“A Educação e a Escola”
Vivemos tempos sem igual na história da escola portuguesa e na sociedade em geral. Como professora e como cidadã, hoje acordei com uma necessidade, quase que obrigação, de tentar esclarecer todos os portugueses que, sem conhecimento dos factos, sem estarem no terreno, sem enfrentarem todos os dias as nossas escolas, as nossas salas de aula, os nossos alunos, se acham com toda a legitimidade para opinarem, legislarem, alterarem, atacarem sem dó nem piedade, aqueles que tentam todos os dias e já sem alento, formar os futuros cidadãos deste país. Todos estes que hoje falam nunca devem ter parado para pensar no que seria deles se não tivessem tido professores! Sim, porque antes de serem presidentes, ministros, advogados, jornalistas, médicos, polícias e uma infinidade de profissionais, passaram por uma qualquer escola e tiveram professores.
É com uma tristeza profunda que hoje sei que cada manhã que um professor se levanta para ir dar aulas, vai com o coração nas mãos, por uma necessidade de trabalhar para sobreviver e a pensar que vai ter que enfrentar mais um dia de tormento, de faltas de respeito, de violência psicológica e por vezes até física, o tal dito “bullying”, acumulando um desgaste sem precedentes e ansiando desesperado por poder voltar para casa. Sim, porque o professor, ao contrário do que se tenta fazer crer, não tem um salário milionário, muito pelo contrário. Licenciado, trinta anos de serviço, 1300 euros líquidos, esta é a realidade que ninguém diz, porque é realmente vergonhoso. Dizem os grandes ilustres do nosso país que para haver bons profissionais também é necessário que sejam monetariamente bem pagos. E então os professores? Esses também são profissionais e deveriam ter outras condições de vida. Não é de todo com os vencimentos que recebemos (e por favor deixem de se referir ao vencimento ilíquido, isso é tentar tapar o sol com a peneira) que fazemos uma vida sem fazer contas todos os dias. E ninguém fala no imenso e insustentável desgaste a que estamos sujeitos nesta nossa profissão. Esse também é só visível nas profissões que aos políticos e comunicação social interessa. Até somos funcionários públicos, sem desmérito algum para com todos esses profissionais, apenas não atendemos telefones, nem estamos atrás de um balcão a esclarecer e ajudar um utente de cada vez. Não, a nossa profissão é diferente e por esse motivo tem um desgaste desmedido e incompreensível para quem está do outro lado. Nós cuidamos, ensinamos, esclarecemos, educamos, apoiamos, ouvimos 20 ou trinta crianças, adolescentes e jovens de 90 em 90 minutos. Cada um diferente do outro, cada um filho de seus pais, cada um com as suas preferências, hábitos e feitio…
Defendo a escola pública, defendo a escola para todos e até defendo a escola gratuita. Não defendo os milhares de euros que se gastam com aqueles que não respeitam nada nem ninguém, que agridem colegas, funcionários e professores, a quem apenas se pode marcar falta disciplinar e suspender uns dias e que voltam à escola para fazer exatamente o mesmo, faltam às aulas, acabam por estar retidos por excesso de faltas e continuam na escola, a massacrar todos, a boicotar as aulas a que vão apenas para isso mesmo e a usufruir de todos os direitos de um aluno cumpridor. Mas porque se devem preocupar os encarregados de educação destes alunos? Têm onde os entregar, onde lhes dão de almoçar e a maior parte deles ainda tem direito a subsídios e suplementos alimentares. E, claro que nós todos pagamos. No entanto, isto mudava facilmente. Todos sabem, mas não dizem nem fazem. A escola é para todos sim, mas existem regras e obrigações a cumprir. O aluno não cumpre, é avisado assim como os respectivos encarregados de educação. Se as atitudes e comportamentos persistirem e o aluno ultrapassar o limite de faltas e ficar retido (o que muitas vezes acontece ainda no primeiro período), não tem de permanecer no estabelecimento de ensino, Vai para casa onde devem os encarregados de educação fazer o seu papel. Só assim poderíamos começar a pensar que seria possível uma escola melhor e mais eficaz. Um aluno incumpridor, sem respeito por ninguém, com desprezo pelas normas de uma instituição de educação e que persiste nesta atitude de insolência sem limites, sempre sem nunca serem tomadas medidas sérias, é um mau exemplo para todos os outros. Eu acredito na maçã podre na fruteira.
Se há profissão de desgaste rápido, físico e psicológico, a nossa é a primeira da lista. É incompreensível como ainda se pensa que os professores podem continuar a exercer com dignidade e integridade mental ao fim de trinta anos. Será que nenhum dos nossos políticos e dirigentes sindicais percebeu os sinais?
Há muitos anos num congresso sobre educação, ouvi uma figura conceituada e de renome, afirmar com toda a convicção, que no dia em que se quisesse tornar a escola pública como a referência da educação, seria desta forma. Só assim os professores poderiam realmente cumprir a grande missão de educar e ensinar. Só assim poder-se-ia tornar a escola gratuita, pois o que se gasta com todos esses seria suficiente.
Os professores estão cansados, gastos e sem esperança. A escola está a morrer. Os alunos estão a ficar sem futuro.
Que haja bom senso meus senhores. Deixem vir embora quem já se deu completamente e nada mais tem para dar. Que a nossa reforma não aconteça apenas para sermos internados num qualquer hospital psiquiátrico. Continuando assim é o que nos espera. O aumento da esperança de vida de que hoje tanto se fala não pode nem deve ser o indicador para a reforma dos professores. Estamos esgotados, sem alento e sem estratégias. Que alguém pense em nós.
QUE ALGUÉM SEJA CAPAZ DE SALVAR A ESCOLA PÚBLICA
Rosário Meireles Cunha