Uma das crianças em causa foi meu aluno. Um miúdo dedicado, responsável acima dos miúdos da sua idade, educado, trabalhador, interessado… uma criança que enche uma sala de aula.
Nos tempo de pandemia chegava às aulas por videoconferência meia hora antes da aula começar, por aí se pode ver a dedicação desta criança.
Ao ler esta notícia a revolta instala-se. Como é possível? Qual é a razão, para que um medicamento que lhe pode melhorar a qualidade de vida, ser recusado?
Gastam-se milhões em medicamentos todos os dias. Há uma investigação em curso pela administração de medicamentos, que no mínimo cheira a duvidosa, e estas duas crianças veem a sua qualidade de vida negada. Revolta é-o mínimo que se pode sentir.
O Infarmed autorizou o uso de um fármaco inovador nos hospitais em fevereiro deste ano. Uma especialista em doenças raras, do CHUC, prescreveu-o a dois doentes, de 13 e 14 anos, mas o conselho de administração recusou, justificando a decisão com base num protocolo aprovado a posteriori, que define que só médicos do centro de referência o podem fazer. A médica já não faz parte do centro. Os familiares das crianças sentem-se “discriminados”. O advogado da médica diz que “é o assédio levado ao extremo”. O hospital não respondeu ao DN.
As pressas dão nisto e um despacho mal feito e à pressa não dura mais do que um dia, e ainda bem que assim foi.
Como quando era ministro, Pedro Nuno Santos tem pressa para que se defina a localização do novo aeroporto. “Quero que se encerre este capítulo de uma vez e que avancemos para as obras”, diz o agora candidato à liderança do PS. “Estamos a perder demasiado tempo, custa-me que nós arrastemos os pés neste dossiê como noutros.”
Com a publicação do estudo PISA 2022, onde a larga maioria dos países têm vindo a adoptar um sistema mais facilitista no currículo dos alunos (o visível e o oculto) tem vindo a ter resultados mais fracos, espero que não fique esquecido dos programas eleitorais o que os vários partidos pensam sobre esta matéria.
Até hoje só podemos conhecer o eventual programa do PS que deverá dar continuidade (com ou sem João Costa) a esta simplificação do currículo e à reduzida exigência nas aprendizagens dos alunos (pelo menos aquela que mais importa).
Recordo-me que antes de Passos Coelho formar o primeiro governo apareceu Nuno Crato com um discurso de querer aumentar a exigência dos currículos e da avaliação, criando as provas finais de 4.º e 6.º ano com um peso na avaliação dos alunos, que na altura foi bem vista pela classe docente.
Agora não existe qualquer pensamento da oposição nesta área, o que é pena.
Se a Finlândia e a Holanda tem caído a pique nestes estudos, a Suécia não fica muito atrás e são estes os modelos que são tidos como exemplos para as políticas portuguesas.
Estes países começam a perceber o erro que têm cometido e já começam a voltar atrás em algumas decisões tomadas, nomeadamente com o fim dos manuais digitais.
Mas por cá ainda se quer experimentar o mesmo erro.
E para completar mais este artigo nada como ler a opinião do Paulo Guinote aqui.
O Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) voltou a analisar os conhecimentos de alunos de todo o mundo e o retrato do desempenho dos estudantes releva “uma quebra sem precedentes”, em que Portugal não foi exceção.
Os alunos portugueses de 15 anos pioraram os seus desempenhos nos testes internacionais de Matemática e Leitura do PISA de 2022, invertendo a tendência de melhoria que se vinha registando na última década.
O Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) voltou a analisar os conhecimentos a Matemática, Leitura e Ciência de alunos de todo o mundo – em 2022 participaram cerca de 690 mil alunos de 81 países e economias – e o retrato do desempenho dos estudantes releva “uma quebra sem precedentes”, em que Portugal não foi exceção.
Os quase sete mil alunos de 224 escolas portuguesas que realizaram as provas de 2022 obtiveram piores resultados do que os seus colegas em 2018, colocando Portugal entre os países que mais baixaram de pontuação a Matemática, refere o relatório da OCDE hoje divulgado.
“Em comparação com 2018, o desempenho médio caiu dez pontos de pontuação em Leitura e quase 15 pontos de pontuação em Matemática, o que equivale a três quartos de um ano de aprendizagem”, sublinha Mathias Cornmann, secretário-geral da OCDE, no texto introdutório do relatório.
Em Portugal, os resultados dos alunos foram ainda mais graves: Os estudantes obtiveram 472 pontos a Matemática, ou seja, menos 20,6 pontos do que nas provas realizadas em 2018. Já em comparação com os resultados nas provas de 2012, desceram 14,6 pontos.
Portugal surge assim na lista dos 19 países que baixaram mais de 20 pontos a Matemática, sendo que as notas desceram entre os alunos mais carenciados, mas também entre os mais privilegiados.
Três em cada dez alunos não conseguiram demonstrar ter conhecimentos mínimos a Matemática, ou seja, não atingiram o nível dois numa escala de seis valores.
Apenas 7% dos estudantes portugueses se destacaram, atingindo os níveis de proficiência mais elevados (5 e 6) a Matemática, uma disciplina que voltou a ser dominada por seis países asiáticos.
Em Singapura, 41% dos estudantes demonstrou conhecimentos bastante elevados, assim como 32% dos estudantes de Taiwan.
Seguiram-se os alunos de Macau e China (29% com muito bons resultados), Hong Kong (27%), Japão (23%) e Coreia (23%).
A condição socioeconómica é um dos fatores que mais influencia os resultados académicos e, em Portugal, os estudantes portugueses de famílias mais privilegiadas tiveram uma pontuação média de 522 pontos, ou seja, 101 pontos acima da média dos alunos mais carenciados.
Esta diferença de resultados não se afasta muito da média dos países da OCDE (93 pontos), segundo o estudo hoje divulgado, que procurou os casos de sucesso entre os mais carenciados.
Em Portugal, cerca de 9% dos estudantes desfavorecidos conseguiram estar entre os melhores alunos a Matemática, sendo a média da OCDE de 10%.
Apesar de o PISA de 2022 estar mais focado no retrato dos conhecimentos a Matemática, também foi feita uma prova de Leitura e, mais uma vez, os resultados médios pioraram: Os estudantes portugueses obtiveram 477 pontos, o que representa uma descida de 15,2 pontos em relação a 2018 e de 12,8 pontos face a 2012.
Apesar da descida, 77% dos alunos portugueses conseguiram atingir, pelo menos, o nível dois, ficando acima da média da OCDE (74%). Este resultado significa que estes jovens conseguem, pelo menos, identificar as ideias principais num texto de extensão moderada, encontrar informação e refletir sobre o propósito e a forma de um texto.
Apenas 5% dos portugueses conseguiram obter um nível 5 ou 6 em Leitura (7% é a média da OCDE), um nível que já implica ser capaz de compreender textos bastante longos, lidar bem com conceitos abstratos e conseguir estabelecer distinções entre um facto e uma opinião.
Já na prova de Ciências, Portugal surge como um caso de sucesso, ao contrariar a tendência de agravamento dos resultados: Em 2022, obtiveram 484 pontos, apenas menos 7,3 pontos do que em 2018 e do que em 2012.
O relatório indica que 78% dos alunos conseguiram ter, pelo menos, nível dois (OCDE é 76%). Entre estes, 5% tiveram desempenhos muito bons (nível 5 e 6), mostrando ser capazes de aplicar de forma criativa e autónoma os seus conhecimentos de ciência numa variedade de situações.
Numa comparação entre sexos, os rapazes portugueses voltam a ser melhores a Matemática (mais 11 pontos) e as raparigas a Leitura (mais 21 pontos).
No texto introdutório do relatório, Mathias Cornmann alertou que “um em cada quatro jovens de 15 anos é atualmente considerado como tendo um fraco desempenho em Matemática, Leitura e Ciências, em média, nos países da OCDE”.
Em entrevista à Renascença, o ministro da Educação admitiu ser possível a recuperação total do tempo de serviço dos professores. Mário Nogueira desvaloriza as declarações do ministro e diz que é a campanha a falar.
Na hora do adeus João Costa, o ainda ministro da Educação admite ser possível a recuperação total do tempo de serviço pedido há muito pelos docentes.
Em entrevista àRenascença, João Costa explica que houve muitos imprevistos que impediram que tal fosse assumido, mas admite que com Pedro Nuno Santos, candidato à liderança do Partido Socialista, essa recuperação pode ser possível.
Na reação, Mário Nogueira da Fenprof diz que é a campanha a falar embora o discurso seja o mesmo de sempre.
“As eleições fazem milagres ou pelo menos aparentam fazer milagres. O ministro acaba por dizer aquilo que sempre disse quando pretendia que a luta dos professores acabasse ou pelo menos atenuasse, ele dizia que a reivindicação era justa”, diz o dirigente sindical.
Para Mário Nogueira o que era “necessário era que houvesse condições para a satisfazer”.
Além da recuperação do tempo de serviço, os professores reivindicam melhores condições para a carreira e um investimento nas infraestruturas escolares.
Como vai ser operacionalizado?
Já a CONFAP (Confederação Nacional das Associações de Pais) diz ser necessário perceber como será possível operacionalizar esta recuperação do tempo de serviço.
Em declarações àRenascença, Mariana Carvalho, assinala que “ainda temos que tentar perceber exatamente o que é que está aqui descrito”, destacando, no entanto, que o Ministério da Educação sempre disse que “estava a trabalhar na aproximação daquilo que eram os pedidos ou exigências dos professores, nomeadamente a recuperação do tempo de serviço que não era possível a totalidade no imediato, mas que se ia trabalhar numa aproximação”.
“O que devemos focar é como vamos operacionalizar, como é que vamos chegar efetivamente à aproximação daquilo que são as vontades de todos os lados”, acrescenta.
Além da recuperação do tempo de serviço, os professores reivindicam melhores condições para a carreira e um investimento nas infraestruturas escolares.
João Costa reconhece que, durante a legislatura, foram assumidas outras prioridades e acredita que a contestação aumentou porque os docentes “sabiam que havia mais abertura para fazer coisas”.
A cerca de três meses de terminar o ciclo como ministro da Educação, João Costa admite que pode vir a haver margem para a recuperação total do tempo de serviço dos docentes. Em entrevista à Renascença, em vésperas de eleições, João Costa – que é apoiante declarado de Pedro Nuno Santos à liderança do PS – espera que, com uma gestão “liderada por Pedro Nuno Santos enquanto primeiro-ministro”, seja possível “dar resposta” à reivindicação dos docentes, que é “justa e legítima”.
Depois de sucessivas greves de professores, o responsável pela pasta da Educação entende que a recuperação do tempo de serviço é uma questão de “vontade e de capacidade” e acredita que a contestação aumentou porque os docentes “sabiam que havia mais abertura para fazer coisas”.
O alargamento do subsídio de renda a professores que não estejam deslocados na Grande Lisboa ou Algarve também foi tema nesta entrevista, mas João Costa afastou tal possibilidade, numa conversa em que também se falou sobre a utilização de telemóveis nas escolas, a integração de alunos estrangeiros e kits digitais.
Já se declarou apoiante de Pedro Nuno Santos na corrida à liderança do PS. Pedro Nuno Santos, por sua vez, já veio defender que os professores recuperem na íntegra o tempo de carreira, respondendo àquela que tem sido a principal reivindicação dos sindicatos. Acompanha Pedro Nuno Santos ou isto já é um piscar de olho aos docentes?
Eu disse sempre que a reivindicação dos professores é justa e legítima. Depois tivemos de a enquadrar na gestão dos Orçamentos de Estado que tivemos e ver em termos de exequibilidade aquilo que é possível. Se houver uma gestão, que espero venha a ser liderada por Pedro Nuno Santos enquanto primeiro-ministro, que, em termos de opções orçamentais, consiga dar resposta a isto – como ele diz na sua moção – no quadro de todas as carreiras da administração pública que têm tempo para recuperar, obviamente que fico muito contente e mais contentes ainda ficarão os professores.
Mas sendo as contas do país razoavelmente as mesmas, como é que pode haver cabimento para fazer essa recuperação quando, até agora, o argumento usado é o de que não há capacidade financeira?
Este ciclo político que tenho a honra de integrar desde o primeiro dia, em 2015, teve uma grande virtude que foi a devolução de rendimentos às pessoas, depois de anos de cortes muito grandes e que não tiveram todos – ao contrário do que se diz – que ver com o termos passado por uma situação de bancarrota ou com a intervenção da troika. Por exemplo, na educação foi-se muito, muito para além do que estava previsto no memorando de entendimento.
Tivemos cortes salariais, a supressão dos subsídios de férias e Natal, o corte nas pensões, etc. Tudo isso foram medidas das duas primeiras legislaturas, sobretudo logo na primeira em que conseguimos mostrar ao país que o diabo não vinha, ou seja, que as contas se mantinham equilibradas e que era possível fazer essa devolução de rendimentos.
É bom recuperar a memória, onde estávamos em 2015 e onde estamos hoje, quer em termos de subida do salário mínimo, salário médio… a descida [do número de] concidadãos nossos em situação de pobreza. Houve também um caminho de devolução de rendimentos na administração pública, em todas as carreiras. Este é um caminho que pode ser continuado e penso que, lendo a moção estratégica e ouvindo as palavras de Pedro Nuno Santos, ele tem colocado muito o foco na questão salarial. Portanto, nessa perspetiva de ele ter uma visão para o país que aposta no robustecimento dos salários, em particular na administração pública, penso que a intenção dele é dar continuidade ao caminho que foi iniciado em 2015. Se a continuidade passar pela recuperação do tempo de serviço, melhor. Acho que ficamos todos satisfeitos.
Portanto, é uma questão de vontade…
É de vontade e de capacidade. Repare: para além de muitos imprevistos, tivemos também de chegar a muitas frentes. Tivemos de chegar não apenas à carreira dos professores. Tivemos de chegar a outras pessoas que trabalham nas escolas, “desprecarizar” muita gente. Houve uma prioridade, logo no início deste ciclo político, de devolução de rendimentos. Depois, uma prioridade, nesta legislatura em particular, de olhar para carreiras que tinham ficado mais para trás, as carreiras gerais, a carreira técnica superior, a carreira de assistentes operacionais, a carreira de assistentes técnicos… Essa foi a prioridade e houve muitas medidas feitas pela administração pública nesse sentido. Se conseguirmos ir mais além, ótimo.
Agora que está em final de mandato, não reconhece que faltou dar esse sinal de abertura, por exemplo, aos sindicatos?
Abertura não faltou. Acho que houve mais reuniões este ano entre sindicatos e Governo do que tenho memória, mesmo em governos que integrei. Tínhamos um programa de Governo que esteve sempre a ser cumprido, que dava prioridade a duas questões que se relacionam bastante com o tema da falta de professores, que foi reduzir a precariedade e redesenhar o mapa de Portugal para reduzir as distâncias de colocação. Tínhamos também como objetivo, também inscrito no programa do Governo, de criar melhores condições para os professores contratados.
Ainda assim, fomos além do que estava previsto no programa do Governo, fruto exatamente da nossa abertura e do que foi também a capacidade negocial dos sindicatos, e introduzimos um instrumento de aceleração das carreiras para os professores que as estiveram congeladas.
Portanto, houve sempre sinais e houve também um contexto em que a contestação aumentou. Mas não foi por não termos feito nada. Até posso ter uma interpretação, que é: houve mais contestação porque sabiam que havia mais abertura para fazer coisas.
Quanto à questão dos professores deslocados, no ano letivo passado houve o início do programa de alojamento acessível com três dezenas de apartamentos em Lisboa e no Algarve, as zonas do país onde se sente mais esta esta questão. Também foi aprovado o subsídio de renda. Este programa de alojamento acessível vai ser substituído pelo subsídio de renda?
Não, são dois caminhos que andam em paralelo, numa parceria muito feliz com a ministra da Habitação. Há, por um lado, todo o movimento, que é lento, de ter construção, apartamentos, alojamento disponível e com renda acessível. É lento porque, em muitos casos, tem de haver construção e a construção demora o tempo que demora.
O diagnóstico está bem traçado. As duas zonas onde tem sido mais difícil substituir professores são Lisboa e Vale do Tejo e Algarve.
O que fizemos nesta parceria com o Ministério da Habitação foi pegar no instrumento jurídico que existe de apoio à renda e fazer uma adaptação específica para os professores deslocados para estas duas regiões. Quando se calcula a taxa de esforço dos professores beneficiários deste apoio, em vez de se contar apenas o custo da renda, vai-se agregar o custo da renda que estão a pagar com os encargos que têm com a sua habitação permanente, seja encargos de crédito ao banco, seja porque também têm um arrendamento.
E esse mecanismo não tem viabilidade de ser alargado ao resto do país, como pedem os professores?
Os governos servem para resolver problemas e nós tínhamos – e temos – um problema bem identificado nestas duas regiões e, portanto, começámos exatamente por aqui. Para o ano, vamos ter – e vamos certamente deixá-lo bastante adiantado – um concurso de professores muito importante, em que vamos criar mais de 20 mil lugares de quadro para dar a possibilidade às pessoas de se fixarem e, se assim o entenderem, instalarem-se permanentemente nos lugares para onde vão trabalhar.
Às vezes passa-se a ideia de que o Ministério coloca professores arbitrariamente. Há mais pessoas no norte com qualificação do que no sul e há mais lugares no sul do que no Norte e é obrigação de quem administra garantir que os serviços são prestados.
Como é que se resolve esse desfasamento de mais qualificação no norte e mais pessoas a sul?
Aquilo que esperamos é que, com um novo diploma que aprovámos sobre formação inicial de professores, haja um compromisso das instituições de ensino superior, de Lisboa para baixo, de acelerarem a formação de professores e os cursos de formação inicial de professores. Por via daquele período em que houve menos procura dos cursos, houve um grande desmantelamento dessas formações a sul do país e uma preservação a norte. Portanto, aquilo que é mesmo muito importante – e já falámos com o Conselho de Reitores – é que haja, de facto, este reforço e esse investimento das instituições na capacidade formativa.
Voltemos ao aumento dos alunos estrangeiros nas escolas. A integração dos alunos estrangeiros estará em vista para ser mudada a fundo?
A última coisa que assinei enquanto secretário de Estado adjunto e da Educação foi um despacho que dá abertura para a alteração do funcionamento do Português de língua não materna e do acolhimento aos alunos estrangeiros que partiu exatamente do seguinte diagnóstico: um aluno chega, substitui o Português por Português língua não materna, mas depois vai ter Filosofia, História como se fosse falante nativo. Obviamente que isto não resulta. Portanto, o que este despacho – que foi publicado no início de 2022 – prevê é que possa haver períodos só de formação em língua, com uma integração muito parcial no currículo, sem prejuízo de haver atividades que são partilhadas com os outros alunos, porque o convívio também é uma grande fonte de aprendizagem da língua nestes contextos, mas exatamente para poder haver uma maior intensidade no ensino do Português como língua não materna antes da entrada no currículo.
O diagnóstico que fizemos este primeiro ano é que, na maior parte das escolas, isto não foi suficientemente explorado ou aproveitado. Portanto, aquilo que encomendei à Direção-Geral da Educação, e que será publicado brevemente, foi um roteiro de práticas de acolhimento de alunos estrangeiros e de formas de organização do currículo que permitam explorar e tirar o máximo partido disto e dar esta resposta mais eficaz aos alunos estrangeiros.
A ideia é que esse roteiro se possa implementar no próximo ano letivo?
Sim, sim. Esse seria o meu desejo.
O Ministério da Educação já pediu um parecer ao Conselho das Escolas sobre a utilização de telemóveis nas escolas. O parecer remete a decisão para a direção de cada agrupamento. Agora que o Ministério tem este documento qual é o próximo passo?
O parecer é muito claro: os diretores sugerem que não haja uma diretiva nacional e que se confie na liberdade das escolas para tomar as suas decisões. Acho ótimo que assim seja, mas pedi aos meus serviços para, ao mesmo tempo, pedirem alguns pareceres de peritos para fazerem chegar às escolas como recomendações do que é o bom uso da tecnologia, de contextos em que a deve ser mais restrito o uso.
Portanto, acatando esta recomendação, quero disponibilizar às escolas informação e alguns textos de apoio que estão a ser produzidos, porque ainda não há muita evidência científica consolidada sobre isto, para as escolas também poderem tomar as suas decisões de uma forma mais sustentada.
Sobre os kits digitais, foi recentemente notícia a indicação de que, a partir de 2024, só terão acesso à conectividade gratuita os alunos que beneficiem da ação social escolar. Para os restantes fica quase nada, porque as escolas são muito debilitadas, muitas delas sem Wi-Fi…
Isto acompanha uma medida do PRR que é a melhoria da Internet nas escolas. É uma medida que terá um impacto imenso, que está a avançar e que, ainda durante 2024, muitas escolas vão começar a sentir. Mas decorre também da avaliação que fizemos do que foram as taxas de adesão da ativação dos cartões. Aliás, houve um relatório do Tribunal de Contas sobre isso, porque nós, no fundo, estávamos a adquirir mais, muito mais do que precisávamos. Fizemos um estudo das taxas de ativação do perfil dos alunos que ativavam e, portanto, foi uma medida de boa gestão adequar aquilo que é disponibilizado ao que estava efetivamente a ser [usado].
Portanto, não considera que é um retrocesso daquilo que se quer do ensino Público de qualidade? Por exemplo, os manuais de escolares já eram gratuitos para alunos que beneficiavam da Ação Social Escolar. Depois, com o programa dos manuais reutilizados, acabou por abranger todos. A ligação à internet fez o mesmo caminho. Esta decisão não é um retrocesso?
Esta disponibilização dos kits conectividade ainda vem da pandemia, exatamente para os alunos poderem ter acesso onde quer que estivessem. Aquilo que vimos também, cruzando dados com quem estuda as áreas do digital, é que a Internet em casa é quase universal em Portugal, até um pouco independente dos rendimentos. Por isso foi mesmo uma avaliação da necessidade.
João Costa reconhece que, durante a legislatura, foram assumidas outras prioridades e acredita que a contestação aumentou porque os docentes “sabiam que havia mais abertura para fazer coisas”.
A cerca de três meses de terminar o ciclo como ministro da Educação, João Costa admite que pode vir a haver margem para a recuperação total do tempo de serviço dos docentes. Em entrevista àRenascença, em vésperas de eleições, João Costa – que é apoiante declarado de Pedro Nuno Santos à liderança do PS – espera que, com uma gestão “liderada por Pedro Nuno Santos enquanto primeiro-ministro”, seja possível “dar resposta” à reivindicação dos docentes, que é “justa e legítima”.
Depois de sucessivas greves de professores, o responsável pela pasta da Educação entende que a recuperação do tempo de serviço é uma questão de “vontade e de capacidade” e acredita que a contestação aumentou porque os docentes “sabiam que havia mais abertura para fazer coisas”.
O alargamento do subsídio de renda a professores que não estejam deslocados na Grande Lisboa ou Algarve também foi tema nesta entrevista, mas João Costa afastou tal possibilidade, numa conversa em que também se falou sobre a utilização de telemóveis nas escolas, a integração de alunos estrangeiros e kits digitais.
Já se declarou apoiante de Pedro Nuno Santos na corrida à liderança do PS. Pedro Nuno Santos, por sua vez, já veio defender que os professores recuperem na íntegra o tempo de carreira, respondendo àquela que tem sido a principal reivindicação dos sindicatos. Acompanha Pedro Nuno Santos ou isto já é um piscar de olho aos docentes?
Eu disse sempre que a reivindicação dos professores é justa e legítima. Depois tivemos de a enquadrar na gestão dos Orçamentos de Estado que tivemos e ver em termos de exequibilidade aquilo que é possível. Se houver uma gestão, que espero venha a ser liderada por Pedro Nuno Santos enquanto primeiro-ministro, que, em termos de opções orçamentais, consiga dar resposta a isto – como ele diz na sua moção – no quadro de todas as carreiras da administração pública que têm tempo para recuperar, obviamente que fico muito contente e mais contentes ainda ficarão os professores.
Mas sendo as contas do país razoavelmente as mesmas, como é que pode haver cabimento para fazer essa recuperação quando, até agora, o argumento usado é o de que não há capacidade financeira?
Este ciclo político que tenho a honra de integrar desde o primeiro dia, em 2015, teve uma grande virtude que foi a devolução de rendimentos às pessoas, depois de anos de cortes muito grandes e que não tiveram todos – ao contrário do que se diz – que ver com o termos passado por uma situação de bancarrota ou com a intervenção da troika. Por exemplo, na educação foi-se muito, muito para além do que estava previsto no memorando de entendimento.
Tivemos cortes salariais, a supressão dos subsídios de férias e Natal, o corte nas pensões, etc. Tudo isso foram medidas das duas primeiras legislaturas, sobretudo logo na primeira em que conseguimos mostrar ao país que o diabo não vinha, ou seja, que as contas se mantinham equilibradas e que era possível fazer essa devolução de rendimentos.
É bom recuperar a memória, onde estávamos em 2015 e onde estamos hoje, quer em termos de subida do salário mínimo, salário médio… a descida [do número de] concidadãos nossos em situação de pobreza. Houve também um caminho de devolução de rendimentos na administração pública, em todas as carreiras. Este é um caminho que pode ser continuado e penso que, lendo a moção estratégica e ouvindo as palavras de Pedro Nuno Santos, ele tem colocado muito o foco na questão salarial. Portanto, nessa perspetiva de ele ter uma visão para o país que aposta no robustecimento dos salários, em particular na administração pública, penso que a intenção dele é dar continuidade ao caminho que foi iniciado em 2015. Se a continuidade passar pela recuperação do tempo de serviço, melhor. Acho que ficamos todos satisfeitos.
Portanto, é uma questão de vontade…
É de vontade e de capacidade. Repare: para além de muitos imprevistos, tivemos também de chegar a muitas frentes. Tivemos de chegar não apenas à carreira dos professores. Tivemos de chegar a outras pessoas que trabalham nas escolas, “desprecarizar” muita gente. Houve uma prioridade, logo no início deste ciclo político, de devolução de rendimentos. Depois, uma prioridade, nesta legislatura em particular, de olhar para carreiras que tinham ficado mais para trás, as carreiras gerais, a carreira técnica superior, a carreira de assistentes operacionais, a carreira de assistentes técnicos… Essa foi a prioridade e houve muitas medidas feitas pela administração pública nesse sentido. Se conseguirmos ir mais além, ótimo.
Agora que está em final de mandato, não reconhece que faltou dar esse sinal de abertura, por exemplo, aos sindicatos?
Abertura não faltou. Acho que houve mais reuniões este ano entre sindicatos e Governo do que tenho memória, mesmo em governos que integrei. Tínhamos um programa de Governo que esteve sempre a ser cumprido, que dava prioridade a duas questões que se relacionam bastante com o tema da falta de professores, que foi reduzir a precariedade e redesenhar o mapa de Portugal para reduzir as distâncias de colocação. Tínhamos também como objetivo, também inscrito no programa do Governo, de criar melhores condições para os professores contratados.
Ainda assim, fomos além do que estava previsto no programa do Governo, fruto exatamente da nossa abertura e do que foi também a capacidade negocial dos sindicatos, e introduzimos um instrumento de aceleração das carreiras para os professores que as estiveram congeladas.
Portanto, houve sempre sinais e houve também um contexto em que a contestação aumentou. Mas não foi por não termos feito nada. Até posso ter uma interpretação, que é: houve mais contestação porque sabiam que havia mais abertura para fazer coisas.
Quanto à questão dos professores deslocados, no ano letivo passado houve o início do programa de alojamento acessível com três dezenas de apartamentos em Lisboa e no Algarve, as zonas do país onde se sente mais esta esta questão. Também foi aprovado o subsídio de renda. Este programa de alojamento acessível vai ser substituído pelo subsídio de renda?
Não, são dois caminhos que andam em paralelo, numa parceria muito feliz com a ministra da Habitação. Há, por um lado, todo o movimento, que é lento, de ter construção, apartamentos, alojamento disponível e com renda acessível. É lento porque, em muitos casos, tem de haver construção e a construção demora o tempo que demora.
O diagnóstico está bem traçado. As duas zonas onde tem sido mais difícil substituir professores são Lisboa e Vale do Tejo e Algarve.
O que fizemos nesta parceria com o Ministério da Habitação foi pegar no instrumento jurídico que existe de apoio à renda e fazer uma adaptação específica para os professores deslocados para estas duas regiões. Quando se calcula a taxa de esforço dos professores beneficiários deste apoio, em vez de se contar apenas o custo da renda, vai-se agregar o custo da renda que estão a pagar com os encargos que têm com a sua habitação permanente, seja encargos de crédito ao banco, seja porque também têm um arrendamento.
E esse mecanismo não tem viabilidade de ser alargado ao resto do país, como pedem os professores?
Os governos servem para resolver problemas e nós tínhamos – e temos – um problema bem identificado nestas duas regiões e, portanto, começámos exatamente por aqui. Para o ano, vamos ter – e vamos certamente deixá-lo bastante adiantado – um concurso de professores muito importante, em que vamos criar mais de 20 mil lugares de quadro para dar a possibilidade às pessoas de se fixarem e, se assim o entenderem, instalarem-se permanentemente nos lugares para onde vão trabalhar.
Às vezes passa-se a ideia de que o Ministério coloca professores arbitrariamente. Há mais pessoas no norte com qualificação do que no sul e há mais lugares no sul do que no Norte e é obrigação de quem administra garantir que os serviços são prestados.
Como é que se resolve esse desfasamento de mais qualificação no norte e mais pessoas a sul?
Aquilo que esperamos é que, com um novo diploma que aprovámos sobre formação inicial de professores, haja um compromisso das instituições de ensino superior, de Lisboa para baixo, de acelerarem a formação de professores e os cursos de formação inicial de professores. Por via daquele período em que houve menos procura dos cursos, houve um grande desmantelamento dessas formações a sul do país e uma preservação a norte. Portanto, aquilo que é mesmo muito importante – e já falámos com o Conselho de Reitores – é que haja, de facto, este reforço e esse investimento das instituições na capacidade formativa.
Voltemos ao aumento dos alunos estrangeiros nas escolas. A integração dos alunos estrangeiros estará em vista para ser mudada a fundo?
A última coisa que assinei enquanto secretário de Estado adjunto e da Educação foi um despacho que dá abertura para a alteração do funcionamento do Português de língua não materna e do acolhimento aos alunos estrangeiros que partiu exatamente do seguinte diagnóstico: um aluno chega, substitui o Português por Português língua não materna, mas depois vai ter Filosofia, História como se fosse falante nativo. Obviamente que isto não resulta. Portanto, o que este despacho – que foi publicado no início de 2022 – prevê é que possa haver períodos só de formação em língua, com uma integração muito parcial no currículo, sem prejuízo de haver atividades que são partilhadas com os outros alunos, porque o convívio também é uma grande fonte de aprendizagem da língua nestes contextos, mas exatamente para poder haver uma maior intensidade no ensino do Português como língua não materna antes da entrada no currículo.
O diagnóstico que fizemos este primeiro ano é que, na maior parte das escolas, isto não foi suficientemente explorado ou aproveitado. Portanto, aquilo que encomendei à Direção-Geral da Educação, e que será publicado brevemente, foi um roteiro de práticas de acolhimento de alunos estrangeiros e de formas de organização do currículo que permitam explorar e tirar o máximo partido disto e dar esta resposta mais eficaz aos alunos estrangeiros.
A ideia é que esse roteiro se possa implementar no próximo ano letivo?
Sim, sim. Esse seria o meu desejo.
O Ministério da Educação já pediu um parecer ao Conselho das Escolas sobre a utilização de telemóveis nas escolas. O parecer remete a decisão para a direção de cada agrupamento. Agora que o Ministério tem este documento qual é o próximo passo?
O parecer é muito claro: os diretores sugerem que não haja uma diretiva nacional e que se confie na liberdade das escolas para tomar as suas decisões. Acho ótimo que assim seja, mas pedi aos meus serviços para, ao mesmo tempo, pedirem alguns pareceres de peritos para fazerem chegar às escolas como recomendações do que é o bom uso da tecnologia, de contextos em que a deve ser mais restrito o uso.
Portanto, acatando esta recomendação, quero disponibilizar às escolas informação e alguns textos de apoio que estão a ser produzidos, porque ainda não há muita evidência científica consolidada sobre isto, para as escolas também poderem tomar as suas decisões de uma forma mais sustentada.
Sobre os kits digitais, foi recentemente notícia a indicação de que, a partir de 2024, só terão acesso à conectividade gratuita os alunos que beneficiem da ação social escolar. Para os restantes fica quase nada, porque as escolas são muito debilitadas, muitas delas sem Wi-Fi…
Isto acompanha uma medida do PRR que é a melhoria da Internet nas escolas. É uma medida que terá um impacto imenso, que está a avançar e que, ainda durante 2024, muitas escolas vão começar a sentir. Mas decorre também da avaliação que fizemos do que foram as taxas de adesão da ativação dos cartões. Aliás, houve um relatório do Tribunal de Contas sobre isso, porque nós, no fundo, estávamos a adquirir mais, muito mais do que precisávamos. Fizemos um estudo das taxas de ativação do perfil dos alunos que ativavam e, portanto, foi uma medida de boa gestão adequar aquilo que é disponibilizado ao que estava efetivamente a ser [usado].
Portanto, não considera que é um retrocesso daquilo que se quer do ensino Público de qualidade? Por exemplo, os manuais de escolares já eram gratuitos para alunos que beneficiavam da Ação Social Escolar. Depois, com o programa dos manuais reutilizados, acabou por abranger todos. A ligação à internet fez o mesmo caminho. Esta decisão não é um retrocesso?
Esta disponibilização dos kits conectividade ainda vem da pandemia, exatamente para os alunos poderem ter acesso onde quer que estivessem. Aquilo que vimos também, cruzando dados com quem estuda as áreas do digital, é que a Internet em casa é quase universal em Portugal, até um pouco independente dos rendimentos. Por isso foi mesmo uma avaliação da necessidade.
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