Como (re)organizar o 1º ciclo… Ideias?…

Este artigo já é de 2015, mas a reivindicação que traz a público é, hoje, mais atual que nunca…

Como (re)organizar o 1º ciclo… Ideias?…

O fim da monodocência aproxima-se a largos passos, será o fim de uma era que, no nosso país, dura desde sempre.

Fomos caminhando, com pequenos passos, para o estado em que nos encontramos hoje, fomos aceitando as mudanças, adaptando-nos às desventuras de um nível de ensino em constante mudança, qual tubo de ensaio…

Os “illuminatum” nunca tiveram em consideração os interesses de todos os intervenientes, nunca viram o 1º ciclo como um todo.

Na última década as mudanças têm-se agudizado, são constantes, todos os anos se enfrentam novos desafios novas arbitrariedades. Se se têm em conta os interesses dos alunos? A meu ver, eles, só têm servido de desculpa para tais mudanças.

No próximo ano letivo, o do 1º ciclo irá sofrer uma das mais drásticas mudanças dos últimos anos. Não pelo seu conteúdo, mas pelo número de mudanças impostas. Um novo programa de Português, depois de verem implementadas as metas e um novo programa de matemática, a introdução do Inglês como disciplina obrigatória, o que lhes aumentará a carga letiva e para alguns, a disciplina de Iniciação à programação virá sobrecarregar ainda mais o seu horário, já por si, pejado de horas fechados dentro de quatro paredes. E isto das 9h às 17h:30m. É o horário chamado normal… mas muitos ainda frequentam outras instituições, seja para a prática de desporto, seja para a ocupação de tempos livres, pois os pais não têm horários que coincidam com a vida académica dos seus educandos. Tudo isto vai tornar as vidas das crianças ainda mais complicadas.

Isto tudo para dizer o quê?

Para dizer que o sistema de ensino no 1º ciclo, tal como está, e tal como está a ser projetado para o próximo ano letivo, não vai beneficiar os interesses da “bandeira”, leia-se alunos, que alguns usam como desculpa para tentar deixar marca. O sistema de ensino necessita de ser totalmente revisto e não estou a falar em termos de conteúdo, de número de disciplinas, do que deve ser ou não lecionado, estou a falar na sua organização.

O horário do 1º ciclo encontra-se, na maior parte das escolas, no espaço temporal das 9h até às 17h:30m. Isto, porque se entendeu ser mais benéfico no que diz respeito, à ocupação do tempo das crianças e à necessidade dos encarregados de educação de terem de exercer uma profissão e de a conciliar com os horários escolares. Mas será que beneficia as aprendizagens? A meu ver, não. O período do dia em que o cérebro está mais apto a exercer qualquer tipo de atividade que envolva a aprendizagem, isso está mais do que provado, não sou eu que o afirmo, eu só o constato todos os dias, é a parte da manhã. Não cabe na cabeça de ninguém lecionar uma aula de matemática ou português das 16h:30m às 17h:30m. Então, porque não organizar as atividades letivas exclusivamente nessa parte do dia?

A organização do sistema de ensino no 1º ciclo, e em qualquer outro, deve ter em atenção todos os fatores e intervenientes no processo. Os alunos devem poder aproveitar, da forma mais eficaz, a sua estadia na escola para que o processo ensino/aprendizagem se realize. Aos encarregados de educação, deve ser assegurado que os seus educandos têm um ensino de qualidade e que explore todas as suas capacidades. Deve também ser assegurada a escola a tempo inteiro, uma vez que, nos dias de hoje e na sociedade em que vivemos, Assim o exige. Deve também garantir aos profissionais de educação, vulgo, professores, o exercício da profissão aproveitando os períodos de maior concentração para as crianças desta faixa etária. E nisto devemos estar todos de acordo. Se os níveis de aprendizagem subirem, todos os intervenientes ganharão.

Mas porque é que o sistema se mantém? Porque é que, os responsáveis e os políticos, não olham com mais atenção para os tais países que tantas vezes usam como termo de comparação para outras matérias e veem que somos dos poucos países a persistir com este sistema? Isso, como se diz, “cada um sabe de si”… Só sei que este sistema está dado por adquirido, mais vale não se discutir porque, mudar dá muito trabalho, nem que seja para melhor.

Pois, muitos de nós, professores de 1º ciclo, temos a nossa opinião de como o sistema podia mudar e melhorar, mas não temos palavra nos órgãos decisivos. Uma coisa é certa, quase todos sabemos que a mudança é possível. E isso, tem sido assunto de conversa ao longo de muitos destes anos. Pessoalmente, também tenho a minha opinião…

Uma organização possível seria a que já é utilizada em outros países, atividades letivas da parte da manhã e não letivas da parte da tarde, como na Alemanha (ver aqui). Mas como operacionalizar? Como faze-lo sem aumentar a despesa com a educação? E é claro, sem ferir os princípios de uma escola a tempo inteiro? Vou tentar explicar da melhor forma.

Da parte da manhã, que passaria a ter inicio às 8h, ou perto dessa hora, nunca antes. Os professores titulares de turma organizariam as áreas curriculares, Português, Matemática, Estudo do Meio e as Expressões, constantes no programa curricular deste ciclo, durante este período. Terminaria, esta importante parte do dia, pelas 13h.

A hora de almoço decorreria das 13h às 14h:30m.

O período da tarde situar-se-ia entre as 14h:30m e as 17h:30m. Neste espaço de tempo, os alunos beneficiariam de atividades complementares e de enriquecimento curricular. Seria durante a parte da tarde que disciplinas como, o Inglês, obrigatório para os alunos do 3º e 4º anos, a partir do próximo ano letivo, a nova disciplina de Introdução à programação para o 1º CEB, o projeto de educação para a saúde, PASSE, aulas PRESSE, EMRC, orientação do estudo, bem como outros projetos ao nível de escola (hora do conto) ou concelhio e as AEC’S já existentes.

Como já foi mencionado acima, o horário letivo da parte da manhã seria mais produtivo para os alunos, embora a mancha letiva tenha um início “vespertino”, as crianças teriam a vantagem de assimilarem melhor as matérias lecionadas. Os “números” a que tanta importância é dada pelas organizações “observadoras”, isso espelhariam.

Na parte da tarde, o horário seria composto de atividades “mais” lúdicas, mas de igual importância no desenvolvimento das crianças. Dariam aos encarregados de educação a segurança de uma escola a tempo inteiro sem interferir nas atividades letivas e na performance académica dos alunos.

De seguida apresento dois horários possíveis, um de uma turma e outro de um professor, para que se possa visualizar a possibilidade apresentada.

 

Horário Turma
2ª feira 3ª feira 4ª feira 5ª feira 6ª feira
8:00 Português Matemática Português Matemática Português
8:30 Português Matemática Português Matemática Português
9:00 Português Matemática Português Matemática Português
9:30 Português Matemática O.C. A.E. Expressões
10:00 E. M E.M. O.C. A.E. Expressões
10:30 Intervalo
11:00 E. M. E. M. E.M. Português Matemática
11:30 E.M. Português E.M. Português Matemática
12:00 Matemática Português Matemática Português Matemática
12:30 Matemática Português Matemática E.M. Inglês
13:00 Matemática Expressões Matemática E. M Inglês
Almoço
14:30 O. Estudo In. Prog. Inglês PASSE/PRESSE In. Prog.
14:50 O. Estudo In. Prog. Inglês PASSE/PRESSE In. Prog.
15:00 Proj. Escola EMRC Proj. Escola O. Estudo Expressões
15:50 Proj. Escola EMRC Proj. Escola O. Estudo Expressões
16:10 Ed. Física Musica Expressões Ed. Física Musica
17:00 Ed. Física Musica Expressões Ed. Física Musica
Horário Professor
2ª feira 3ª feira 4ª feira 5ª feira 6ª feira
8:00  

 

Horário Letivo

8:30
9:00
9:30
10:00
10:30
11:00
11:30
12:00
12:30
13:00
Almoço
14:30 Reservado a reuniões Trabalho individual Atendimento Enc. Educ. Trabalho individual Trabalho individual
15:00
15:30 Hora de estabelecimento
16:00
16:30 Trabalho individual Trabalho individual
17:00

Nota: sexta feira das12h:00m às 13h:00m o professor cumpre uma hora de estabelecimento (não consegui formatar a tabela)

Em termos económicos, não creio que o orçamento do ministério da educação sentisse muita diferença, é tudo uma questão de maximizar recursos. É claro que tal mudança vai envolver alterações na organização dos agrupamentos. Mas somos todos professores, não é por ser professor do 1º ciclo, que deixo de ser professor para os alunos dos outros ciclos. Se tiver que exercer a profissão com esses outros alunos, dentro das minhas competências, vou faze-lo. A colaboração dos professores de EVT, dos professores bibliotecários, dos professores de apoio e até dos professores de Matemática e Português em coadjuvação, em apoio educativo ou em orientação ao estudo, professores de Ciências em atividades experimentais… Isto seria uma quase revolução…

Revolução! Revolução, seria os professores do 1º ciclo, na sua totalidade ou quase, terem condições dignas de trabalho nas escolas para efetuarem todo o tipo de trabalho a que estão obrigados. Mas isso é uma utopia.

E agora puxando a corda, a escola a tempo inteiro podia ir além das 17h:30m. Quando possível ainda se poderia acrescentar uma hora ao horário dos alunos, que disso necessitassem ou por razões académicas ou por impossibilidade de coordenação de horários Pais /Alunos. Já me estou a “esticar” muito. Mas se a organização for a adequada, até se poderia colmatar a falta de apoio que as nossas crianças tê na realização dos famigerados TPC. Um professor de apoio, uma hora por dia, a alunos que necessitassem mesmo da tal hora, o que já acontece em alguns agrupamentos e sempre existiu nos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo.

É claro que este modelo não é consensual, é claro que as crianças vão estar fechadas dentro de quatro paredes o dia inteiro, é claro que o tempo para brincadeiras individuais será reduzido, é claro que, fora as disciplinas de carater obrigatório, as outras serão de carater facultativo, caberá aos encarregados de educação, como até hoje, optar ou não, pela sua frequência.

As vozes começam a levantar-se. O certo é que o sistema, conforme está, deixou de funcionar, deixou de dar respostas às exigências da sociedade atual. Os responsáveis têm andado a tapar buracos ao longo dos anos sem resolverem o problema. Só o têm piorado. Chegamos ao ponto que, ou o sistema se modifica, ou o sistema cai. É urgente a mudança, resta-nos saber para onde nos levará…

 

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8 comentários

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    • Pedro C on 5 de Julho de 2020 at 17:07
    • Responder

    Acabar de uma vez com a monodocência que ainda resta, e criar um 1 ciclo mais próximo dos restantes ciclos.

    Equiparar o horário do professor do 1 ciclo aos restantes ciclos.

    O mesmo professor pode dar português a duas ou três turmas.

    O mesmo com a Matemática e EMeio.

    E as expressões seriam lecionados por professores especializados em cada área.

    Criar a figura do DT no primeiro ciclo.

    Pode parecer algo confuso especialmente quando se pensa no 1 ano de escolaridade, mas depois da habituação e rotina as vantagens e o potencial seriam imensas

    Ter a possibilidade de cada turma ter uma ou duas tardes livres, que poderiam ser ocupadas com AEC concentradas nesses dias, ou quem quisesse (pudesse) iria embora para outras atividades privadas ou simplesmente para casa

    • Pedro C on 5 de Julho de 2020 at 18:03
    • Responder

    Acrescento, uma revisão dos programas para uma versão mais leve.

    Sem a urgência de cumprir o longo programa haveria mais tempo para evitar que alguns alunos ficassem para trás nas aprendizagens. O que também ia ajudar na diminuição das retenções deste ciclo ou futuras.

    Explorar (mais) a articulação curricular e a interdisciplinaridade, DAC, etc..

    • Roberto Paulo on 5 de Julho de 2020 at 18:38
    • Responder

    Eu começava por apertar na formação. Grande parte destes professores não sabe escrever. Como podem ensinar o que não sabem e não praticam?

      • Olhaeste on 5 de Julho de 2020 at 19:01
      • Responder

      Vai dar banho cão e lava-te com a mesma água ( esta bem escrito não está ?)… deves ser tudo menos docente, quero dizer professor (não deves conhecer a palavra docente!)…. cromo!

        • Roberto Paulo on 5 de Julho de 2020 at 23:00
        • Responder

        Vai dar banho ao cão e lava-te com a mesma água (está bem escrito, não está?). Deves ser tudo, menos docente, quero dizer professor (não deves conhecer a palavra docente!). Cromo!

        Assim está melhor, segundo creio.

        Espero, sinceramente, que não seja professor nem docente, mas apenas doente, porque este trata-se. Já um docente com este discurso e construção frásica… ai, mãezinha!

    • Sónia F. on 5 de Julho de 2020 at 19:26
    • Responder

    Inglês de tarde? Por quê?
    O Inglês é obrigatório. Não é AEC. Que seja integrado devidamente no horário dos alunos, para que não seja ad eternum uma disciplina relegada para o turno da tarde.
    Também o Inglês precisa da concentração dos alunos. É uma disciplina a valorizar, tanto como as restantes. Ser colocada sempre de tarde na maioria dos agrupamentos é simplesmente lamentável. Haver Diretores que ainda não sabem que o professor do grupo 120 leciona 22h letivas e tem 9 turmas (no horário completo) é também lamentável passados que estão tantos anos desde que esta disciplina entrou no currículo. Enfim. É o país que temos. Com propostas destas então…

      • Cathy on 6 de Julho de 2020 at 12:48
      • Responder

      Quando li não consegui acreditar! Arlindo a sério que também dás tão pouco crédito ao Inglês? Que falta de consideração, só a Matemática importa, só os números??? Vão todos ser engenheiros, podem não saber escrever uma frase ou saber comunicar com outros, mas sabem números. Credo! As línguas como Português e Inglês também são consideradas para ser dadas no período da manhã, tal como a Matemática… Nunca pensei ler um comentário destes…

    • Mariana on 5 de Julho de 2020 at 19:55
    • Responder

    E as expressões não são curriculares? Da responsabilidade do professor titular de turma?

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