Litania para um Natal
Perdoai-lhes, Senhor!
Por todas as vezes que disseram amar alguém e só a si se amaram
Por todas as vezes que fizeram promessas que não cumpriram
Por todas as mentiras que calaram
E por todas as vezes que foram intencionalmente omissos.
Perdoai-lhes, Senhor!
Por subirem e descerem escadas quando lhes apetecia
Por serem sociais e amáveis quando a situação exigia
Por calarem a hipocrisia, matéria de que são feitos
Por regressarem a casa ébrios
Por trazerem roupa com marcas de esperma
Por rodarem as rodas por estradas sem berma
Na avidez sôfrega do cio.
Perdoai-lhes, Senhor!
Por nunca terem nada nas mãos
Por representarem papéis que não ensaiaram
Por guardarem segredos em pastas fechadas
Por desrespeitarem os outros com ligeireza
Por se sentarem à nossa mesa
Por se deitarem nas nossas camas
Por violarem a nossa vida
Por comerem o nosso pão
Por nos negarem a razão.
Perdoai-lhes, Senhor! Perdoai-lhes!
Apesar das palavras e dos jogos sintáticos
Apesar das máscaras descartáveis que usam
Apesar da confissão sem remissão.
Perdoai-lhes, Senhor, porque eles sabem o que fazem.
(texto encontrado num velho bloco de apontamentos, sem autor)