A insanidade chegou sob a forma de “Roteiros”…

Com a publicação dos denominados “Roteiros”, no âmbito do Plano de Recuperação das Aprendizagens 21/23 Escola+, prevê-se um Ano Lectivo de 2021/2022 verdadeiramente esquizofrénico, insano e delirante…

 Dada a naupatia e a “mareação” sentidas logo no início da leitura, confesso que não tive a “coragem” nem a disponibilidade mental necessárias  para analisar detalhadamente as mais de 300 páginas dos 6 Roteiros, se incluirmos os respectivos Anexos, mas pelo que já li parece que estamos perante um prodigioso exercício de imaginação e de criatividade ou de um devaneio onírico, de quem não conhece a realidade, nem faz a menor ideia do que é o dia-a-dia numa escola…

 O próximo Ano Lectivo promete, assim, transformar as escolas em cenários de uma Saga, com muitos episódios de ficção científica, com destaque previsível para muitos e variados efeitos especiais…

 Plagiando Lauro António: “Let´s look at the trailer” ou, se se preferir, a versão caricatural de Lauro Dérmio: “Letz luq ate de treila”

“trailer” deste filme, consubstanciado pelos já mencionados Roteiros, foi apresentado há poucos dias… E se a principal função de um “trailer” é aguçar a curiosidade e o interesse pelo visionamento de determinado filme, no caso presente, deixou-me sem qualquer vontade de o ver, muito menos de participar nele, seja como Personagem ou como Adereço…  

 O sucesso de um filme está quase sempre dependente da qualidade do respectivo Argumento… Ora o Argumento deste filme, de Roteiro em Roteiro, parece um estafado “remake” de um filme já visto nos Anos 80 e 90, com cenas repetitivas e fastidiosas levadas até à exaustão e com uma linguagem obtusa, camuflada de “linguagem técnica”, típica de quem ainda não percebeu que um bom Argumento deve ter uma linguagem simples e cognoscível…

E, na verdade, não sei se o género deste filme deva ser considerado como Comédia, Drama, Terror ou Non Sense

 Em 2 de Abril de 2021, a propósito da criação pelo Ministério da Educação de uma Equipa de Trabalho sobre Recuperação das Aprendizagens Perdidas, escrevi o seguinte:

Como previsivelmente acontecerá, atulhar as escolas, os alunos e os profissionais que nelas trabalham com mais projectos e programas irrealistas e artificiais, concebidos à custa de enquadramentos teóricos impossíveis de concretizar em termos práticos e feitos à medida de quem não faz a mínima ideia do que é o dia-a-dia numa escola, não parece ser nem sensato nem consequente… A auto-flagelação, os episódios folclóricos e a demagogia na Educação parecem estar a agigantar-se…

 Lamentavelmente, parece que os Roteiros agora conhecidos confirmam essas expectativas negativas e que, no próximo Ano Lectivo, a entropia irá adensar-se dentro de cada escola, assim como o frenesim por Projectos, traduzidos, quase sempre, pelo gasto de improfícuas resmas de papel e pelo dispêndio de muitas horas de trabalho insano…  

 Sem qualquer subtileza, das duas uma: ou os referidos Roteiros não são para levar a sério e, nesse caso, não se compreende a sua publicação, tornando-se a mesma ridícula e risível; ou se são para levar a sério, fica-se incrédulo e atordoado perante o alheamento da realidade e a incapacidade prática, ao nível da sua concepção…

 Se forem para levar a sério, no sentido da sua execução, custe o que custar, restarão, talvez, estas alternativas aos profissionais de educação: ou fazem de conta que acreditam na palavra dos “Evangelhos” e simulam que praticam o que está estipulado nos mesmos; ou fingem a sua total incompetência/ignorância para conseguir aplicar o preconizado nos “Evangelhos”; ou recorrem à estratégia da tanatose que, basicamente, consiste em “fazerem-se de mortos”, com o intuito de enganar os “predadores”, evitando que estes últimos se interessem por si…

 As mais de 300 páginas dos mencionados Roteiros, poderiam reduzir-se a apenas uma linha de texto, materializada numa única medida que, por certo, seria muito mais eficaz em termos da recuperação de eventuais aprendizagens perdidas:

 – Mandar reduzir drasticamente o número de alunos por turma…

 Tão simples quanto isso, sem floreados e sem sobrecarga de adornos linguísticos…

 Mas como por cá tudo o que é simples não é bom, continuamos presos ao atavismo do “quanto mais difícil, melhor”… E o lema parece ser: Complique-se o mais possível!

 (Esta crítica sarcástica visa Políticas Educativas e não Pessoas em si mesmas…).

 

(Matilde)

 

 

 

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9 comentários

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  1. Sem dúvida uma excelente visão do estado em que se encontra a Educação em Portugal.
    Parabéns colega pela análise que fez dos tais “Roteiros”. Espero não ter de me consumir muito com esse filme.
    Gostei e confesso que me fartei de rir com a sua análise.
    Abraço.

    • MARIA! on 21 de Julho de 2021 at 12:03
    • Responder

    Muito bom!

    • F.S. on 21 de Julho de 2021 at 12:49
    • Responder

    Excelente análise, concordo inteiramente! A solução, afinal, seria tão simples!!!!

    • João on 21 de Julho de 2021 at 14:47
    • Responder

    Na muche. Obrigado por traduzir em palavras simples e certeiras , o que muitos pensarão.

    • Pirilau on 21 de Julho de 2021 at 15:05
    • Responder

    Repito o meu comentário de 17 de julho, quando foram postados os tais roteiros neste blog:

    Depois do acto masoquista que consiste na leitura de tantos roteiros para o abismo, apenas me apetece dizer o seguinte: internem estes loucos urgentemente!

    • maria on 21 de Julho de 2021 at 19:46
    • Responder

    E preparem-se também para a implementação do PADDE – Plano de Ação para o Desenvolvimento Digital das Escolas…

    • Alecrom on 21 de Julho de 2021 at 19:53
    • Responder

    Conheço vários desses projetos geringonços que são apresentados como jóias da coroa, mas que na verdade são calcanhares de Aquiles dos respetivos agrupamentos.
    Projetos que se esgotam em si próprios, exclusivos e sem qualquer contributo significativo para a esmagadora maioria dos alunos.
    Nas atas surge tudo muito bonito, articulado, transversal… enfim, um sucesso. Nas salas de professores e nas reuniões sem bufos (muitas vezes reuniões dos próprios projetos) chega a ser constrangedora a forma até sarcástica como praticamente todos se referem… ao sucesso.
    As nossas escolas vão apodrecendo.

    • Mário Rodrigues on 21 de Julho de 2021 at 20:28
    • Responder

    Cara Matilde

    Cabe no livre exercício das liberdades cívicas, achar que politicamente esta gente é uma corja e um bando de de incompetentes!

    Isto é uma apreciação meramente cívico-política, portanto insindicável para efeitos disciplinares ou penais!

    E porque assim é, até deixo o meu nome completo, para poupar os visados ao trabalho de me identificarem, caso sonhem em processar-me, o que muito me honraria!

    Mário Rui Simões Rodrigues

      • Filipe Lima Soares on 21 de Julho de 2021 at 22:47
      • Responder

      Excelentíssimo senhor doutor Mário Rui Simões Rodrigues,
      com a mesma, elogiável, frontalidade com que se identificou, gostaria que nós dissesse há quantos anos (décadas?) não entra numa sala de aula, de uma escola do ensino não superior (as visitas não contam!)…?

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