Mochilas mais “gordas”, mentes menos estimuladas.
Tenho aproveitado este tempo de interrupção letiva para pensar nos manuais que nós adotamos. Cada vez mais, o professor tem um papel menos ativo no processo de ensino. Aos poucos tiraram-nos a destreza de criar instantaneamente tarefas para os alunos. Não quero com isto dizer, que não devemos planear uma aula, devemos sim, mas também temos de ter a capacidade de reinventar na hora atividades que vão ao encontro das expetativas e necessidades pontuais dos nossos alunos. De há uns anos para cá, temos perdido o nosso “território”. É-nos fornecido todo o tipo de material, para que conduzamos as nossas aulas. E não nos temos apercebido que nos fomos tornando reféns desses mesmos materiais. Tornámo-nos professores stressados, angustiados e competitivos. Criamos reuniões de articulação, sessões de cooperação, de onde saem testes “universais” para uma grande diversidade de alunos. Entupimos a nossa mente com pormenores, “ cumpriste a planificação? ” , ” Como é que a colega ainda não deu…” e, mais não é necessário exemplificar, pois todos vós sabeis exatamente do que falo. É ótimo possuir livros bem estruturados, livros de fichas de avaliação, que nos aliviam um pouco, mas penso que estamos a ser “envenenados” por culpa nossa.
Um manual por disciplina, para já, penso ser suficiente. Alivia os alunos, evitando futuros problemas a nível da coluna e solta-nos a nós professores, permitindo-nos abrir largas à nossa imaginação e tornar uma aula muito mais sincera, pois é criada por todos, alunos e professor.
Manual, livro de fichas de trabalho, livro de escrita, livro de fichas de avaliação… que temos ganho com tudo isto? Alunos mais motivados? Professores mais saudáveis? Não me parece. Os alunos não têm espaço para a reflexão, para a crítica, além disso o tempo escasseia, vêm ai as provas…que angustia!
Não criamos adultos psiquicamente saudáveis, mas cidadãos isolados, depressivos, egoístas, e mais grave ainda sem sentido critico. Professores cada vez mais debilitados, fisicamente e psicologicamente. Como podemos ajudar uma criança se nem a nós próprios socorremos?
Somos a meu ver uma classe de privilegiados. Temos todos os dias à nossa frente seres humanos que necessitam de atenção, de serem ensinados e encaminhados numa sociedade cada vez mais competitiva e egocêntrica. Temos a possibilidade de ajudar e fazer a diferença. Nós somos capazes, nascemos para isso.
Parece algo tão insignificante: “quantidade de livros”, mas não se deixem enganar, quantidade não é igual a qualidade. Os alunos necessitam de nós, da nossa presença, da nossa atenção e da nossa lucidez. Não necessitam de mais manuais, mais provas, mais rótulos.
Peço desculpa se chateei alguém, mas estava mesmo a necessitar de fazer este desabafo.
Um bom ano a todos os professores!
Rosa Ana Morais
5 comentários
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Por um lado, o meu desencanto ainda vai mais longe que o da colega. No plano dos professores, de que a escrita do seu artigo é uma expressão, a incapacidade de integrar uma linguagem pedagógica para a abordagem das questões da educação, as dificuldades que surgem ao trabalhar com professores que não leem um livro de pedagogia. No plano dos alunos, a massificação do ensino, ou como se queira chamá-la, com a mentalidade dos alunos moldada por (maus) exemplos dos media.
Por outro lado, num nível global, a sociedade neoliberal e planetária crispada por divisões educacionais, sociais, económicas ou religiosas que, como o caso português bem traduz, parecem traduzir uma sufocação das identidades nacionais. Mais parece que só não vivemos uma guerra à escala planetária porque só existe uma única superpotência. Estamos felizes com os produtos e valores que os donos do mundo nos propõem? Estas questões refletem-se na conflitualidade da escola.
Vivemos uma pedagogia sem valores… Quando isso acontece o sentido da existência desvanece…
Ensinar é importante, mas fundamental é Educar para a cidadania!
Concordo em absoluto com a rosa. Um bom texto de reflexão.
Excelente comentário. Estamos a educar seres cada vez mais egoístas. Não sei onde isto vai parar, mas é normal que eles não vejam nada não passam por elas não dão valor a nada só a PACC.
Tem toda a razão. De futuro penso que podemos refletir mais seriamente sobre este assunto e fazer opções mais dignas e que valorizem tanto a nossa criatividade enquanto professores, assim como as necessidades reais dos nossos alunos, enquanto pessoas diferentes e com necessidades de aprendizagem também elas, diferentes.