Antes de ti
havia terra
Havia o odor inebriante das folhas de eucalipto
O rosmaninho selvagem
A caruma quente do pinheiro
A brisa cantada dos grilos
O vôo furtivo dos falcões
O piar doce do pintassilgo
Havia tudo isso e muito mais
Chegaste, então, súbito,
como um raio ou um trovão,
um clarão devastador
uma língua de fogo
(talvez alguém te tenha dado vida enquanto sorria)
E varreste de labaredas a terra
Entraste pelo ecrã televisivo adentro
invadiste as redes sociais
Um espanto um assombro de comoção incrédula – este é o meu país?
Mas, entre a parede de fogo
a muralha de fumo
Ergue-se um homem
uma mangueira
tantos litros de água, lágrimas, desespero
Ao fundo desvanece-se
o choro de um cão
o grito fino de uma mulher desgrenhada
a tosse asfixiante da cólera
Entre a parede de fogo
a muralha de fumo
Ergue-se um homem
uma mangueira
desejando regressar
vivo
a casa
Indiferente, o país prossegue ardendo
Como todos os verões.