Estamos em constante reeducação. Por Nelson da Silva Martins

 

Estamos em constante reeducação

O regresso às aulas presenciais está de volta. Na bagagem cabem seis meses de ausência, de compreensão, de confiança, de criatividade, de esperança, de estímulos, de generosidade, de profissionalismo, de orientações, de irreverência, de reinvenção, de socialização, de tolerância… Porém, a incerteza, a insegurança e o medo ocuparão imenso espaço neste reinício escolar!
Ao longo dos trinta e três anos de prática letiva, dos quais dezassete a repartir-me entre a lecionação e a gestão e administração, fica-me a certeza de que a escola pública é, numa sociedade democrática e respeitadora, a alavanca em quem muitíssimos depositam esperanças num mundo melhor. Porém onde muitos, puxando cada um para a sua corporação e umbigo, tentam desvirtuar o seu princípio basilar de fortalecimento de valores e de busca de conhecimentos, de respeitar e fomentar a individualidade; contudo colocando-a ao serviço do respeito e da tolerância pelo semelhante.
Se, entre nós e durante séculos esse papel coube à igreja católica e às comunidades rurais e de bairro, nas últimas décadas tem cabido à escola o papel agregador de tradições, de difusor de conhecimentos, de socialização entre os pares e nas próprias unidades familiares. De forma simples e direta: se há comportamentos que urge mudar, usa-se a escola como instrumento difusor ou de discussão! A visão de escola que enquista muitas cabeças é a contradição entre uma instituição privilegiada e prepotente, rigorosa e repressora ou uma libertina e desregrada… A escola, sendo a amostra da sociedade é também um laboratório de ideias e de práticas que, neste tempo que perdurará nos anais da história, estará sob todos os olhares. Daqueles que esperam, dos que exigem, dos que antecipam desgraças, dos que anseiam milagres. Todavia, toda a sociedade estará fisicamente na escola na segunda quinzena de setembro. Os que tentaram resguardar-se de um vírus invisível e insonoro, mas também dos que andaram por aí aos magotes… Se “uma andorinha não faz a Primavera”, ou como escreveu Nietzsche “aquilo que não me mata só me fortalece”, sou mais apologista de Sun Tzu, defendendo que “a suprema arte da guerra é derrotar o inimigo sem lutar”. Contudo, se baixarmos os braços findamos! Não! Começaremos a vencer a pandemia quando não cedermos à tirania do medo e a combatemos com a cautela de algum distanciamento. Venceremos com o respeito que devemos a todos e em especial àqueles que no aconchego familiar queremos abraçar, se usarmos a máscara mas também se formos coerentes entre o que apregoarmos e o que faremos.
Tempos difíceis? Não! Muito mais do que isso… Diferentes!…pelas aprendizagens, pelo cumprimento básico de regras de sã convivência, pela readaptação criativa, pelo alerta constante, pela sensibilização e tolerância, pela manutenção dos afetos e pela repulsa à promiscuidade… Duma assentada todos esperam que a escola resolva os problemas sociológicos do saber estar, do saber respeitar, do saber confiar para podermos continuar… Chiça! A escola terá de ter a receita para evitar a catástrofe económica e promover a confiança, caldeando quantidades adequadas de cidadania e de bom senso para combater a maior de todas as inseguranças, o medo que amarra, desespera e entrega a outros a liderança do nosso destino individual!
Se algo aprendi em cinco décadas na escola é que estamos em constante reeducação!

Nelson da Silva Martins

 

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8 comentários

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    • XCG on 11 de Outubro de 2020 at 10:31
    • Responder

    Desculpem a ignorância, mas se o ME obrigar os professores em mobilidade a darem aulas no seu QZP não se resolvia o problema da falta de professores?

    • Leandro on 11 de Outubro de 2020 at 11:40
    • Responder

    Não.

    Resolvia-se caso se integrasse no quadro os contratados , que não fundo não o são.
    Precisam deles todos os anos.
    Se ficassem nos quadros o salário seria pago por inteiro e acabava-se o “prof escravo” que paga para trabalhar.

    • XCG on 11 de Outubro de 2020 at 12:02
    • Responder

    Leandro eu percebo o que queres dizer….e faz sentido…
    Mas isso o ME não vai fazer….ou pelo menos não o vai fazer assim de um momento para o outro, fará de forma faseada (norma travão). E se o fizer de forma faseada continua haver problemas de colocação e é nesse sentido que fiz a pergunta relativamente à mobilidade. Fiz a questão por mera curiosidade e nada contra aos professores da mobilidade que estão no seu direito.

    • Leandro on 11 de Outubro de 2020 at 13:22
    • Responder

    XCG , o governo não o faz pq não quer investir na Educação do país.
    Vê a evolução de _€€ do PIB que é investido na Educação e logo percebes.

    Para resolver a situação só como eu disse. Senao só se anda a tapar o sol com a Pandora, sindicatos incluídos.

    • Leandro on 11 de Outubro de 2020 at 13:23
    • Responder

    peneira

    • PROFET on 11 de Outubro de 2020 at 13:49
    • Responder

    “Começaremos a vencer a pandemia quando não cedermos à tirania do medo e a combatemos com a cautela de algum distanciamento. Venceremos com o respeito que devemos a todos e em especial àqueles que no aconchego familiar queremos abraçar, se usarmos a máscara mas também se formos coerentes entre o que apregoarmos e o que faremos.”

    Blá Blá Blá Whiskas saquetas.

    Tal como o governo faz… responsabilizar-nos a todos pelo alastrar da pandemia depois de ter promovido o contacto social na maior comunidade existente, a educativa, com cerca de 2 milhões de indivíduos… esta pandemia, que ainda agora está no início e que já tirou e vai tirar muitas mais vidas, e que vai deixar muitas marcas em milhares de pessoas, tanto físicas como psicológicas.

    Este Sr. esteve 33 anos a lecionar e 17 a gerir e a administrar… devia saber o que é “1 metro de distanciamento, se possível” e as reais condições das escolas, ou melhor, a escandalosa falta de condições de higiene e segurança para fazer face a este vírus que não dá tréguas, com 28 alunos sentados lado a lado, falta de funcionários e de professores, etc. Ficaria aqui um dia a descrever o que se passa nas nossas escolas, a verdadeiríssima realidade.

    “… fica-me a certeza de que a escola pública é, numa sociedade democrática e respeitadora… ”

    Blá Blá Blá Whiskas saquetas.

    Está a falar de Portugal? Não me parece que estejamos numa sociedade democrática e respeitadora, mas sim reféns de uma tirania camuflada de democracia, que se encontra tanto no governo, como também numa grande parte das direções das mais de trinta escolas por onde já passei… sim, já passei por mais de 30 escolas, sou professor contratado desde 1996. Por cada ano de serviço deste Sr. equivale a cada uma das escolas por onde já passei. Está aqui a minha resposta quanto à democracia e respeito neste país.

    Repito: Bla Blá Blá Whiskas saquetas.

    Peço desculpa por não ter um vocabulário tão “dispendioso” como o do Sr. deste artigo, porque não sou filósofo, sou um cidadão comum, de boas práticas… dispenso e abomino os filósofos teóricos, principalmente os que deturpam a realidade ou que estão alucinados, fazendo parecer que vivem no país das maravilhas da Alice.

    • José Carlos Silva on 12 de Outubro de 2020 at 19:42
    • Responder

    Caro Nélson,
    Gostei da reflexão em tempos de grande incerteza!
    Convém nunca esquecer o verdadeiro da escola e dos seus agentes neste mundo cada vez mais complexo em que vivemos e no qual o futuro é cada vez mais uma incógnita.
    Grande abraço!
    José Carlos Silva

    • José Carlos Silva on 12 de Outubro de 2020 at 19:44
    • Responder

    Caro Nélson,
    Gostei da reflexão em tempos de grande incerteza!
    Convém nunca esquecer o verdadeiro papel da escola e dos seus agentes neste mundo cada vez mais complexo em que vivemos e no qual o futuro é cada vez mais uma incógnita.
    Grande abraço!
    José Carlos Silva

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