Carta aberta de dirigentes escolares a Sua Excelência o Ministro da Educação

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Carta aberta de dirigentes escolares a Sua Excelência o Ministro da Educação

Os subscritores desta carta são de diversas origens, professores de múltiplas disciplinas e em diversos locais, e que se situam em diferentes momentos da carreira docente.

Em comum: todos nós exercemos funções que incluem uma componente de gestão e administração das escolas.

Nesse sentido, somos segmentos de sustentação da chamada administração educativa que são, também, e principalmente, as escolas.

A importância da função administrativa na atividade das escolas

A autonomia das escolas é muito insuficiente, mas os cargos que o modelo de gestão define são essenciais para o funcionamento do sistema educativo e são desempenhados por professores que partilham do quadro profissional e de carreira de todos os restantes e que vêm, por este meio, manifestá-lo junto de Vossa Excelência. E fazemo-lo, porque é um dever funcional, além de ato de cidadania, apontar o que está
mal, na expetativa de que haja reflexão e ação para resolver. Isso é exercer autonomia cívica e é criar Democracia.

Somos Presidentes e vogais de Conselhos Gerais, Diretores/as, Subdiretores/as, Adjuntos/as, Coordenadores/as de Ciclo, Departamento ou Estabelecimento. Muitos de nós têm décadas de dedicação à função docente e podemos invocar percursos mais ou menos longos, reconhecidos pelos colegas e pelas comunidades, no exercício dos cargos referidos.

A urgência de agir num momento crítico.

Vimos dizer de viva voz e com a explicitação que a urgência exige: temos muita preocupação com o rumo negativo e dissolvente da Escola Pública que as políticas educativas estão a tomar, desde há mais de uma década e, com premência, nesta legislatura. A nossa preocupação é tão profunda que, muitos de nós, ponderam abandonar funções, se não houver solução em prazo razoável, mesmo com custo pessoal e das escolas em que trabalhamos, que, não é vergonha dizer, amamos, como comunidades de estudantes e como
trabalho socialmente relevante. Do ponto de vista legal, pelo menos, uma escola não pode funcionar se o seu órgão máximo (Conselho Geral), o único com representatividade eletiva, não estiver integralmente
eleito. Do mesmo modo, do ponto de vista prático, a saída voluntária, por exaustão ou protesto, de muitos dirigentes ou coordenadores, colocará graves problemas ao funcionamento e, neste momento do ano, à sua conclusão de forma adequada e à preparação do próximo. Mas, muitas vezes, deixar de improvisar ou de suportar o insustentável pode ser só um ato honesto, mesmo custoso, de transparência com a sociedade e de consciencialização para os problemas.

No nosso ponto de vista, é necessário que os responsáveis políticos assumam o momento crítico histórico que estamos a viver na Educação e tirem as consequências para a sua ação.

O significado profundo do descontentamento e as questões a resolver

O descontentamento dos professores e outros trabalhadores das escolas não é birra, nem fruto de táticas políticas ocultas. É sinal da vida e autonomia das escolas e seus profissionais. É a manifestação da consciência do estado a que a situação chegou, depois de 15 anos de desatenção, e, até, por vezes, desprezo político pelas pessoas que fazem a escola. Apelamos, por isso, à consciência cívica e política de Vossa Excelência para que aceite mudar a forma de gestão dos problemas que estão colocados a debate na opinião pública. E isso passa por mostrar sinais de efetiva compreensão estratégica dos problemas dos professores e dos profissionais e realizar efetiva negociação e debate com os agentes do sistema educativo para reduzir a justa insatisfação e produzir mudanças reais e de melhoria. Assim, enumeramos o conjunto de questões no âmbito docente, que precisam de negociação urgente e soluções incisivas, que só podem ser construídas em diálogo e com abertura do Governo e do Ministério das Finanças a também negociar e resolver o problema
da falta de recursos para cumprir os objetivos e tarefas da escola pública:

1. Resolver as questões de colocação dos professores, com um sistema justo e transparente, que atenda aos casos em que é necessária equidade e compensação de injustiças passadas. Negociar um sistema que facilite a estabilidade territorial e a liberdade de trabalho dos professores e a ligação destes às suas famílias e comunidades, para evitar os problemas atuais. A questão da transparência e a imunidade do sistema a manipulações e potenciais tentações de favoritismos é consensual.

2. Resolver as questões curriculares e de avaliação dos alunos, em que têm sido impostos modelos que não geram consenso, e criam perturbações e dificuldades, mesmo sob a alegada capa de autonomia e boas intenções. A mudança curricular tem de ser mais debatida e não pode ser imposta pelo topo, com puras visões abstratas, contra as visões práticas, por vezes contrárias, mas ignoradas, dos executores nas
escolas.

3. Resolver as questões de indisciplina e a retirada de autoridade pedagógica e relacional aos professores, face aos alunos e também a alguns pais. Bater ou injuriar um professor tem de ser um ato grave e punido como atentado ao Estado Democrático, de que a Educação é pilar.

4. Resolver as questões de excesso de burocracia, desorganização, induzida por via dos organismos centrais, e disfuncionalidade processual, que sobrecarregam as escolas e professores, desviando-os das funções primordiais e retirando tempo às tarefas educativas e aos alunos.

5. Resolver as questões de falta de recursos em equipamento e instalações, além de tempo de profissionais para apoios, dotando as escolas com os recursos e não fazendo propaganda com supostas entregas de meios que muitas vezes são ilusórias e só convencem quem não conheça a realidade vivida.

6. Resolver as questões salariais e de carreira dos professores, repondo a justiça do tempo de progressão de carreira congelado e nunca reposto. Uma reposição que só tem efeitos futuros, que não custa todo o dinheiro que por via dela foi retirado aos salários, mas que gerará o efeito positivo que tem na motivação e qualidade de trabalho qualquer correção de injustiças.

7. Resolver, com uma reflexão séria de aplicação da justiça como equidade, questões conexas como a Avaliação de Desempenho e quotas e vagas de progressão.

8. As questões salariais e de carreira e avaliação de desempenho também têm de ser encaradas para os outros profissionais das escolas, que agem connosco, no quotidiano, para as construir.

9. Resolver os problemas que fazem da “autonomia” e “democracia escolar” palavras com conteúdo vago e pouco realista no contexto atual das escolas: evitar que a municipalização possa retirar autonomia de gestão e ação às escolas, reforçar a participação e peso dos docentes na sua gestão, reduzindo o centralismo e os
mecanismos que diminuem e rebaixam o papel da participação dos que são científica e tecnicamente formados para conhecer e exercer a atividade educativa.

10. E este último ponto leva-nos à questão da confiança que tem a ver com o método político de ação. E esse é talvez o primeiro passo: negociar abertamente tudo o que faz falta para criar confiança e evitar a instabilidade.

Estes pontos podem ser concretizados ao detalhe, mas é neles que estão as questões que bloqueiam a paz e serenidade, de que as escolas precisam e que fizeram solidificar o justo descontentamento dos trabalhadores das escolas.

Liderar é participar das preocupações daqueles que, pelos cargos, temos de coordenar e orientar e atender nos seus anseios.

É isso que este documento visa fazer: apelar à sua liderança, para atender à necessidade de ouvir e dialogar, com profundidade e reflexo na ação, sobre as justas preocupações dos agentes educativos.

Nas manifestações tem-se dito que a luta que vem acontecendo é uma lição. Mas pode Vossa Excelência deixar uma marca política e dar também uma lição política: numas das maiores crises da educação, a atitude democrática e de abertura à participação e negociação pode resolver os problemas em nome do interesse nacional.

Basta, para isso, que negoceie com abertura e vontade efetiva de resolver os problemas que tantos detetam e concordam que existem e são prementes.

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4 comentários

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    • Luluzinha! on 25 de Fevereiro de 2023 at 9:33
    • Responder

    Mais uma carta aberta! Enfim…

    • Até ao fim on 25 de Fevereiro de 2023 at 11:13
    • Responder

    Só se ele viveu na Lua até ontem, é que desconhece isto tudo. Está “farto” de saber o que se passa. Não quer é ceder nada. Terá de ser forçado a isso nem que a Luta se prolongue indefinidamente.

    • Carlos Moreira on 25 de Fevereiro de 2023 at 11:18
    • Responder

    . A indisciplina dos alunos e a intromissão e desrespeito da maioria de gentalha de EE na atividade docente nas escolas é um ponto fulcral!.
    . queremos ser nós, os profissionais da educação nas escolas, a eleger a direção diretamente como era antigamente e não de uma forma obscura como é agora, e que faz com que a maioria destes diretores de fraca qualidade tenham o “rabo preso”, como se costuma dizer, por encarregado de educação, respetivos alunos e Ministério, e por isso tratem os professores de forma miserável!!!!
    (Mas vou obviamente subscrever! Há muita coisa que tem que mudar e em primeiro lugar o respeito!)

    • Carlos Moreira on 25 de Fevereiro de 2023 at 11:29
    • Responder

    Obrigado ao “Blog do Arlindo”! Se não fosse ele andávamos mais “cegos”!!

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