Municipalização da Educação: “dar o ouro ao bandido”…

 

Há alguns factos incontornáveis e que não devem ser escamoteados relativos ao tema da municipalização da Educação:

 O prazo de transferência das competências para as autarquias locais e para entidades intermunicipais no domínio da Educação foi prorrogado até 31 de Março de 2022, conforme o disposto no Decreto-Lei Nº 56/2020 de 12 de Agosto…

 Entretanto, passou-se um ano desde a publicação do anterior diploma legal e, a ser como aí está disposto, faltarão apenas cerca de seis meses para que se concretize a referida transferência de competências de forma massiva e previsivelmente irrevogável…

 E assim o tema da “municipalização da Educação” está de volta, mesmo que muitos considerem esse assunto como uma espécie de tabu, que não deve ser falado nem discutido… Outros, porventura, talvez ainda não se tenham dado conta que esse iminente e tenebroso desígnio não desaparecerá só porque não se fala dele, antes pelo contrário…

 Essa transferência de competências, um dos objectivos maiores do actual Governo, está, de resto, bem explícita e assumida no Comunicado do Conselho de Ministros de 8 de Novembro de 2018…

 Colocam-se, contudo, muitas reservas quanto à bondade e à virtude desse modelo de gestão e administração do sistema educativo, salientando-se desde logo o seguinte:

 – Num artigo publicado em 9 de Junho de 2019 pelo Jornal Diário de Notícias, intitulado “Metade dos casos de corrupção tem origem em autarquias”, referia-se que o Conselho de Prevenção da Corrupção (CPC) analisou em 2018 um total de 604 casos relacionados com essa criminalidade: 48% ocorreram em autarquias, o que representava a maior percentagem de sempre, constatando-se também que os casos reportados relacionados com os municípios tinham vindo a subir: 32.9% em 2015, 35% em 2016, 44.6% em 2017 e 48% em 2018.

 Também de acordo com o referido artigo: “48% (num total de 288) estão relacionados com autarquias, a maioria provenientes de câmaras municipais (223), seguidos de juntas de freguesia (56) e de empresas municipais (9)”.

 Por outro lado, em notícia veiculada pelo Jornal Expresso em 16 de Março de 2021, referia-se que o Relatório do mesmo CPC, relativo aos dados reportados em 2020, “enfatiza que a área da Administração Local é, uma vez mais, a que surge mais representada, estando associada a mais de metade (51,8%) dos reportes judiciais”.

 Mais se afirmava que: as “autarquias lideram as queixas, mas mais de metade acabam em arquivamento. Corrupção e peculato dominam os motivos para abertura de Processos.”

 Na mesma notícia, referia-se ainda que a ausência de indícios ou elementos probatórios e as dificuldades na realização da investigação criminal para a recolha de indícios e provas nestes crimes económico-financeiros, foi a explicação dada pelo CPC para o arquivamento de 52% das queixas e para a condenação apenas de 10 processos abertos em tribunal…

 Perguntas decorrentes de tudo o anterior, independentemente da “cor política” dominante em cada autarquia:

 – Em termos gerais, é possível confiar na (suposta e exigível) idoneidade dos dirigentes do poder autárquico?

– Em termos gerais, terão esses dirigentes a aptidão ética e moral, necessária e imprescindível ao desempenho dos respectivos cargos?

 – Ainda que as condenações em Tribunal apresentem uma baixa percentagem, pelos motivos já apontados, como ignorar ou “apagar” as muitas suspeitas de corrupção, peculato, participação económica em negócio ou abuso de autoridade/poder, que recorrentemente são dadas a conhecer pelos meios de comunicação social, envolvendo titulares de cargos autárquicos?

 – Poderão os Profissionais de Educação, docentes ou não docentes, confiar em Dirigentes Máximos de Serviço que se encontrem sob as mais variadas suspeitas, ainda que não venham a ser legalmente sancionados? Nessas condições, que legitimidade institucional pode ser reconhecida a tais Dirigentes?

 Os cargos autárquicos parecem ser muito tentadores, mas nem sempre pelos melhores motivos ou pelos motivos certos… O estabelecimento de teias de relações duvidosas, obscuras e “perigosas”, alimentadas por interesses clientelistas e por lobbies burocráticos, parece ser uma prática comum ao nível do poder local, conhecida de praticamente todos os cidadãos, de qualquer autarquia do país…

 E perante isso, o que fazem os cidadãos? Os cidadãos limitam-se a comentar o tema em surdina ou a afirmar: “rouba, mas faz”, numa atitude de clara desculpabilização, de condescendência e até de alguma implícita empatia…  

 Os cidadãos, incluindo parte significativa dos próprios Profissionais de Educação, sobretudo pela sua inércia e indiferença, têm, afinal, os autarcas que merecem porque: “a impunidade é segura, quando a cumplicidade é geral” (Mariano José Pereira da Fonseca)…

 Vem aí borrasca, proporcionada por uma Democracia cada vez mais débil e anémica… Os Partidos Políticos com assento na Assembleia da República e os Sindicatos da Educação ou “assobiam para o lado” ou esboçam protestos indisfarçavelmente pueris, apesar desta pretensão do Governo significar um verdadeiro “xaque-mate” à Educação…

 E em plena campanha eleitoral para Eleições Autárquicas, e porque a Educação não pode depender de interesses sombrios, resta afirmar isto:

 Talvez seja aconselhável pensar muito bem a que “bandidos se vai dar o ouro” porque é bem possível que os que agora forem eleitos passem a gerir e a administrar parte significativa das vidas profissionais do pessoal docente e não docente, já a partir do próximo mês de Março…

 

 (Matilde)

 

 

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9 comentários

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    • Lucas on 19 de Setembro de 2021 at 12:00
    • Responder

    Não se esqueçam de dar 20 valores ao filho, sobrinho ou neto do presidente da câmara, senão ainda se metem em trabalhos.

      • BB on 21 de Setembro de 2021 at 11:18
      • Responder

      Se os merecerem não custa nada. Caso contrário, vão bugiar.

    • MJ on 19 de Setembro de 2021 at 12:41
    • Responder

    “Em termos gerais, é possível confiar” em quem até o tempo de serviço rouba?

    • Dora on 19 de Setembro de 2021 at 19:35
    • Responder

    Só com a participação activa dos cidadãos na vida autárquica é que se pode conseguir melhorias a todos os níveis na vida quotidiana- habitação, arruamentos, obras, saúde, segurança, creches, lares, cultura, trânsito, meio ambiente e outras funcionalidades que tornem as nossas vidas mais fáceis e que, ao mesmo tempo, pressionem por transparência dos vários orgãos do poder local.
    Há tanto por fazer!
    A pergunta fica: quantos de nós têm tempo e empenho para o fazer?

      • BB on 21 de Setembro de 2021 at 11:28
      • Responder

      Dora, de boas intenções está o inferno cheio – diz o ditado velho.

    • Monhé on 20 de Setembro de 2021 at 13:57
    • Responder

    O único filho da mulher de conduta imprópria és tu.
    O ministro não tem culpa, concordo. Porquê? Porque ele não existe. É um gajo que serve apenas para assinar papéis, cortar fitas e andar a viajar à custa do pagode.

    Karamba, que não te cansas de lamber locais onde o sol não brilha!

    • BB on 21 de Setembro de 2021 at 11:27
    • Responder

    Consta que há professores que antes de querem saber o nome dos alunos perguntam às crianças/jovens se foram ou não vacinados e, caso não tenham sido vacinados, perguntam porquê ? Eu pergunto : o que que a ” maranhada” tem a ver com isso ? Só cretinos!
    Quando perguntaram a Bolsonaro se ele era racista ele respondeu, exatamente, assim : ” Racista o caralho, porra ! ” A partir daí , nunca mais nenhuma merda de jornalixo lhe perguntou tal coisa ou outras parecidas. Aprenderam, graças a Deus.

    • Dora on 21 de Setembro de 2021 at 14:12
    • Responder

    BB, fia-te na virgem e não corras – diz outro velho ditado.

    • Iva on 22 de Setembro de 2021 at 17:10
    • Responder

    Caramba! Não é repetindo sempre o mesmo discurso que ele se torna verdadeiro. Cuidado com a amargura. O ressentimento e / ou ódio é um veneno que nós tomamos querendo dar ao outro….

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