5 de Outubro de 2024 archive

Lista Colorida – RR6

Lista Colorida atualizada com colocados e retirados da RR6.

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Houve qualquer coisa de Ensaio sobre a cegueira no processo dos professores – Paulo Prudêncio

Houve qualquer coisa de Ensaio sobre a cegueira no processo dos professores

Por que foi que cegámos, Não sei, talvez um dia se chegue a conhecer a razão, Queres que te diga o que penso, Diz, Penso que não cegámos, penso que estamos cegos, Cegos que vêem, Cegos que, vendo, não vêem”, escreveu José Saramago na última página do Ensaio sobre a Cegueira. Pois bem, o longo processo que nos levou à falta estrutural de professores deu sinais de cegueira, de uma cegueira que, vendo, teimava em não querer ver. Agora, o grande desafio é ver o passado, reverter as mudanças que nos empurraram até aqui e seguir pelo universo das incertezas.

E se na Cegueira das bolhas política e mediática já ninguém vê como alarmista o discurso que via, há quase duas décadas, as consequências da desvalorização do estatuto socioeconómico dos professores e da desautorização do seu exercício, também ninguém se pode queixar de falta de tempo e de espaço legislativos. Nesse período, Portugal viveu com governos de maioria parlamentar.

Se os governos de José Sócrates (2005 e 2009) aplicaram “cegamente” os quatro eixos da “batalha entre todos” que adoeceu milhares de professores (carreira, farsa avaliativa, gestão autocrática e burocracia como inferno de desconfiança), o de Passos Coelho (2011) cortou “cegamente” (horários dos professores ao minuto e com mais turmas, mega-agrupamentos de escolas, cortes curriculares e mais alunos por turma) e provocou o maior “despedimento” colectivo em Portugal: 27.941 professores (Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência: de 141.452 em 2010/2011 para 113.511 em 2015/2016). Os governos de António Costa (2015, 2019 e 2022), os dois primeiros com o ministro da educação com mais anos na pasta nos 50 anos de democracia, nada viam das mudanças fatais, mas viam a não recuperação do tempo de serviço e “cegavam” com inutilidades informacionais e curriculares.

Mas, questionará o leitor, não houve diferenças nesse pacto “cego” de regime para a proletarização dos professores? Houve diferenças, claro que houve. Mas em indicadores tecnocráticos menos determinantes para a crise vigente: avaliação externa das aprendizagens, rankings de escolas e duas exorbitâncias curriculares com tiques dos totalitarismos do século XX: à direita o “ler, escrever e contar” e à esquerda os inúmeros projectos político-ideológicos não disciplinares mais reconhecidos do que o exercício lectivo.

Aliás, inscrever proletarização e século XX requer que se repita o óbvio: não se proletariza grupos numerosos sem a cumplicidade de nomenclaturas. E a cegueira na educação portuguesa ancorou-se numa casta subserviente com os superiores hierárquicos e, em regra, distante da sala de aula. Instalada no ministério e nas escolas, criou o infernal clima escolar enquanto anunciava excesso de trabalho e insubstitualidade. Essa tragédia atemorizou governantes menos preparados, com um lado cómico retratado na célebre sitcom britânica “Yes Minister” emitida também na RTP1.

Sair daqui, num tempo de aumento brutal das desigualdades educativas, é um gigantesco desafio para a sociedade. O imperativo constitucional do acesso ao ensino pressupõe a existência de professores e sabe-se que nesta década já não se formarão os necessários. Na verdade, haverá o risco de queda em visões simplistas que não distingam o intemporal do circunstancial.

É, por isso, fundamental que se conheçam os desesperos em debate no Ocidente: menos dias de aulas por semana, menos horas diárias na escola, turmas para 60 alunos, eliminação de disciplinas, certificação acelerada de professores, mono-docência (modelo do 1º ciclo) para a totalidade do ensino não superior coadjuvada por máquinas e conteúdos digitais e, em negócios mais radicais, substituição literal de professores por máquinas.

Além disso, e para além de se apelar a professores com mais de 65 anos de idade ou a bolseiros de investigação, o caminho será cativar os que estão em funções, tentar recuperar os milhares de desistentes e concretizar programas de atractividade do exercício.

Mas não chega. É crucial oxigenar o clima escolar, mas sem as habituais alterações que deixam imutável o essencial que se identificou. Para que dentro de uns anos se vejam resultados positivos, exige-se que se reconheça a escola, essa notável invenção, como uma realidade social. A sua intemporalidade assenta num somatório de triângulos com dificuldades e complexidades crescentes: que cooperam, que nunca contendem entre si e que têm como vértices o professor, os seus alunos e os mediadores da relação: conhecimentos, destrezas, valores, atitudes e tecnologias. Assumi-lo é a melhor forma de enfrentar incertezas e nomenclaturas.

Acima de tudo, conclua-se que a cegueira abriu as portas à prevalência dos agentes do mal. Não há muitas formas mais óbvias para o descrever. Reverta-se com humildade. É um tempo grave e complexo, que convoca uma visão para além dos muros das escolas. Martin Wolf (2023:XIV), em a “A Crise do Capitalismo Democrático”, ilumina o cenário: “Os seres humanos separam naturalmente as pessoas entre aquelas que pertencem à “sua” tribo e as de fora. Massacram alegremente estas últimas. Sempre fizeram isso. Nunca tomei a paz, a estabilidade ou a liberdade como garantidas, e considero insensatos os que assim o fazem.” Aliás, o recente relatório Draghi eleva dois vocábulos essenciais à humanidade, à escola e ao futuro da Europa: comum e partilha.

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E Pela Madrugada Recebi da DGAE Mensagem do Dia do Professor

Acho que foi a primeira vez que alguma estrutura do Ministério da Educação se lembrou disto.

Porque até aqui eram apenas mensagens  dos Sindicatos, dos blogs e das Editoras.

 

 

Download do documento (PDF, Unknown)

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A hora do jantar: o ritual esquecido na educação das crianças

 

Já é noite, e lá fora a trémula luz dos candeeiros preenche as ruas vazias. Dentro de casa, um cenário repetido em tantos lares portugueses: pais exauridos a tentar coordenar a rotina do jantar com um olho no fogão e outro no telemóvel, o maldito telemóvel.
As crianças, dispersas, dividem a atenção entre o tablet, o telemóvel, o outro telemóvel, o computador e a televisão mais as diatribes entre irmãos.
O jantar, pronto, rápido e prático, é para deglutir, nem por isso para saborear e tantas vezes sem alimentar, apenas encher e em seguida desfalecer.
Ao menos mastiga.
Na corrida desenfreada desta vida, o momento da refeição foi transformado num mero requisito, um ritual banal a fazer as vezes do espaço de encontro, equilíbrio e construção de identidade tão importante para a criança defronte de nós, não só à mesa mas do lado de lá do espelho.
Ou já se esqueceram?
Já se esqueceram.
E ao olvidar adicionar a pressa diária do “Come e está calado” mais o “Come e não me chateies” ou então “Come e vai para a cama” ou então “toma lá o telemóvel e não me chateies” entre a negligência e o abuso emocional, aliás o prato diário de tantos sentados à mesa e por isso sentados no sofá e já agora a comer com as mãos.
Já não sei qual o sentido de um garfo e alguém explique às crianças o porquê de uma faca ou colher e a façanha de saber usar talheres.
Diante deste cenário é de surpreender a surpresa dos pais mais o impacto no comportamento e saúde das crianças.
Não se trata apenas de nutrientes ou calorias. Um jantar equilibrado é, antes de mais, uma oportunidade para ensinar, para educar, para criar rituais de presença e comer não é somente a ingestão e por favor mastiga mas o convívio e o relacionamento aos quais se junta a experiência e a destrinça dos sabores e da variedade de alimentos, a partilha, a escuta e aprende a esperar, a esperar a tua vez e ninguém te disse para saíres da mesa e “Ó Alberto diz alguma coisa ao teu filho” mas o Alberto já não diz nada, o Alberto desistiu há muitos anos e o filho faz quanto quer.
O filho tem 10 anos e pesa 50 quilos.
E não, não está na escola mas nas famílias a reaprendizagem de um momento, e dos momentos, em família, muito depois de a escola fechar as portas.
É verdade, estamos exaustos, o ritmo de trabalho é avassalador, os horários imprevisíveis, as exigências de produtividade sem fim e o tempo de estar à mesa não é a soma dos alimentos no prato mas a qualidade dos diálogos, as perguntas e as respostas e o tempo de dizer aos pais para dizerem aos filhos “Estou aqui e tu és importante”.
Um jantar equilibrado não precisa de ser uma epopeia gastronómica de pratos exóticos ou desafios culinários e o suficiente é o básico bem feito: legumes frescos, carne ou peixe, hidratos capazes de sustentar e de preferência integrais sem esquecer o mais importante e o mais importante é a companhia e a companhia não está do lado de lá de um telemóvel enquanto se partilham as peripécias do dia.
A alimentação nutre a relação familiar, molda a forma como encaramos o dia-a-dia e ensina-nos a parar.
Quantas memórias da infância se prendem a sabores e cheiros os quais, na simplicidade dos ingredientes, carregam a riqueza dos afectos?
Este é o legado perdido e sem querer roubado às crianças a troco de nada, a troco da distância, da ausência e solidão das vidas por preencher na pressa de cumprir horários em nome da eficiência.
Assim, o desafio é este: resgatar o jantar do automatismo. Transformá-lo num momento de pausa e de cuidado, sem desculpas nem pretensões.
Em nome de uma refeição para além da pirâmide alimentar num acto de resistência ao caos e à pressa, na certeza de estarmos presentes, à mesa e na vida.

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