do 10 ano. Leia, como complemento ao A Theory of Justice, também a obra do Rawls Justice as Fairness: A Restatement. Tire conclusões. Conheça as apreciações críticas. Depois, poderemos conversar sem insultos, com a educação própria de quem está inteirado dos assuntos sobre que se pronuncia.
Mande cumprimentos meus ao Cavalo Mustang.
Se leu a obra que me recomenda, desde já agradeço a amabilidade, deve ter concluído que nela Rawls não muda a sua concepção de justiça, nem a rejeição a princípios de justiça utilitaristas. A reformulação que faz dos princípios da justiça tem o objetivo de tornar sua teoria mais acessível e responder a algumas críticas que resultam de posicionamentos políticos mais extremados , como o que se percebe no fel que destila nos seus posts. No essencial, na obra Justice as Fairness: A Restatement, reafirma que a justiça deve ser entendida como equidade, onde liberdades básicas iguais e a promoção do bem-estar dos menos favorecidos são centrais. Portanto, a sua defesa de uma concepção de liberdade baseada no acesso a um sistema igual de liberdades continua robusta, bem como a rejeição do utilitarismo, portanto também de capitalismo. Não percebo, portanto, que outras conclusões pode ter tirado na leitura que fez da mesma.
Cita Rawls mas o texto é um vazio, mais valia deixar a esferográfica em paz!
Rawls, diz que a igualdade, tão defendida nas democracias modernas socialistas, por exemplo, manuais gratuitos para todos, nem sempre é a melhor solução. A equidade e o princípio da diferença são mais justos. Desta forma, vemos como a filosofia trata de coisas fundamentais e como é essencial para os jovens que vivem no vazio de uma sociedade superficial e imediata.
São Rawls? A Filosofia acrítica que vossa excelência ministra é que não serve a ninguém, excepto ao 1%. É um idiota útil. Encha-se bem com o salário que parasita ao Estado para vender aos alunos apenas um arremedo apintelheirado de filosofia.
Exceptuando o Pedro Silva (um anti socialista inveterado, como se depreende), que parece ter lido Rawls (até escreve que o ouviu – “disse”), meu caro Luís, colega de curso e do métier d’historien, vai ser de difícil entendimento este texto, entre a classe doente, sendo que uma substancial parte desta, poucos ou nenhuns livros leu na vida. Rawls, meu caro Luís, é demais para esta gente. Quanto ao Pedro Silva, Tocqueville? Já lemos? Força!
Terminei este ano o mestrado em ensino mas já tinha tempo de serviço. Ainda fui a concurso e entrei em QA. Fiquei perplexa mas também sei que são zonas onde há realmente falta de professores, escolas com oferta completa e toda uma comunidade normalmente vista como difícil. Por isso, aceito com muita alegria. O que é injusto é os anos de desinvestimento na educação e muitos terem de ter passado anos em angústia. Gostei da reflexão e partilho. Nunca se agradará a gregos e troianos, mas que seja uma maioria substancial a ver alguma justiça.
Ora, se não souber a que parte da sociedade pertenço, irei ter o cuidado de escolher os melhores princípios de justiça. Aqueles que garantem que do mínimo que possa receber eu recebo o máximo possível. É este o objetivo da experiência mental proposta por Rawls. A mesma experiência mental transposta para os nossos concursos permitir-nos-á concluir que somente o respeito pela graduação profissional dos docentes em todas as fases do concurso permitirá que todos tenham garantido que no pior vão receber o melhor possível, independentemente de estarmos a falar de um QA/QE, QZP. A introdução de prioridades diferentes nas diferentes fases do concurso são mecanismos que só geram injustiças. Além disso, não faz qualquer sentido efetivarem professores em vagas de QZP onde os professores são precisos, nomeadamente em Lisboa, Setúbal, Alentejo e Algarve e de seguida, contra tudo que é lógico, oferecer-lhes a possibilidade de concorrerem à mobilidade interna na primeira prioridade, à frente de outros colegas mais graduados. Não é assim que se vai resolver o problema crónico da falta de professores nas referidas regiões.
E já que estamos a propor que se pense o problema do concurso de professores e da falta grave de professores a coberto de um véu de ignorância, não faz qualquer sentido admitir qualquer tipo de mobilidade, uma vez que quando concorro para uma determinada vaga, QZP ou QA/QE, estou a assumir que tenho condição para trabalhar efetivamente nessa zona pedagógica ou quadro de escola. A mobilidade interna só fará sentido para atribuir uma escola a professores QA/QE que tenham ficado sem horário na escola de provimento e os professores de QZP no quadro de provimento. Mesmo a MPD só faria sentido em situações em que a justificação tivesse atestadamente ocorrido depois do concurso interno.
Mas é isto que nós desejamos? Está será certamente outra questão.
Para mim a grande injustiça é não se respeitar a graduação na MI! Fiquei QA na escolha mais distante do meu QZP e vejo agora colegas com menor graduação que efetivaram em QZP em Lisboa e Alentejo a obterem colocação à porta de casa (norte) e eu não consegui aproximar. Acho que a próxima luta deve envolver esta questão do respeito pela graduação em todas as fases do concurso.
eu por eu, conheço colegas que metem baixa psicológica quando estão longe de casa, e assim que ficam perto, ficam temporariamente curados…
Também já tenho ouvido falar de casos assim, inclusive a durar anos. Não sei como é que o fazem, mas fazem-no. Na minha situação, não poderia ter ficado mais perto (pelo menos este ano, porque no próximo deverei mudar de casa – mas adiante), mas a distância não é tudo na vida. Pelo menos, para mim.
À Eminência Parda RF, ungido da inteligência, em virtude da natureza dos seus comentários e usando a sua linguagem insultuosa, sempre se cruza com alguém cuja opinião não partilha:
– V. Exa. é uma besta! V. Exa, é uma besta, com a altivez típica de um dejeto!
Já me pôs um sorriso nos lábios… Percebo que o Cavalo Mustang está a precisar de ser montado, mas não conte comigo, que eu não sou dado a essas coisas.
Continue a chafurdar na lama, mas enchafurde-se sozinho. Cheira menos mal.
Apesar de me atribuir altos dotes de inteligência, admito, com humildade e compunção no coração, que não alcancei o sentido dos altos voos das suas palavras. Mas não me responda: imponho-me como punição pela minha soberba luciferiana procurar responder à questão que me deixou implicitamente: porque é que quando alguém se chafurda na lama sozinho cheira menos mal do que acompanhado? Vou tentar chegar à compreensão, embora me pareça um daqueles inatingíveis paradoxos zen.
Hmm… Nem todos os quadros de escola ocupam cargos (além de DT, que acaba por nos calhar a todos, numa ou noutra altura, claro, forte chatice). Claro que imagino que também depende da dimensão do agrupamento… O que eu sei é que fui útil por lá, isso sem sombra de dúvidas. Agora, agora nem sei. Faltam-me menos de 5 anos para a reforma, mais justo seria (ainda que debatível) deixarem-me levar o meu papel até ao fim.
Colega Ultracongelado…
A tradição marxista fornece um quadro económico, político e filosófico complexo, denso, dinâmico. Visto a partir dela, Rawls não passa de um medíocre pensador burguês (ah, Harvard), cuja teoria não passa de um peido infantil, mas que, por isso mesmo, é muito apreciada pelos peidófilos da filosofia analítica. O colega já se interrogou poeque é que nas Aprendizagens Essenciais o pensamento marxista é ignorado, mas aparecem Sandel e Nozick como obrigatórios?
Aqui fica uma entrevista que lhe recomendo:
https://jacobin.com/2020/10/john-rawls-liberalism-political-philosophy-conservative-age
Porque estão pensadas, e bem, para estimular o pensamento crítico e ajudar a que os jovens alunos formem o seu pensamento sem os doutrinar. É claro que há outros autores e outras visões diferentes, mas neste aspeto, parece-me bem, uma vez que é abordada uma visão social democrata (digo eu) sobre os princípios de justiça de uma sociedade justa, Rawls, uma visão de direita, Nozick, e uma visão de esquerda, Sandel. Convidando o aluno (no ideal) a formar a sua própria teoria, tomando como referência as perspectivas estudadas. No ideal também, estimular a sua curiosidade para outras teorias.
O Sandel (Harvard, novamente!) é de esquerda? De esquerda a sério? Ou mero centro: tal como Rawls? E temos o Nozick, um anarcocapitalista. Não é ignorando a mais importante tradição de pensamento crítica do capitalismo e dando apenas três perspectivas capitalistas (uma ultraliberal e duas convencionais) que se estimula o pensamento crítico. Mas não vale a pena prosseguir a conversa. Já vi o que há desse lado. É por estas e por outras que não vale a pena simular o diálogo: o insulto soez é mais honesto. Boas aulinhas.
Vou usar uma analogia, já não para seu proveito, mas para quem por aqui passar com algum interesse na questão.
Imagine-se que, em vez de se estar a discutir um modelo de justiça distributiva, tendo como horizonte histórico e teórico o capitalismo, se estava a discutir o modelo económico esclavagista. O Ultracongelado, um professor de excelência, estaria na equipa de elaboração das AE de Filosofia. A sociedade em que vive o Ultracongelado é uma sociedade esclavagista. Há movimentos sociais e revoltas contra contra o sistema esclavagista. As elites discutem a justiça do esclavagismo. Existem teorias que propõem uma sociedade sem senhores e escravos, mostrando, a partir de análises das condições históricas, a razão de ser do esclavagismo e a necessidade (pelo menos moral, se não mesmo material) da sua superação. Claro que há outras teorias, todas elas esclavagistas, umas mais radicais e outras mais moderadas. O Exmo. Doutor Ultracongelado diz aos seus colegas de equipa das AE: “Eh, pá! Estive para aqui a pensar e cheguei à conclusão de que só devemos contemplar três teorias para considerar verdadeira, autentica e orgasticamente o tema em termos críticos, sem andarmos a endoutrinar os alunos — Foda-se! Tudo menos isso. As teorias são o esclavagismo do Rewls, o ultra-esclavagismo do Nezick e o esclavagismo anti-meritocrático do Sendel.”
Chomsky explica no início deste vídeo a razão pela qual, em termos de filosofia política, Rawls não permite um pensamento radical (isto é, verdadeiramente filosófico): https://youtu.be/E6Cqi_W8PmI?si=Sk700hAexN9QOjMZ
Mas isto que importa, se o que importa para gente como o Ultracongelado é incutir nas massas estudantis que não há alternativa possível à dominação capitalista?
Se leu com olhos de ler do meu post sobre as Aprendizagens Essenciais de Filosofia e a apresentação proposta do problema da justiça, pode apenas concluir que o meu interesse e ajudar a que os alunos possam desenvolver livremente o seu pensamento, seja ele qual for a respeito do problema.
A leitura dos seus posts permite concluir com prioridade que está empenhado em impingir uma ideologia com recurso a leituras enviesadas de teorias e de posts e ao insulto arrogante. Perdi, portanto, demasiado tempo consigo.
Ora, a entrevista que recomenda vem dar força à minha classificação (rotulação e os rótulos falham muitas vezes) de social democrata. Liberalista no 1° princípio, socialista no segundo princípio. Como o segundo princípio é subsidiario do primeiro, também aceitável a classificação de liberalista moderado, mas nunca de capitalista.
“Rawls’s philosophy was often seen as a product of Lyndon B. Johnson’s Great Society, but his political vision had origins in earlier debates — about planning, welfare, Keynesian stabilization, and pluralism — and in his engagement with the right wing of the British Labour Party, and their redefinition of socialism as the search for equality and social justice. Rawls was initially skeptical of government intervention and political control of the economy, but he gradually came to see that more state action would be necessary to secure distributive justice. He became more optimistic about the future of liberalism.”
“As politics moved to the right, Rawls’s theory was consolidated as the paradigmatic left-liberalism, a survivor from the mid-century — even though in that earlier period his ideas had a different political meaning to the one they later acquired.”