Professores: “Órfãos” de Sindicatos?

Professores: “Órfãos” de Sindicatos?

 

Há fenómenos estranhos e inusitados que primam pela ausência de lógica e que, aparentemente, só ocorrerão em Portugal, desde logo esta insólita ocorrência:

– Os Sindicatos que representam os Professores parecem ter-se tornado especialistas em desbaratar a força e a união, alcançadas em determinados momentos…

Por outras palavras, surpreendentemente, os Sindicatos de Educação em Portugal têm demonstrado a inédita proeza de conseguirem sabotar-se a si próprios, em vez de, como lhes competiria, defenderem acerrimamente os direitos e os interesses da principal corporação profissional que supostamente representam: a Classe Docente…

A confiança foi irremediavelmente quebrada em 2010, quando a FENPROF cedeu a um ruinoso acordo, alegadamente “selado com pizzas”, com a então Ministra da Educação Isabel Alçada, desbaratando toda a força e união, alcançadas em 2008, pela maior Manifestação de Professores alguma vez ocorrida em Portugal…

Aqueles que, pela sua presença, “sentiram” e “respiraram” essa Manifestação e que vivenciaram tudo o que se lhe seguiu, dificilmente esquecerão a estratégia iminentemente displicente com que foi gerida a posterior negociação com o Ministério da Educação…

Nessa altura, os Professores acabaram por perder, ingloriamente, a oportunidade sublime de obterem uma vitória histórica, face às intenções da Tutela, desperdiçando os ganhos obtidos por essa épica Manifestação…

De resto, a “factura” desse trágico acordo continuará a ser paga ainda hoje, por parte significativa dos Professores…

A confiança voltou a ser irremediavelmente quebrada em 2023, quando o Sindicato STOP, depois de ter conseguido alcançar o mérito inegável de dar voz, audível e visível, à indignação e ao mal-estar dos profissionais de Educação, alegadamente, se terá deixado enredar por “intrigas palacianas” e “lutas fratricidas”…

O STOP, depois de ter conseguido quebrar a hegemonia de um Sindicalismo tido como “fora do prazo de validade”, previsível, demasiadamente adaptado ao “sistema” e coreograficamente bem encenado, mais parece, no momento actual, corresponder ao epíteto de “um anjo caído”…

Talvez um “anjo caído” em desgraça, talvez seduzido pela ganância de outros poderes ou pela ambição de maiores poderes…

Neste momento, teremos, então, por um lado, um Sindicato em plausível fragmentação e em potencial autofagia (STOP) e, por outro, uma Plataforma de Sindicatos (FENPROF), cuja acção mais visível, “ousada” ou “audaz” dos últimos tempos se traduziu na convocatória de um dia de Greve, numa 6ª Feira (próximo dia 6 de Outubro), sabendo que no dia anterior é Feriado Nacional…

Dada a insanidade reinante em muitos contextos laborais (leia-se, em muitas escolas), ter a possibilidade de usufruir de quatro dias consecutivos de descanso será mais do que justo e merecido para quem trabalha diariamente no terreno e os que aderirem à Greve no dia 6 de Outubro, perderão, naturalmente, o salário correspondente a esse dia…

Contudo, quando uma estrutura sindical envereda pela via do “escandalosamente óbvio” estará a contribuir para a credibilização das formas de luta por si determinadas?

Com honestidade, e sendo realista, na 2ª Feira, dia 9 de Outubro, quando se regressar às escolas, espera-se que algum problema tenha sido resolvido pela Greve da 6ª Feira anterior?

Perante as “desgraças”, protagonizadas pelo STOP e pela FENPROF, torna-se praticamente impossível não sorrir sarcasticamente e não indagar:

– “Continuamos a brincar às lutas”?

Em particular, face à Greve agendada para o próximo dia 6 de Outubro, pela “maior e mais representativa organização sindical de professores em Portugal” (designação constante no site oficial da FENPROF):

– Que seriedade e que credibilidade poderão ser reconhecidas a este tipo de “luta”, sobretudo se se reconhecer que no último meio ano nenhuma das principais reivindicações dos Professores foi atendida pelo Ministério da Educação e que a Tutela continua a fazer “gato-sapato” da Classe Docente?

Alguém acreditará que tal acção “reivindicativa” possa ser susceptível de forçar a Tutela a retroceder no que quer que seja?

Que poder negocial, junto do Ministério da Educação, poderá ser reconhecido a estruturas sindicais, cujas acções “reivindicativas” sejam semelhantes à decretada para o dia 6 de Outubro?

Já só nos resta perguntar a todas as estruturas sindicais:

– Em Educação, há Sindicatos ou caricaturas de Sindicatos?

– Em Educação, são decretadas genuínas acções de luta ou acções de luta para entreter?

O Ministro da Educação terá, com certeza, todos os motivos para prosseguir, tranquilamente, com a sua errática acção, rumo ao precipício:

– Num dos momentos mais difíceis para os Professores, após o 25 de Abril de 1974, a “lógica das coreografias bem encenadas” e dos “pactos de não agressão” face à Tutela, parecem prevalecer, assim como a insistência em simulacros de luta e de negociação…

A descrença generalizada dos Professores nas estruturas sindicais que supostamente os representam e o cepticismo relativo às mesmas, que já eram um dado adquirido antes do aparecimento do STOP, tornam-se, agora, ainda mais evidentes e incontornáveis…

Ainda que possa existir essa tentação, nem o STOP nem a FENPROF terão quaisquer motivos para escarnecerem um do outro ou para ridicularizar a “desgraça alheia”, uma vez que:

– Ambos fracassaram, de forma retumbante, na defesa dos interesses da Classe Docente e ambos colocaram em causa a confiança em si depositada…

As imagens, que têm vindo a ser conhecidas, tristes e, por vezes, decadentes, de Professores que, alegadamente, se viram “obrigados a mendigar por trabalho”, aceitando colocações a centenas de quilómetros da sua residência, e sujeitando-se, até, a condições de vida muito pouco dignas, acabam também por ser o reflexo do fracasso da acção reivindicativa das estruturas sindicais…

Infelizmente, os principais Sindicatos não têm conseguido opor-se à endémica desunião docente, uma vez que eles próprios se têm constituído como factores de divisão, originando comportamentos facciosos, frequentemente assentes num incompreensível corporativismo e na exaltação de determinados protagonismos…

Enquanto assim for, não haverá qualquer esperança de poder encetar-se uma luta verdadeiramente séria e credível, que conduza aos resultados pretendidos…

A Wikipédia diz-nos que “a palavra sindicato tem origem no latim e no grego. No grego, “syn-dicos” é aquele que defende a justiça. No latim, “sindicus” denominava o “procurador escolhido para defender os direitos de uma corporação”. Está sempre relacionado à noção de defender e ser justo com uma certa coletividade.”…

Neste momento, será possível reconhecer, no contexto português, em particular na Área da Educação, o anterior significado atribuído à palavra Sindicato?

Já se percebeu que a banalização das folclóricas Manifestações de rua e as habituais Greves à 6ª feira não têm operado qualquer mudança positiva dentro de cada escola, nem removido as políticas perversas e injustas concebidas pela Tutela…

Insistir nessa “fórmula de contestação” continuará, certamente, a não produzir qualquer efeito concreto e também não dignificará a luta pelo respeito e pela valorização da Carreira Docente…

Que “exigências” sindicais poderão ser atendidas pela Tutela, através desta “fórmula de contestação”?

E os principais prejudicados serão sempre os próprios Professores que, neste momento, mais parecem “órfãos de Sindicatos”…

“Abandonado, desamparado, desprotegido, privado, carente, desprovido” (Sinónimos da palavra Órfão, segundo o Dicionário Online de Sinónimos)…

Pela típica nostalgia portuguesa:

– “Tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado”… (Amália Rodrigues, Aníbal Nazaré, Fernando de Carvalho).

Que existe, existe… Que é triste, é… Será, ou não, também, uma sina ou uma fatalidade invencível?

Será possível mudar este fado?

(Declaração de Interesses: Sou sindicalizada.)

(Paula Dias)

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12 comentários

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    • Mosca na sopa on 28 de Setembro de 2023 at 22:03
    • Responder

    Eu acho que o que vem aí é o sindicato dos oprimidos e faladores, criticam tudo o que mexa, para assim se puderem desculpa de nada fazer….Tipo: “Não vale a pena, olha os maus exemplos dos sindicatos!…” “Ainda bem que não fiz nada, estava-se mesmo a ver que isto não daria nada!”…. “Bolas, agora que eu até estava a alinhar na coisa, na luta, em dizer que não a tudo lá na escola, os tipos do STOP vêm e lixam a luta toda!” …Rir para não chorar! Ah, e os que são acusados de ir a manifs (para que raio servem, pensarão os ais atrevidos e proativos!) e que nada alcançam, ao contrário dos que ficam sempre na escola, acedendo a tudo, os que não participam nas banalizadas manifestações e têm operado muitas mudanças positivas dentro de cada escola, ainda que de forma discreta, discretíssima😂! Isso é que é luta rija, sindicalismo do bom, docência de alta craveira!

    • IAAN on 28 de Setembro de 2023 at 22:26
    • Responder

    Com comentários derrotistas e debochados como este, que deita ainda mais abaixo os professores e a sua luta, ficamos ainda pior.

    • Maria on 29 de Setembro de 2023 at 0:41
    • Responder

    Só vejo uma possibilidade de isto ainda ter solução, que seria a formação de um sindicalismo serio e de professores ( que não existe) e só vejo alguns professores que, juntos, poderiam encabecar e liderar uma nova direção deste fado que tem sido os professores. Falo lo dos mediáticos Guinote, Prudêncio, Ricardo Silva etc que têm credibilidade, conhecimento e seriedade. Falta-lhe provavelmente o mais importante que é vontade mas aqui fica o apelo ao sacrifício.

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    • Valia a pena pensar nisto! on 29 de Setembro de 2023 at 9:11
    • Responder

    “Neste momento, será possível reconhecer, no contexto português, em particular na Área da Educação, o anterior significado atribuído à palavra Sindicato?”.
    A avaliar pelo seu texto, a resposta é não. Concordo. Então por que continua/continuamos sindicalizados???
    É razoável pagar a traidores?
    Nota: estou em crer que o SToP estará a ser vitima de “submarinos” do governo…

    • Adolfo Dias on 29 de Setembro de 2023 at 9:22
    • Responder

    Vá lá mais uma greve marcada estrategicamente a uma sexta posterior a um feriado! Que bela ponte!

      • 🤔 on 29 de Setembro de 2023 at 11:46
      • Responder

      Se em, dia de greve, perdemos o vencimento, por que razão não marcá-la(s) para sexta-feira (os, muitos, professores deslocados poderão, enfim , visitar a família, por exemplo), seria sadismo, ou apenas estupidez.

        • Adolfo Dias on 29 de Setembro de 2023 at 13:01
        • Responder

        Sim mas nada que uma consultazinha para se faltar e aparentar fazer greve…é ir aos hospitais privados nesses dias e ver a quantidade de professores nas salas de espera…

    • José Silva on 29 de Setembro de 2023 at 9:23
    • Responder

    Curioso, que numa altura em que a inflação provocou uma subida enorme e genralizada dos preços, diminuindo ainda mais o poder de compra dos professores, que já vinha a ser minimizado numa grande % nos últimos anos e nem 1 palavra se ouve sobre atualizações salariais. Mesmo quando há discriminação dos professores nos aumentos da função pública. Aliás, os docentes só são FP quando interessa…
    E em relação a outras injustiças e direitos fundamentais só se ouve um burburinho ou ruidinho de fundo. Há que capitalizar o descontentamento generalizado e a dimensão da classe.

    • Tenho Pena on 29 de Setembro de 2023 at 11:23
    • Responder

    Não fazia ideia nenhuma desta situação do STOP.
    Será que são intrigas criadas pelo Governo, como um dos bloguistas comentou?
    Será realmente a busca pelo poder usando como plataforma o descontentamento dos professores?
    Desde que comecei a trabalhar, aos 14 anos, fui sempre sindicalizado.
    E enquanto docente também.
    No inicio era da Fenprof, ao longo dos anos fui assistindo ás reivindicações e ás reuniões sindicais e nunca vi os meus interesse defendidos, defendiam os interesses dos colegas que estavam numa situação profissional muito melhor que a minha.
    Não defendiam os interesses de todos os associados.
    Saí da Fenprof, fui para a FNE.
    Calhou de ter um processo disciplinar, mas os advogados estavam de férias.
    Tive de recorrer a um advogado particular.
    Saí da FNE.
    Agora não estou filiado em nenhum, pensei no STOP, mas pelos vistos…É pena.

    • Maria Moniz on 29 de Setembro de 2023 at 16:58
    • Responder

    Paula (tem) Dias (et al), sugiro (de forma despretensiosa) que, antes de tentar “colar barro à parede”, faça 3 coisas:

    Paula (tem) Dias (et al), sugiro (de forma despretensiosa) que, antes de tentar “colar barro à parede”, faça 3 coisas:
    1º) “uma introspeção, o mais profunda, rigorosa, objetiva e isenta possível acerca deste tema:”
    – Tenho moral para “atirar barro” a quem quer que seja?

    2º) Certifique-se que a parede contra a qual está a tentar atirar o tal barro, não é uma parede deste tipo:
    https://www.publico.pt/2016/08/13/local/noticia/chichi-nas-ruas-de-lisboa-ha-uma-tinta-que-tenta-impedir-1741167

    3º) Tente lembrar-se – quando quiser botar figura demonstrando que é uma grande guerreira que só faz guerra quando está em grupo, quando o número de inimig@s não é superior a 1 e, mesmo assim, quando ess@ 1 lhe parece demasiado frac@ e indefes@ para revidar – que as aparências iludem e que há quem não aplauda o bulliyng sobre os mais frac@s e indefes@s. Ou então escolha um/a mais frac@ e indefes@ do tipo “cadáver desconhecido e abandonado, em elevado estado de decomposição” para não ter surpresas (e daí, não sei…).
    Sei que esta última sugestão será incompreensível para si (e para muitos), porque há (muita) gente sem noção (e, já agora, sem qualquer relevância), mas mesmo assim não quis deixarde a fazer.

    Sabes muito (mas não enganas)…

      • RCosta on 5 de Outubro de 2023 at 20:21
      • Responder

      Umas inanidades sobre os mais fracos e indefesos, nem se percebe a que propósito, e uns joguinhos parolos com o nome da autora, porque não tem nada mesmo para dizer. Nada, zero Maria Peesunçosa Moniz.

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